O presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, rebateu nesta segunda-feira, 4, leituras de que a taxa de juros real – ou seja, que desconta a inflação – não caiu junto com os cortes promovidos pela autoridade monetária na Selic. “Isso não é verdade. Quando a taxa nominal começou a cair, a taxa real ex-ante à frente também começou a cair”, disse, em palestra na Associação Comercial de São Paulo (ACSP).
O presidente do BC frisou que os juros reais recuam no Brasil mais do que em outros mercados emergentes.
Segundo ele, ainda que a inflação no Brasil esteja em trajetória de queda, a situação ainda requer atenção, pois a inflação de serviços segue acima dos níveis de 2018 e 2019.
O presidente do BC observou ainda que a economia segue surpreendendo, citando revisões para cima das expectativas de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 2024 após a alta de 2,9% registrada no ano passado.
Investimentos privados como alternativa a restrições fiscais
Campos Neto disse também que o Brasil precisa encontrar formas de estimular investimentos privados para contornar as restrições fiscais que limitam o espaço a gastos públicos. Ele citou o aperto fiscal ao defender que o setor privado seja o indutor do crescimento, ao invés dos gastos públicos.
Afirmou que o País precisa avançar na agenda de investimentos privados, citando como exemplo a desburocratização, já que o espaço fiscal para que o setor público ocupe sozinho esse papel esbarra na dívida e na carga tributária, as mais altas no mundo emergente.
Entre as vantagens do Brasil, Campos Neto pontuou que o País consegue, como poucos no mundo, produzir com energia limpa.
Nesse sentido, o presidente do Banco Central manifestou a expectativa de que o Brasil comece a atrair mais investimentos em novos projetos de energia renovável.
Cenário aponta para uma Selic de 9,5%, diz ex-diretor do BC
O cenário de inflação é positivo e deve permitir que o Banco Central diminua a taxa Selic a ao menos 9,5% este ano. A tese é do ex-diretor da autoridade monetária e gestor de portfólio da Itaú Asset, Bruno Serra.
Além disso, durante evento do BTG Pactual, Serra acrescentou considerar possível uma taxa Selic menor, de até 9%, mas destacou que isso exige uma postura conservadora na condução da política monetária.
“Quanto mais o Banco Central for conservador agora, ele vai acabar colhendo frutos desse ambiente de inflação corrente mais benigno e vai poder estender o ciclo ao longo do segundo semestre, talvez com algumas reduções de 0,25 ponto porcentual a mais do que o mercado espera”, disse Serra, que participou na manhã da quinta-feira da mesa “Economia em Foco: Desafios e Oportunidades Globais”, do BTG Summit 2024.
O ex-diretor do BC já espera que o IPCA, índice oficial de inflação, fique entre 3% e 3,2% este ano – mais perto do centro da meta, de 3%, do que da mediana do último relatório Focus, de 3,81%.
E acrescentou que fatores como a queda das commodities agrícolas e o bom desempenho do câmbio brasileiro devem ajudar esse cenário.
Ritmo de cortes da Selic
Antes, Serra defendeu que retire já na reunião de março o seu “forward guidance“, que promete novos cortes de 0,5 ponto porcentual da taxa Selic nos dois encontros seguintes.
Com essa comunicação mais conservadora e a expectativa de uma evolução positiva do cenário, o BC poderia reduzir mais os juros no total, argumentou.
Na avaliação de Bruno Serra, o mercado ainda guarda alguma incerteza sobre a transição na gestão do Banco Central, embora os diretores nomeados ao longo do último ano pelo presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, tenham sido bons.
“Tem algum resquício da incerteza na transição do BC, apesar de as nomeações dos diretores terem sido bastante boas, com todo mundo falando a mesma língua”, disse Serra, durante o evento do BTG Pactual. “Ainda assim, acho que o mercado tem um pouco de pé atrás”, afirmou ele, após analisar o cenário sobre a Selic.
Com Estadão Conteúdo