Em um mundo em constante mudança, as startups ocupam o espaço de grandes empresas que deixam para trás os anseios dos consumidores. As mudanças de hábito, no Brasil e no mundo, abrem margem para oportunidades em todas as camadas da economia.
Essa é a visão da Scalexopen, fundo de investimento em startups em estágio inicial com alta oportunidade de escalabilidade nos negócios.
Com investimentos de R$ 500 mil a R$ 5 milhões em cada empresa, o fundo quer fomentar operações disruptivas, principalmente nos segmentos de comércio eletrônico, logística, alimentação e fintechs.
“O Brasil é um terreno fértil para as startups”, disse João Alfredo, sócio-fundador do fundo, ao Suno Notícias. Aproveitando a aprovação do Marco Legal das Startups, o fundo visa utilizar seu “smart money” para dar suporte, tanto financeiro como de boas práticas, a quem inova no mercado.
Neste ano, os unicórnios já cresceram 74% no mundo, mas o Brasil figura na lista com apenas uma empresa. A Scalexopen quer ampliar os horizontes e disponibilizar a bússola para que as startups naveguem pelo oceano de oportunidades.
Confira os principais trechos da entrevista com o investidor e fundador do fundo.
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Conte um pouco de sua trajetória com startups antes da criação da Scalexopen.
Sou um empreendedor de tecnologia. A minha carreira foi toda pautada neste segmento, com a fundação da NetMicro, em 1992, que se transformou na CorpFlex, em 2004. Com isso, nós passamos a fazer uma transformação bastante disruptiva no mercado, que foi oferecer tecnologia enquanto serviço, o que ainda não estava sendo feito.
Na NetMicro, começamos a oferecer tech as a service há 20 anos, com um modelo de datacenter, como atualmente conhecemos o serviço de cloud. Desde então, trabalhei para profissionalizar e democratizar a alta tecnologia no País.
A empresa acabou se tornando a maior plataforma de private cloud brasileira. Nós tivemos a entrada de um fundo de investimento, que foi o 2BCapital, fundo de private equity controlado pelo Bradesco (BBDC4).
Há cinco anos, eu vendi a empresa e fui para o Conselho de Administração.
Com esse processo, passei a conhecer novos modelos inovadores do mercado, e dentre eles eu conheci a 100 Open Startups, plataforma de open innovation no Brasil.
No relacionamento com essa empresa eu pude ter contato com diversas outras startups, nas quais tive a oportunidade de investir.
Uma delas foi a Fix, que facilita a contratação de prestadores de serviços. Inicialmente, ela operava pelo modelo B2C (business to consumer), e quando entrei passamos a operar com B2B2C (business to business to consumer).
Em cerca de dois anos, ampliamos em 10 vezes a base de prestadores de serviços, que foram para cerca de 35 mil. Atendíamos 50 mil estabelecimentos domésticos, e esse número saltou para 1,5 milhão, costurando acordos com grandes imobiliárias e construtoras.
No ano passado, a receita bruta da startup foi de R$ 6 milhões, e a projeção era de que esse número fosse ampliado em até sete vezes neste ano. A Fix foi comprada pela Tempo Assist por R$ 210 milhões em março deste ano, marcando a minha segunda venda.
Como surgiu a ideia da Scalexopen? Qual é o objetivo do fundo?
Com base nesse histórico, fiquei motivado em ajudar empresas a se redesenharem e fiz parte da criação do Scalexopen, fundo de investimento em startups em estágio seed e pré-seed de base tecnológica com alto poder de escalabilidade. Trouxemos a Reag, que é a gestora e administradora do fundo, enquanto eu sou o investidor-fundador.
Hoje, a 100 Open Startups é uma prestadora de serviços do fundo, com a originação das empresas investidas. Atualmente, olhamos para startups de seis áreas:
- Marketplace;
- Fintechs;
- Delivery;
- Crédito;
- Marketing digital;
- Robot Processo Automation (RPA) e soluções de aumento de produtividade e eficiência.
Iremos investir em até 30 startups, em até dois anos. O investimento em cada startup parte de R$ 500 mil até R$ 5 milhões, dependendo do setor, maturação e potencial de crescimento.
Já investimos em duas startups, uma de inteligência artificial em RPA, e outra de marketplace B2B de comida vegetariana e vegana. O processo de aporte foi realizado em co-investimento com outro fundo.
Hoje se fala muito em startups dos setores de saúde e educação. Na sua visão, quais são os segmentos mais aquecidos?
Existe oportunidade em todos os mercados, como healthtechs, edtechs, de alimentos e tudo mais. Porém, nosso foco está mais voltado à transformação nas cadeias de valor do varejo, de logística e distribuição.
A pandemia impulsionou ainda mais o processo de transformação digital dessas empresas. Se olharmos o padrão tradicional do segmento, ele conta com a indústria produtiva, que vende para o distribuidor, que vende para o revendedor e que, só então, chega ao consumidor. Mas esses processos estão sendo digitalizados e alterados rapidamente.
Estamos de olho nisso, procurando compor um robusto ecossistema de startups para trabalharem juntas e co-criarem juntas.
O foco da Scalexopen está nas cadeias de valor e de distribuição do Brasil.
Então e-commerce e logística com tecnologia são áreas que você enxerga mais upside?
Não necessariamente. Todas as áreas da economia têm upside para startups. Mas nesses, especificamente, há um processo de transformação muito acelerado. As cadeias de distribuição foram fortemente impactadas — e, consequentemente, alteradas – no mundo inteiro com a pandemia.
A partir do momento em que as empresas se veem com os comércios fechados, os distribuidores e a indústria com restrições, tudo o que estava sendo discutido no quesito digital, foi acelerado. Não tem muita coisa nova, mas tudo foi intensificado.
As empresas que não tinham vendas digitais, que não trabalhavam com o delivery e não proporcionavam essa comodidade aos consumidores, ficariam para trás.
Em função da pandemia, o comércio eletrônico teve forte crescimento no Brasil. Com a volta da normalidade, você não enxerga um risco de desaceleração deste processo?
Realmente, do ponto de vista de crescimento do e-commerce, o Brasil teve um ótimo desempenho nos últimos dois anos. Quando a pandemia estava em seu pico, todos os comércios estavam fechados, então naturalmente tudo era 100% digital.
Agora, com a reabertura, alguns processos voltarão ao normal. Contudo, eles voltarão à normalidade pautados pelo omnichannel, com a população mais acostumada com o conforto e flexibilidade de compras pela internet.
Na minha visão, as cadeiras produtivas em meio a esse movimento da economia ainda precisam de muita digitalização. Houve, sim, o impulsionamento do comércio eletrônico no País, mas ele ainda é embrionário dada a janela de crescimento do Brasil. Para nos compararmos com exemplos nesse sentido, como China e Estados Unidos, o espaço é grande.
Quanto o cenário brasileiro é fértil para as startups? Do outro lado, quais são as principais dificuldades?
Particularmente, não sou o empresário que gosta de atribuir ao governo todas as dificuldades de um negócio. Eu acredito que o Brasil é, sim, uma terra fértil para se empreender. Existem problemas de todas as naturezas, em todos os lugares. Aqui, só temos alguns mais do que o normal, que é a burocracia, por exemplo.
Mas esse é o cenário, o mundo real brasileiro. O empresário precisa ter muito jogo de cintura para se adaptar à realidade e às condições mutáveis do País.
A pandemia, por exemplo, trouxe uma crise econômica imensa, com alta inflação e colapso sanitário, mas também abriu oportunidades para aceleração dos negócios. O número de startups que estão sendo criadas é enorme.
As dificuldades existem e não são poucas, mas eu prefiro ficar do lado da criação de coisas grandes a despeito disso.
No dia 1, quais devem ser os primeiros passos de uma startup para que tenha sucesso?
O dia 1 de uma startup é encontrar uma dor clara e resolvê-la com um produto adequado. Tendo um produto para resolver um problema, times devem ser formulados e, então, montar uma equipe com talento, vontade e criatividade para fazer acontecer o movimento.
Depois é necessário escalar as vendas deste produto para que o crescimento pegue tração. Em todo esse processo, as startups devem implementar uma boa governança e indicadores de produtividade e meritocracia.
No meu papel de investidores e integrante de um fundo acelerador, procuramos ajudar as empresas com “smart money”.
Não só os recursos financeiros, mas também agregamos valor com acesso a mercado, conexões, relacionamento, melhores práticas, implementação de canais de vendas digitais, de sucesso do cliente, de marketing. Procuramos estruturar as áreas internas organizacionais para que os passos que eu citei sejam alcançados de forma célere.
E quando ela já chega a um patamar sólido, o que a empresa deve fazer para se manter no topo?
Na minha visão, que às vezes é distinta a de outros profissionais da área, é que toda e qualquer startup precisa ter bons princípios de governança. Eles são os pilares, que irão nortear toda a sustentação de sustentabilidade e de criação e preservação de valor da companhia.
Isso é como estar com uma pequeno barco no meio do oceano, mas com uma bússola para não ficar à deriva. Você precisa saber qual é o seu norte, seus princípios e valores, para te conduzir na liderança de uma empresa em crescimento.
Com isso, ela estará preparada para encarar os novos entrantes. Sempre haverá concorrência, então as empresas precisam procurar oportunidades de “co-competição”, onde os integrantes competem e cooperam entre si, com novas práticas e produtos. É preciso sempre estar atento às tendências, ameaças e oportunidades para se manter no topo.
Na última década, as taxas de juros zeradas fomentaram a criação de startups e empresas de crescimento. Com a inflação forçando o caminho inverso, haverá menos liquidez para as startups?
Na minha visão, os investidores sempre utilizarão o mercado de capitais para maximizar os ganhos respeitando o perfil de cada um. Realmente, como taxa de juros mais baixas, a tendência é que a procura por ativos alternativos e de maior risco fiquem em alta, pois prometem esse maior potencial de retorno.
Automaticamente, com a volta da taxa de juros mais alta no Brasil e, talvez, no mundo, os investidores mais conservadores tenderão a procurar ativos menos arriscados.
Porém, quem gosta de empreender e de novos negócios, continuará procurando esses ativos alternativos e são inerentemente mais arriscados. Acredito que sempre existirá uma parcela do mercado que procurará empresas com características como as startups.
O mercado brasileiro ainda é incipiente no mercado de capitais. Apenas 1,5% da população aceita correr o risco de investir em Bolsa. Vejo que é uma tendência que as pessoas passem a se acostumar cada vez mais com ativos dessa natureza, como as startups.
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