O uso do rotativo do cartão de crédito – linha de financiamento mais cara do País, amplamente difundida entre a população de menor renda – mais do que dobrou nos últimos três anos.
A concessão cresceu 108% no período entre junho de 2020 e o mesmo mês de 2023, quando alcançou R$ 30,2 bilhões, segundo dados do Banco Central (BC). Os juros médios na modalidade do rotativo superaram os 437% ao ano (números de junho), mas instituições chegam a cobrar quase 1.000%, segundo o BC.
O consumidor cai no rotativo toda vez que opta por pagar apenas uma parte da fatura do cartão até o vencimento.
Nesse cenário, a inadimplência alcançou o recorde de 53% em maio (agora está em 49%), e levou governo e Congresso a pressionarem pela queda dos juros.
Temendo um tabelamento, como ocorreu com o cheque especial – que hoje tem teto de 8% ao mês -, os bancos aceleraram as negociações com varejistas e empresas do setor.
Essa disparada na concessão do rotativo, segundo especialistas, tem diversas explicações. Elas vão desde o impacto da pandemia no orçamento até a proliferação do número de cartões e o maior acesso a esse tipo de crédito, passando pela falta de educação financeira.
“Muitas pessoas, principalmente as que estavam na informalidade, tiveram períodos de perda de renda durante a pandemia”, afirma a coordenadora do programa de Serviços Financeiros do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Ione Amorim.
Ela explica que, por falta de opção, as famílias de baixa renda acabam recorrendo a linhas de crédito sem garantias, que têm juros mais elevados. “A grande oferta de cartões atende a essa necessidade, mas isso vem acompanhado da maior taxa do mercado”, diz.
Vários cartões de crédito
A proliferação de cartões de crédito, com a entrada de novos concorrentes, ajuda a explicar o maior uso do rotativo. Dados do BC apontam que 20 milhões de pessoas passaram a ter acesso a um ou mais cartões entre 2019 e 2022.
Uma expansão positiva, do ponto de vista de inclusão financeira, mas que tem potencial de aumentar o nível de endividamento das famílias, alerta o BC.
O aumento nas emissões foi puxado pelas instituições digitais, mas a autoridade monetária também cita as instituições financeiras pequenas e médias e aquelas ligadas às lojas varejistas.
Ricardo Vieira, vice-presidente da Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços (Abecs), diz que a Abecs está finalizando uma proposta com medidas que podem contribuir para a redução do juro do rotativo.
Rotativo e educação financeira
A falta de educação financeira também está no cerne da disparada do uso do rotativo. Ione, do Idec, aponta que parte dos consumidores usa o cartão para pagar despesas correntes e, assim, “complementar” a renda do mês.
Na hora da compra, os consumidores avaliam se a parcela cabe no bolso, mas esquecem os juros. Os especialistas também apontam que falta planejamento de longo prazo para se adquirir bens à vista, sem ter de recorrer aos parcelamentos do rotativo.
Com Estadão Conteúdo