O que está acontecendo com o minério e quais podem ser os impactos para Vale (VALE3) e Ibovespa?
O Congresso Nacional do Povo, reunião anual que aconteceu há duas semanas na China, decepcionou o mercado ao não trazer anúncios de novos estímulos para a economia do país. Esse foi um dos principais gatilhos para a queda recente do minério de ferro, que impactou negativamente a Vale (VALE3) na semana passada. A commodity, no entanto, voltou a subir nos últimos dias, gerando mais perguntas do que respostas para os investidores.
Durante esta semana, o principal impulso vem sendo a produção industrial no gigante asiático, que apresentou alta de 7% no primeiro bimestre do ano, acima das expectativas de avanço de 5%. O problema é que, quando o assunto é a força econômica chinesa, o cenário ainda parece turvo.
“O principal ponto que joga contra o minério de ferro na China é a preocupação olhando para o lado da demanda. Embora o governo tenha anunciado um alvo de crescimento de cerca de 5% para o PIB do país, a dinâmica do setor imobiliário permanece fraca”, diz Pedro Takahaski, analista de renda variável da AZ Quest.
O alvo citado por Takahashi foi definido durante o Congresso Nacional do Povo, realizado entre 5 e 11 de março. A meta, que já era projetada pelo mercado, não animou os investidores, que esperavam anúncios de incentivos fiscais ou de apoio ao setor imobiliário chinês. A decepção nesse sentido refletiu na cotação do minério.
“Em outros momentos, quando a China teve uma desaceleração, o governo compensou com incentivos, colocou bastante dinheiro na infraestrutura. Então fica sempre essa pergunta, se vai haver um novo pacote para manter esse crescimento. E essa dúvida cria ainda mais volatilidade”, explica Isabel Lemos, gestora de fundos de Renda Variável da Fator.
Além dessa variação de preços mais especulativa no minério de ferro, existe um fator mais concreto, de oferta e demanda, que é explicado pela alta nos estoques da commodity. Algumas usinas chinesas, aliás, estão aproveitando para realizar manutenções não programadas durante este mês de março.
Diante desse contexto desafiador, analistas entendem que a alta que vem sendo observada no minério durante esta semana pode não refletir a real situação. Por isso, projetam um cenário ainda cauteloso no médio prazo.
“A volatilidade deve continuar. O mercado vai continuar olhando todos os dados chineses, e isso vai impactar no preço. À medida que saem dados piores do que o esperado, a curva de commodities deve voltar para a normalidade. Ou seja, se estabelecer em um patamar um pouco abaixo do atual”, projeta Isabel Lemos.
“No curto prazo, existia a expectativa pela volta da demanda mais forte após o feriado do Ano Novo Lunar, que contudo não foi concretizada. Com uma crise imobiliária que não tem uma solução nem um pouco trivial, parece que esse cenário mais cauteloso com a demanda chinesa deveria persistir no médio prazo”, afirma Takahaski.
Quais são os impactos na Vale?
Por se tratar de uma mineradora, é natural que as ações da Vale (VALE3) sejam impactadas pelas fortes oscilações no preço do minério de ferro. No entanto, a queda nas ações da empresa observada durante a última semana parece, neste momento, especulativa, uma vez que, segundo analistas, a companhia ainda tem margem para trabalhar com o minério no atual patamar de preço.
Cotação VALE3
“De fato, a situação na China é relevante para os resultados da Vale. Por outro, a empresa possui um custo de operação relativamente baixo em comparação com seus pares, o que garante uma vantagem competitiva nesse cenário de queda do minério”, explica Pedro Takahaski.
“A avaliação de uma empresa de minério, de forma bem simplista, leva em conta a sua produção, o preço do minério e o dólar. Portanto, se você tiver qualquer uma dessas variáveis subindo ou descendo, é preciso fazer uma conta nova. No caso específico da Vale, não podemos fazer recomendação, mas ela vem sendo uma grande geradora de caixa”, completa Lemos.
Essa conta citada por Isabel Lemos, porém, pode ser desbalanceada caso o minério de ferro entre em uma trajetória de queda mais firme e teste patamares de preços um pouco menos favoráveis para a Vale, como destaca Takahaski.
“De fato, a situação na China é relevante para os resultados da Vale. Por outro, a empresa possui um custo de operação relativamente baixo em comparação com seus pares, o que garante uma vantagem competitiva nesse cenário de queda do minério”, explica Pedro Takahaski.
Por esse e outros motivos, o analista de renda variável da AZ Quest se mostra cauteloso com os papéis da Vale.
“Existem algumas questões micro que jogam contra o papel da Vale no curto prazo. O tema da sucessão do CEO (postergado para o final do ano), a repactuação da Samarco e a renovação das ferrovias são algumas das questões que trazem incertezas para a ação. Portanto, consolidando essa visão macro e micro, permanecemos negativos na tese de Vale”, completa.
Qual é o impacto do minério no Ibovespa?
A Vale é a empresa com o maior peso no Ibovespa. Logo, estendendo a discussão, uma eventual queda abrupta nas ações da mineradora pode impactar o índice como um todo. Mesmo assim, o cenário não parece tão preocupante a esse ponto.
“Existe um impacto, mas é pequeno. As empresas de minério, juntas, representam cerca de 15% do índice. Então se todas elas caíssem 10%, seria um impacto aproximado de 1,5% no Ibovespa”, afirma Isabel Lemos, destacando outras variáveis que devem estar no radar do investidor neste momento.
“A questão dos juros e da inflação lá fora e a Selic aqui são mais importantes para o andar do índice do que olhar somente para minério e Vale”, completa.