Startups perdem posto de queridinhas e ficam “mais pobres” no mercado
Virar “unicórnio” é uma das metas cobiçadas pelas startups. Porém, as empresas de tecnologia agora estão lutando para permanecerem no clube dos negócios avaliados acima de US$ 1 bilhão por causa de um temido vilão do setor: os down rounds, rodadas de investimento que reduzem a avaliação de mercado destes empreendimentos.
“Como essas startups não têm mais tanto poder de barganha durante as rodadas, como tinham em 2021, muitos down rounds vão acontecer e causar uma série de reduções nas avaliações dos negócios ao longo do próximo ano”, explica Vincent Harrison, analista de mercado da plataforma americana Pitchbook.
No exterior, já há diversos casos de empresas que, ao captar mais recursos, viram-se rebaixadas. Depois de receber investimento do conglomerado japonês SoftBank, a startup indiana Oyo, de hospedagens curtas, teve sua estimativa de valor de mercado reduzida em 73%, caindo de US$ 10 bilhões, em 2019, para US$ 2,7 bilhões em setembro deste ano.
A lista de startups ficando “mais pobres” é longa: a BlockFi (de ativos digitais) viu sua estimativa cair de US$ 3 bilhões para US$ 1 bilhão – o mínimo suficiente para continuar a ser chamada de “unicórnio”.
A fintech sueca Karna teve um tombo para lá de espetacular: sua avaliação passou de US$ 45,6 bilhões para US$ 6,7 bilhões, na mesma base de comparação. Já a Stripe (de pagamentos online) passou por um baque um pouco mais brando: saiu de impressionantes US$ 95 bilhões para US$ 74 bilhões.
De acordo com dados compilados pela plataforma CBInsights, as avaliações de mercado no primeiro semestre deste ano ainda se mantinham maiores do que os números de 2020 e 2021. Foi a partir do segundo semestre que os valores começaram a encolher mais fortemente, apontando uma tendência de queda também para o ano que vem.
Portanto, para os responsáveis pelo estudo, há espaço para mais quedas nas avaliações de mercado nos próximos meses – e os “unicórnios”, que foram os mais festejados durante o período de bonança, são os que correm riscos de sofrer quedas mais bruscas agora que a sorte das startups virou.
“Companhias que levantaram grandes rodadas em 2021 talvez consigam se manter por um tempo sem procurar mais capital. No entanto, empresas que queimam caixa podem ser forçadas a receber aportes com um desconto significativo na avaliação”, avalia a CBInsights no relatório, publicado em setembro.
Startups em crise no Brasil?
O Brasil não teve casos de down rounds, mas investidores e especialistas do País dão como certo que haverá reavaliações para baixo também por aqui.
Os alvos prováveis devem ser os unicórnios que estão pouco acima da marca de US$ 1 bilhão ou nomes que surgiram na pandemia e logo foram alçados ao posto bilionário. Hoje, no Brasil, o maior nome do setor é o iFood, avaliado em US$ 5,4 bilhões.
“Isso pode já estar acontecendo, mas é difícil que essa notícia venha a público”, destaca João Ventura, da SlingHub. “Se a startup não divulga o valuation, é sinal de atenção, porque o valor pode ter sido mantido ou reduzido na rodada negociada.”
Para não virar manchete com notícias ruins, os atuais unicórnios têm se adaptado ao novo ritmo do mercado de tecnologia. Anteriormente vorazes por capital para manter índices de crescimento e de captação de clientes, essas empresas têm feito demissões, congelamento de contratações e ajustes nos produtos para continuar “galopando” de maneira mais tranquila.
No Brasil, os unicórnios iFood, 99, Loggi, QuintoAndar, Loft, Facily, Vtex, Ebanx, MadeiraMadeira, Mercado Bitcoin, Olist, Unico, Hotmart, Dock e Wildlife fizeram demissões de centenas de funcionários ao longo de 2022. Companhias internacionais, como a mexicana Kavak, maior unicórnio da América Latina, também realizaram cortes severos na operação.
“Ao longo do ano, vimos demissões em massa, desistências de expansões para outros mercados e cortes em verba de marketing nessas empresas”, afirma Gustavo Araújo, da Distrito, sobre as startups bilionárias. “Foi um cavalo de pau na estratégia de gestão de todos os unicórnios”.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo, com Estadão Conteúdo.