Considerado um dos setores mais sensíveis aos juros e que sofreram bastante em 2023 com o cenário macroeconômico, o varejo segue no radar dos investidores este ano, sobretudo com a previsão de queda na Selic. A proximidade da temporada de balanços aumenta a expectativa para o mercado, que enxerga um cenário de retomada para algumas ações de empresas do setor.
É que ocorre com empresas de atacarejo, caso de Carrefour (CRFB3) e Assaí (ASAI3), que em um cenário de queda de juros e uma inflação mais comportada – inclusive já dentro do teto da meta – devem começar a entregar resultados mais positivos com a melhora do poder de compra da população.
“Além disso, a queda da Selic reduz o custo das despesas financeiras dessas empresas de varejo, e melhora o reperfilamento da dívida que elas podem optar ao longo do processo”, explica Andre Fernandes, head de renda variável e sócio da A7 Capital.
Gabriel Costa, analista da Toro Investimentos, lembra que a recente deflação de alimentos contribuiu negativamente para essas companhias, que viram seus volumes na frente B2B reduzindo, dado que os consumidores espaçaram mais as grandes compras, buscando aproveitar preços menores à frente.
“Agora, com a volta da inflação no canal alimentar, esperamos uma recomposição desses volumes e a migração dos consumidores para busca de preços mais baixos, o que favorece o modelo atacarejo”, pontua, destacando o Assaí como um dos principais players do varejo alimentar neste cenário – a companhia, inclusive, é uma das preferidas da casa para o setor.
“A empresa tem perspectiva de desalavancagem e a queda da Selic deve beneficiar o resultado financeiro”, acrescenta Costa. No ano, as ações de Assaí sobem 5,99%, segundo dados do Status Invest.
Varejo: setor de vestuário também pode se beneficiar de queda de juros, dizem analistas
Na opinião de Andre Fernandes, da A7 Capital, o setor de vestuário é outro do varejo que se beneficia bastante de um ciclo de queda da Selic e de uma inflação mais controlada, já que a população volta a consumir itens que vão além do básico. Para ele, boa parte das companhias do setor devem começar a reagir esse ano.
“Ao investidor, vale ficar atento a empresas de varejo que oferecem crédito aos seus clientes via cartão de crédito da loja. Muitas herdaram uma inadimplência alta desde a pandemia e até hoje lutam para conseguir mitigar os impactos disso. São companhias que podem performar pior do que empresas do setor que não oferecem esse serviço”, alerta.
Em relatório divulgado na semana passada, analistas do Morgan Stanley propuseram recomendação equalweight (exposição em linha com a média do mercado) para Lojas Renner (LREN3) e underweight (exposição abaixo da média do mercado) para C&A (CEAB3), sendo esta última destaque do setor de varejo em 2023.
“Continuamos cautelosos quanto ao potencial de investimentos em digitalização e a pressão competitiva sobre preços pesará nas margens do vestuário brasileiro, embora a intenção da pesquisa sobre vestuário online tenha sido favorável e acreditamos que a categoria poderiam beneficiar da melhoria das tendências de consumo”, avaliam os analistas.
O banco vê a relação risco-recompensa equilibrada para Renner, com desconto dos múltiplos de negociação em relação ao histórico, mas limitado catalisador de alta. Já em relação à C&A, a execução nas vendas/margem a recuperação superou as expectativas nos últimos trimestres, mas isso parece excessivamente refletido nas ações após a valorização do preço das ações em 2023.
Para Gabriel, da Toro, uma empresa que também pode se destacar nos próximos meses é a Vulcabras (VULC3), considerada uma das maiores calçadistas do país e que tem passado por transformações importantes.
Segundo ele, atualmente a companhia negocia a um P/L próximo de 8 vezes, com uma taxa de crescimento anual composta (CAGR) de lucros relevante nos últimos anos, além de uma posição de caixa muito confortável para cumprimento dos passivos.
“Além disso, a frente de calçados esportivos compete em menor medida com os players chineses, fazendo com que as marcas de menor custo, como a Olympikus, possuam alta penetração entre o público de menor renda que coloca na ponta do lápis o custo-benefício entre um tênis nacional e importado. Há ainda possibilidade de ganhos de alavancagem operacional com maior participação do e-commerce”, lembra.
A empresa, inclusive, anunciou na última segunda-feira que pagará R$ 367 milhões em dividendos, referentes às reservas de lucro do exercício de 2022 e equivalentes a R$ 1,50 por ação.
O que o mercado espera para Magazine Luiza (MGLU3) e Casas Bahia (BHIA3)?
Também em relatório na semana passada, o Morgan cortou a recomendação para as ações do Magazine Luiza (MGLU3) de equalweight para underweight, com preço-alvo sendo das varejistas cortado de R$ 2,75 para R$ 2,00.
Já para as ações de Casas Bahia (BHIA3), o Morgan Stanley manteve a recomendação underweight, com preço-alvo cortado de R$ 11,40 para 10 (queda de 1,1%). A preferência no segmento é pelas ações do Mercado Livre (MELI34) negociadas na Nasdaq. “Nós vemos tendências divergentes que continuam entre as operadoras de comércio eletrônico da América Latina”, avaliam os analistas do banco americano.
No caso do Magazine Luiza e Casas Bahia, os analistas do Morgan esperam que a pressão de lucros persista, em meio a uma ainda lenta recuperação do setor eletrônico e tração em categorias mais recentes que as varejistas apostam. No ano, as ações de Magazine Luiza caem 1,46%, enquanto os papéis de Casas Bahia caem 20,45%, segundo o Status Invest.
Mercado Livre: uma das queridinhas do varejo
Ainda em relatório, o Morgan Stanley lembrou que enquanto o Mercado Livre emergiu como o maior ganhador incremental de participação com o enfraquecimento da Americanas (AMER3), vê a liderança em escala de mercado apoiando a monetização contínua da taxa de juros e a expansão das margens.
Já para o BTG Pactual (BPAC11), o Mercado Livre é a melhor opção no segmento de e-commerce e pagamentos na América Latina, com valor de seu ecossistema à frente do mercado (taxa de crescimento anual de 26% em dólar nos últimos quatro anos).
“Ainda enxergamos uma tendência de crescimento secular para o comércio eletrônico brasileiro (bem como alguns mercados da América Latina), com GMV (volume bruto de mercadorias) superior aos níveis pré-pandêmicos”, diz o banco.
Já segundo o Itaú BBA, o Mercado Livre está posicionado para reportar excelentes resultados por mais um trimestre, com ganhos acelerados de participação de mercado, com crescimento de GMV (volume bruto de mercadorias) de 35% na base anual, ampliando a diferença entre ela e seus pares.
Assim, de um modo geral, empresas de varejo como as citadas acima devem se beneficiar de uma Selic mais baixa no período na linha de resultado financeiro, visto que as despesas com juros devem cair. “Além disso, o quarto trimestre costuma ser mais positivo para o setor dados os efeitos sazonais, o que deve impactar positivamente as receitas”, finaliza Gabriel Costa, da Toro.