A Justiça de São Paulo decretou na quarta-feira (9) a falência da rede varejista Ricardo Eletro, controlada pela Máquina de Vendas. A companhia foi fundada em 1989 pelo empresário Ricardo Nunes, que saiu em 2015.
A rede possuía uma dívida de R$ 4,6 bilhões, e pediu a recuperação judicial em 2020. A empresa aprovou o plano de recuperação em setembro do ano passado e aguardava homologação da Justiça.
O CEO da Ricardo Eletro, Pedro Bianchi, atual presidente e controlador da Máquina de Vendas, disse em entrevista à Exame que a notícia foi uma surpresa e que a empresa está recorrendo da decisão. Bianchi afirmou que as “nossas contas já haviam sido aprovadas pelo administrador judicial e que a folha de pagamentos está em dia”. Também destacou que nenhum dos credores pediu a falência e que não cabe ao juiz fazer a análise econômico-financeira do negócio.
De acordo com a apuração do jornal Valor Econômico, o juiz da 1ª Vara de Falências e Recuperações Judiciais do Foro Central de São Paulo, Leonardo Fernandes dos Santos, determinou a falência devido ao “esvaziamento patrimonial” da Ricardo Eletro. Por consequência, na visão do juiz, a empresa não tem condições de seguir na ativa.
Conforme o material do recurso obtido pela reportagem, a varejista argumenta que o esvaziamento é relacionado ao “ajuste contábil feito pela baixa de estoque operacional decorrente do fechamento de lojas e, como é esperado, houve ajuste para saldo de estoque”. Ele nega que tenha ocorrido esvaziamento por “fraude ou desvio desvio de valores”.
Todas as lojas físicas da Ricardo Eletro foram fechadas no segundo semestre de 2020, o que levou a empresa a operar unicamente por e-commerce com um portfólio reduzido de produtos.
“O juiz tomou essa decisão sem ouvir ninguém. Nenhum credor pediu a nossa falência e o administrador judicial não quer a nossa falência”, disse Bianchi, que assumiu o negócio depois de trabalhar em uma empresa que tentava reverter a má situação financeira da companhia.
O Estadão conversou com um credor da companhia que afirmou que, pelo menos por ora, não há intenção mesmo de pedir a falência da companhia, apesar de existir preocupação de o negócio, um dia, ter capacidade de honrar seus compromissos. Por isso, há ações de cobrança e execução de garantias em curso. A dívida do negócio é bilionária e somente o Bradesco (BBDC4) e o Santander (SANB11) concentram cerca de R$ 2 bilhões em títulos da dívida (debêntures).
De acordo com Bianchi, nenhum dos 17 mil credores pediu a falência da companhia, que segue com os planos de retomar as operações nas próximas semanas. A empresa, que chegou a ter 1,2 mil lojas e a faturar R$ 9,5 bilhões, rivalizando com gigantes como Casas Bahia e Ponto, da Via (VIIA3), e Magazine Luiza (MGLU3), hoje é um site com poucos produtos e faturamento próximo de zero, conforme mostrou reportagem do Estadão no fim de abril.
Ricardo Eletro: sem viabilidade econômica, diz juiz
No processo que executou a falência da varejista, o juiz definiu que a Máquina de Vendas não tem mais viabilidade econômica e que houve um esvaziamento patrimonial da operação, especialmente após o fechamento das lojas durante o período de pandemia.
De acordo com Bianchi, esses argumentos não se sustentam. “Não é o juiz que tem que definir se a empresa tem viabilidade econômica ou não, mas os credores. E sobre o esvaziamento patrimonial, o que aconteceu foi que, após o fechamento das lojas, fizemos uma baixa contábil do estoque que sobrou e fomos consumindo para a operação. Mas a empresa não desviou nada, pois foi tudo para a operação e a despesa corrente”, afirma o empresário.
Segundo Bianchi, a Máquina de Vendas já entrou com uma liminar contra a decisão e espera que ela seja aceita até esta sexta-feira, 10. Ele completa que os planos para colocar a operação online da Ricardo Eletro no ar seguem no mesmo ritmo: o site voltou a vender cerca de R$ 30 mil por dia, mesmo antes do relançamento dele, que deve acontecer na próxima semana.
“A empresa está com salário e encargos sociais em dia e já estamos com 30 mil produtos novos subindo para o site”, diz. A expectativa de Bianchi é que a Máquina de Vendas volte a ter vendas brutas de R$ 120 milhões mensais até o fim do ano.
O empresário ainda afirma que, caso a liminar não seja concedida, a Máquina de Vendas vai recorrer ao Supremo Tribunal de Justiça (STJ). “Mas estamos com boas expectativas de a liminar ser aceita e existem credores que já vão entrar no recurso nos apoiando. O juiz causou uma surpresa para todo mundo”, diz.
Empresa chegou a faturar R$ 9,5 bilhões em 2014
Após atingir o faturamento de R$ 9,5 bilhões, em 2014, a companhia entrou em um período de dificuldades que coincidiu com a recessão econômica do Brasil. Em 2018, veio a recuperação extrajudicial – graças aos bilhões em empréstimos tomados com bancos e fornecedores – e a promessa de que as coisas iriam mudar. Foi nessa época que Bianchi, então sócio do fundo Starboard, assumiu o comando da empresa.
A pandemia complicou o cenário da já combalida Máquina de Vendas, que decidiu fechar todas as lojas. Resultado: a receita da empresa foi minguando, de R$ 180 milhões mensais em 2019 para praticamente zero. Para completar, por dívidas tributárias, Ricardo Nunes foi preso em 2020, acusado de sonegação, mas ficou só um dia na cadeia. Bianchi comprou a participação de Nunes na Máquina de Vendas, e o antigo dono partiu para a vida de “coach”.
Durante a pandemia, Bianchi decidiu largar o seu cargo na Starboard para focar totalmente na Máquina de Vendas. Com isso, a sua principal missão foi renegociar todas as dívidas da companhia, que chegam a R$ 4 bilhões, além de mais R$ 1 bilhão em atrasos tributários. O resultado disso tudo foi que a empresa precisou entrar em recuperação judicial.
Mais recentemente, com Pedro no controle total da Máquina de Vendas, a companhia passou por uma reestruturação total. De 28 mil funcionários no auge, reduziu a operação para 40 pessoas. Também mudou o sistema do e-commerce para uma tecnologia da Vtex, com a esperança de que as vendas online poderiam representar o início da retomada da empresa. A ideia é, inclusive, retomar a operação de lojas físicas em 2023. Para o empresário, os planos continuam mesmo com a decisão de falência da Ricardo Eletro decretada pelo juiz. “Tudo continua nos planos. Aqui é imparável”, diz ele.
Com informações do Estadão Conteúdo
(Colaborou Fernando Scheller)