Os juros baixos no Brasil, desde o ano passado, com os seguidos cortes da Selic, têm feito com que muitos investidores migrem para outros investimentos que não estejam ligados a taxa básica de juros. Em setembro deste ano, entretanto, um fenômeno começou a assustar alguns investidores mais conservadores. Isso porque o Tesouro Direto (LFT – Letra Financeira do Tesouro) começou a dar retorno negativo, algo que não acontecia desde 2002.
O Tesouro Selic é o investimento de menor risco do mercado, considerando o risco de crédito. A volatilidade dos papéis desses investimentos é, geralmente, muito baixa e o resgate do dinheiro pode ser feito facilmente. Entretanto, o Tesouro Selic 2025, que é a única LFT vendida no Tesouro Direto hoje, teve recuo de 0,46% em setembro.
“Em muitos casos [em outros países] os investidores estão pagando para deixar seu dinheiro custodiado e essa preocupação é que começa rondar no Brasil. Porém, é necessário dizer que investidores buscarão outras formas de investimento. Bolsa é um exemplo”, disse o especialista em finanças, Adriano Gomes.
O movimento relacionado a rentabilidade negativa apresentada pelo Tesouro Selic é visto por especialistas como algo específico e técnico. A queda do Tesouro Selic aconteceu em linha com as preocupações do mercado a respeito da capacidade do Tesouro Nacional de rolar a dívida pública e a ideia de que o Governo Federal pode não conseguir lidar com o teto de gastos. Assim, o risco dos títulos públicos foi elevado e o governo teve de oferecer mais juros para atrair os investidores.
O especialista em mercado financeiro da Suno Research, João Arthur, explicou que “o governo tem encontrado dificuldades em se financiar com a taxa Selic atual”, e, por isso, “precisa oferecer um pequeno prêmio na taxa, o que causa a marcação a mercado negativa no título”.
Ainda sobre a rentabilidade negativa do Tesouro Selic, Arthur disse que isto “é algo que chama atenção, porém se deve ressaltar que é muito raro”. “Após normalizada esta situação, o Tesouro Selic deve seguir como uma alternativa segura e conservadora”, destacou o especialista.
Vale destacar, também, que o governo teve um grande aumento de gastos para lidar com a crise provocada pela pandemia de coronavírus (Covid-19). Dessa forma, a situação fiscal do País piorou nos últimos meses. Somado a isso, ainda há a taxa Selic em um patamar baixo.
E se a taxa básica de juros no Brasil fosse negativa? Na Suíça, isso acontece
O Swiss National Bank (banco central da Suíça) manteve, no dia 24 de setembro, a taxa básica de juros do país em -0,75%. A autoridade monetária ainda informou que estava disposta a intervir “mais fortemente” no mercado de câmbio estrangeiro para minimizar a apreciação do franco suíço (moeda local). O que acontece neste contexto, de juros negativos, para os investidores de títulos públicos, é que a pessoa precisa, basicamente, pagar para guardar o seu dinheiro com o governo.
Mas o que faz uma pessoa querer investir em uma rentabilidade negativa? Na teoria, não há muito o que ganhar com isso, porém, na Europa, os bancos cobram taxas de manutenção sobre contas paradas. Ou seja, deixar o dinheiro parado na conta da instituição pode ser mais prejudicial do que deixá-lo guardado com o governo.
Outros investidores também preferem a renda variável e o mercado imobiliário, que muitas vezes servem para proteger o patrimônio da inflação.
Em relação aos investimentos no Tesouro e na poupança, o mestre em finanças, Adriano Gomes, destaca a ida, cada vez maior, de investidores para a renda variável. “O sucesso do lançamento do IPO do Grupo Mateus mostra esse apetite. Fundos de Private Equity estão em busca de bons negócios nesta temporada a fim de remunerar os “insatisfeitos” com a rentabilidade da renda fixa”, afirma o especialista.