Irã: como as sanções econômicas podem impactar a relação com o Brasil
O ano começou turbulento no cenário internacional. Na madrugada do dia 3 de janeiro, drones norte-americanos disparam mísseis e mataram o general da Guarda Revolucionária do Irã, Qassem Soleimani, em Bagdá, capital do Iraque.
O ataque foi revidado dias depois, gerando tensão nos mercados pela possibilidade de uma guerra, e motivando novas sanções econômicas por parte dos Estados Unidos. Especialistas discutem os possíveis impactos desses desdobramentos no comércio e na economia mundial. Mas, afinal, onde o Brasil se encaixa nesse contexto?
Se levado em conta o volume total, o Irã é um parceiro comercial com pouca participação no comércio com o Brasil: representou 0,98% das nossas exportações e apenas 0,06% das importações.
Mas o país é destino importante para algumas commodities, sendo o importador do milho brasileiro e o quinto de soja. O valor total dos produtos exportados pelo Brasil ao país do Oriente Médio em 2019 foi de US$ 2,2 bilhões, segundo dados do Ministério da Economia. Os principais itens foram:
- Milho (45% do total)
- Soja (25%)
- Bagaços (12%)
- Carne de gado bovino congelada (10%)
- Açúcar de cana (7%)
Além dos volumes expressivos em commodities, em uma análise divulgada em 2016, o Itamaraty considerava elevar o comércio entre os dois países para US$ 5 bilhões até 2021.
Posicionamento brasileiro no conflito
Após o ataque que matou o general iraniano, o Ministério das Relações Exteriores (MRE) do Brasil, em nota, ressaltou que “manifesta seu apoio à luta contra o flagelo do terrorismo”.
“O Brasil está igualmente pronto a participar de esforços internacionais que contribuam para evitar uma escalada de conflitos neste momento. O terrorismo não pode ser considerado um problema restrito ao Oriente Médio e aos países desenvolvidos, e o Brasil não pode permanecer indiferente a essa ameaça”, informou o Itamaraty.
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Apesar de não citar os Estados Unidos ou Irã, a manifestação do governo brasileiro incomodou Teerã. O termo “terrorismo” foi usado pelos americanos ao se referir ao general morto por eles.
Segundo fontes a par do assunto ouvidas pelo jornal “O Globo”, os iranianos mostraram-se “desapontados” com a postura do Brasil, país com o qual sempre mantiveram boas relações diplomáticas.
Posteriormente, a chancelaria do Irã convocou um representante brasileiro no país do Oriente Médio para prestar esclarecimentos sobre o posicionamento do Brasil.
O embaixador no país é Rodrigo Azeredo, mas ele se recupera de um procedimento médico e está de férias. Portanto, a encarregada de negócios da embaixada, Maria Cristina Lopes, representou o país. “A conversa, cujo teor é reservado e não será comentado pelo Itamaraty, transcorreu com cordialidade, dentro da usual prática diplomática”, informou o órgão de relações exteriores.
Maria Cristina teria enfatizado que a nota divulgada pelo Brasil não foi contra o Irã, mas contra a atuação daquele país no contexto geopolítico. Além disso, a encarregada destacou que cada país tem sua própria política externa, que tende a ser praticada com pragmatismo.
Logo após o pronunciamento do MRE, o presidente Jair Bolsonaro disse que “temos comércio com o Irã e vamos continuar esse comércio”.
Impactos na relação com o Irã
Após a manifestação do Brasil, a presidente da Câmara de Comércio e Indústria Brasil-Irã, Romana Dovganyuk, disse em entrevista ao jornal “O Globo”, “vamos perder mercado por causa de uma decisão política” e que o Brasil deveria “ter se mantido neutro”. A perda, segundo ela, pode chegar a US$ 1 bilhão (R$ 4,07 bilhões) já em 2020.
O SUNO Notícias contatou a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes Industrializadas (Abiec) sobre esse assunto. A entidade ressaltou a grande performance da exportação de carne bovina em 2019, inclusive com o Irã. Mas, dos riscos de uma tensão diplomática entre os países, no entanto, a disse que não falaria.
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A Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove) e a Associação Brasileira de Produtores de Milho (Abramilho), também procuradas pelo SUNO Notícias, não se posicionaram.
Sanções ao Irã e o Brasil
Segundo o professor de Relações Internacionais da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), Demétrius Pereira, mesmo depois das saídas dos Estados Unidos e do Irã do Tratado de Não Proliferação Nuclear (TNP), o risco de um conflito aberto entre os dois países é baixo.
O especialista considera também que o aumento das tensões é distante do Brasil. “Os atores brasileiros, seja o próprio governo ou os privados, ficam distantes dessa situação. Lembrando que, a nível governamental, o Brasil está mais alinhado aos Estados Unidos do que ao Irã”, disse Pereira.
Para ele, o principal efeito ao Brasil em meio contexto conflituoso no Oriente Médio é a oferta de petróleo, que pode impactar os preços da gasolina e do diesel.
Pereira considera que o principal alvo das sanções detalhadas no dia 10 de janeiro pelo secretário do Tesouro estadunidense, Steve Mnuchin, “visam pressionar o governo iraniano por conta da recusa ao Tratado de Não Proliferação Nuclear” e em retaliação aos ataques a duas bases americanas no Iraque.
Conflito no Oriente Médio
O Oriente Médio acompanha tensões geopolíticas há muitos anos. Desde o início da guerra do Vietnã, no início dos anos 1950, a região mostra-se ser uma das mais instáveis do mundo.
Em setembro do ano passado, duas instalações da petroleira saudita Saudi Aramco foram atacadas pelo grupo houthi do Iêmen, alinhado ao Irã. A ofensiva desestabilizou por dias as exportações, importações e cotação do petróleo em todo o mundo. Segundo autoridades sauditas e estadunidenses, o Irã estaria querendo atingir a estrutura de petróleo da Arábia Saudita. Teerã negou os ataques.
Posteriormente, no dia 29 de dezembro, as forças armadas dos Estados Unidos realizaram ataques no Iraque e na Síria contra o grupo miliciano Kataib Hezbollah, conforme comunicado do Pentágono. As autoridades norte-americanas afirmaram ter como alvo três locais dos grupos xiitas muçulmanos apoiados pelo Irã.
Em resposta, no último dia de 2019, manifestantes invadiram a área da embaixada dos Estados Unidos no Iraque. Trump, mais uma vez, responsabilizou o Irã de estar por trás das invasões e depredações, mas o país negou.
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Até que então, no dia 3 de janeiro, “sob as ordens do presidente, o Exército norte-americano adotou medidas defensivas decisivas para proteger o pessoal americano e estrangeiro e matou Qasem Soleimani”, informou o Pentágono sobre a morte do general do Irã.