Os dados do “World Economic Outlook” do Fundo Monetário Internacional (FMI), divulgado em meados de outubro, mostram que o mundo inteiro vai enfrentar um 2020 de contração do Produto Interno Bruto (PIB) por causa da pandemia do novo coronavírus (covid-19). Todos menos um país: a China.
Segundo o documento, o PIB da China vai crescer 1,9% em 2020. Isso mesmo se a pandemia de coronavírus tenha iniciado no próprio país asiático.
Por outro lado, os PIBs dos Estados Unidos (-4,3%), do Japão (-5,3 %), da Alemanha (-6%), do Reino Unido (-9,8%), da Índia (-10,3%) e da Itália (-10,6%) terão todos fortes contrações.
Se a economia mundial entrou em colapso, como foi possível que a China deu essa volta por cima?
O primeiro aspecto a ser levado em consideração é a tendência das infecções por coronavírus. Tirando a censura e a propaganda do governo de Pequim, de fato parece que a China foi muito mais eficaz do que o resto do mundo na contenção de uma pandemia que se desenvolveu dentro de suas fronteiras.
Provavelmente isso foi possível graças a uma mistura entre autoritarismo e tecnologia.
Entretanto, o fato é que no ranking mundial da Universidade Johns Hopkins a China aparece apenas na 57ª posição, com pouco mais de 90 mil casos.
Menos do que países muito menores, como Kuwait ou Armênia. E isso em um momento em que os Estados Unidos disparam nessa triste liderança, com mais de nove milhões de casos.
Entretanto, além do ingrediente ligado a saúde, na receita do crescimento da China há outro ingrediente fundamental, e é econômico.
PIB da China alimentado pelas exportações
No primeiro trimestre deste ano, Pequim registrou uma queda no PIB de 6,8% em relação ao mesmo período de 2019. O primeiro vermelho em mais de quarenta anos.
Todavia, já entre abril e junho o PIB chinês voltou a correr (+3,2% em relação ao ano anterior), superando todas as previsões, e continuou sua evolução com +4,9% no terceiro trimestre em relação ao período julho-setembro de 2019.
Uma reviravolta incrível, alimentada com um combustível muito poderoso: as exportações.
O “made in China” voltou a rodar, apesar da recessão mundial e de uma forte contração do comércio global (-18,5% em volumes no segundo trimestre).
O volume do comércio chinês cresce há meses, com aumento de 10,4% nas exportações. E tudo isso mesmo em um período de guerra comercial com os Estados Unidos.
A estratégia de Pequim surpreendeu os economistas, pois foi na contramão da lógica dos países ocidentais de apoiar a demanda. A China, por sua vez, se concentrou na oferta.
Embora recentemente tenha proclamado a intenção de focar no consumo interno, de fato, no auge da emergência, o governo chinês lançou programas de estímulo econômico para as famílias muito menores do que os norte-americanos.
Pequim destinou US$ 116,6 bilhões (em um total de US$ 880 bilhões de estímulos fiscais) para deduções fiscais e isenções para as exportações. Essa estratégia voltada para as exportações conseguiu aproveitar da expansão fiscal das economias ocidentais, voltada para o apoio ao consumo, garantindo o “milagre” chinês em época de coronavírus.
Em outras palavras, os déficits fiscais dos Estados Unidos e da União Europeia (UE) estão fomentando a recuperação econômica de Pequim, permitindo a recuperação da competitividade e da posição dominante que havia sido corroída pela guerra comercial iniciada por Donald Trump.
Além disso, esse crescimento vai ser alimentado também pelas exportações de insumos médicos e aparelhos hospitalares, como respiradores, para enfrentar a covid-19.
Setores nos quais Pequim sempre manteve uma superioridade industrial avassaladora sobre o resto do mundo.
Ou seja: depois de exportar o vírus, a China exportou os produtos para combatê-lo, se tornando novamente o centro do tabuleiro do comércio mundial.
E, graças também a isso, que Pequim fechará 2020 com um PIB positivo, enquanto o mundo vai arquivar o ano em rápida contração (-4,4%), de acordo com os dados do FMI.
Recuperação pouco igualitária
No entanto, a opção chinesa de não apoiar o consumo gerou uma recuperação em forma de K.
Enquanto a parte da economia ligada às exportações continua crescendo a todo vapor, a parcela da população excluída do crescimento está enfrentando dificuldades por não ter subsídios.
Uma estratégia muito peculiar para a China, o único grande país do mundo que permaneceu comunista, pelo menos no papel.
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