Selic: Entre crise política e econômica, Brasil se despede de juros a 2%
O rápido agravamento do cenário econômico e político no Brasil ocorrido nos primeiros meses de 2021 deve provocar um movimento altista na taxa básica de juros (Selic) bem antes do que era esperado no final de 2020. Se naquele momento os bancos previam o início do ciclo de alta para meados do ano ou até mesmo para o segundo semestre, agora cada vez mais instituições financeiras veem um aumento já na próxima reunião, em 17 de março.
Entre os motivos para isso estão desde fatores políticos – como a interferência do governo federal na Petrobras (PETR4) e a retomada dos direitos políticos de Lula, que poderá ser candidato – até incertezas econômicas relativas à trajetória da pandemia e à lenta vacinação. Soma-se a isso o aumento da inflação e as dúvidas sobre o cumprimento do teto de gastos do governo federal, em meio à aprovação de um novo auxílio emergencial.
Como se todos estes fatores já não fossem suficientes para espantar o capital estrangeiro do Brasil, existe ainda uma tendência altista na taxa dos títulos públicos norte-americanos (Treasuries), que ajuda a tornar os mercados emergentes – como o brasileiro- ainda menos atrativos.
A consequência desta tempestade perfeita foi a saída líquida de quase R$ 1,5 bilhão em recursos estrangeiros da bolsa nos primeiros cinco dias de março, e a alta do dólar, que ontem chegou a bater R$ 5,77.
O Suno Notícias consultou instituições financeiras para saber as previsões para a Selic. Algumas delas, inclusive o Santander (SANB11) e o Credit Suisse, estão revisando as projeções neste momento.
Alta da Selic é esperada para março
Para o Banco Safra, a previsão é de que o aumento da taxa aconteça na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) nos dias 16 e 17 de março. Além de mais cedo do que o esperado, o banco Safra projeta também o aumento da Selic mais forte do que a que vinha prevendo. De acordo com o banco, a estimativa é que o primeiro aumento da Selic será de 0,5 ponto percentual, e não mais de 0,25%, como era previsto.
Já na análise do Banco Fibra, as incertezas econômicas e sanitárias sugerem o aumento da taxa básica de juros de 0,5%, levando-a de 2% para 2,5%.
“A demora do início de um processo de vacinação em massa e os (desnecessários) ruídos provocados pelo governo federal tem aumentado as dúvidas quanto ao ritmo da retomada da economia. Sem vacinação em massa, não há recuperação econômica possível. Arranjos como auxílio emergencial são importantes para mitigar o impacto negativo da pandemia sobre os mais vulneráveis, mas não resultam em aumento da produtividade e nem são soluções para a questão da retomada do crescimento sustentável”, afirmou a instituição em seu relatório.
O banco aponta que o recente ruído que envolveu o governo federal e a troca do presidente da Petrobras (PETR4) aumentou o grau de incerteza sobre a condução política nos próximos meses.
“Avaliamos que o aumento do prêmio de risco-país para os papéis da dívida externa e o aumento do prêmio da curva de juros doméstica resumem tal impacto, sugerindo aumento da taxa de juros”.
Por sua vez, o Banco Votorantim apenas antecipou sua previsão de maio para março e permaneceu com a estimativa de aumento de 0,25 ponto percentual. Já o banco UBS afirmou, em relatório de 3 de março, que prevê uma alta da Selic em maio, chegando a 4% em setembro. No entanto, o banco destacou que “pode sentir pressão” para trazer a primeira alta para 17 de março, a depender das restrições de circulação e das condições políticas e financeiras do país.
Uma das primeiras instituições financeiras a elevar suas projeções para a Selic foi o Itaú Unibanco (ITUB3; ITUB4). Em 26 de fevereiro, o anunciou ter elevado sua projeção da Selic para o final deste ano a 5,00%, enquanto a previsão anterior era de uma alta de 3,50% e de 5,00% em 2022.
Para março deste ano, o Itaú estima que a Selic aumente 0,50 ponto percentual (p.p), ao passo que a última projeção para o período era de 0,25 p.p.
Bancos aumentam previsão da Selic para 4,00% em 2021
Os Estados Unidos tem apresentado recuperação econômica após o choque causado pela pandemia da Covid-19. A política fiscal tem direção expansionista com a recente aprovação do pacote de US$ 1,9 trilhão para estimular o consumo de famílias classe médias. Há ainda mais um elemento, o acelerado ritmo da vacinação da população.
Dessa forma, a taxa de juros dos títulos de 10 anos, subiu de 0,91%, no início do ano, para 1,66% na semana passada. A expectativa, segundo Fibra, é que o rendimento (yield) do papel de 10 anos termine 2021 entre 2% e 2,5% — com impactos nos preços ativos em todo o mundo.
A alta das Treasuries pode representar riscos para os mercados emergentes, incluindo o Brasil. O principal é o risco de uma debandada de recursos estrangeiros do país, pressionando o Ibovespa e o dólar. Com isso, “o câmbio continua pressionando a inflação, que não cede apesar de baixas sazonais que começam a aparecer”, afirmou o Safra.
Com a queda do Ibovespa, desvalorização do Real e a inflação pressionada, as instituições apontam para um reajuste da taxa básica para conter a saída de recursos estrangeiros em meio à valorização das Treasuries e instabilidade econômica e política do País.
“Talvez mais do que a inflação, são as considerações de gestão de risco financeiro que justificariam a retirada de parte do atual nível excepcional de acomodação monetária mais cedo e mais rápido do que o cenário de inflação e crescimento”, apontou Goldman Sachs.
Portanto, devido aos últimos desdobramentos, o banco Fibra estima que ao longo do ano o Copom aumente a taxa até 4,0%, ante a previsão de 3,5% no final do ano. A projeção do Safra também teve reajuste, “com isso, nossa projeção da Selic no final do ano sobe de 3,75% para 4,0%, valor que julgamos apropriado, neste momento, para evitar desvio expressivo da inflação em relação à meta de 2021”.
Os especialistas que elaboram o Boletim Focus, do Banco Central, mantiveram as expectativas sobre a meta da taxa Selic, que em 2021 deverá ser de 4% ao ano. Há um mês, estava em 3,50%.