Petrobras (PETR4) rumo à transição energética: por que o assunto divide investidores e o setor?

No início do mês de março, a Petrobras (PETR4) deu um passo importante em direção à energia renovável ao anunciar, junto à Equinor, estudos para viabilizar projetos de geração de energia eólica offshore na costa brasileira. Embora a transição energética faça parte dos planos da estatal, a notícia não deixou de impactar os investidores.

“O anúncio parece que provocou indevidamente a interpretação de que estaríamos desde já alocando capital nesses projetos. São apenas estudos iniciais, em que vamos tentar conseguir primeiro a outorga e, então, fazer o projeto e apresentar para as devidas decisões de investimento, um a um”, explicou o CEO da Petrobras, Jean Paul Prates, em vídeo destinado aos investidores da estatal, que pode ser assistido na íntegra abaixo.

Mas, considerando que o Plano Estratégico 2023-2027 da Petrobras direcionou o segmento eólico offshore como novo foco para estudos, por que a parceria entre a estatal e a Equinor gerou ruídos? O Suno Notícias consultou especialistas e trouxe algumas respostas.

Petróleo x energia renovável

Conforme lembra Paulo Albuquerque, analista de investimentos e sócio da Quantzed, o petróleo é uma commodity com estoque limitado. Se a matéria-prima, futuramente, não acabar, poderá ficar economicamente inviável, caso as reservas remanescentes sejam abandonadas.

“Olhando por esse prisma, uma empresa como a Petrobras tem de explorar ao máximo o petróleo, a fim de monetizá-lo enquanto ele ainda tem valor no mundo de hoje. Não adianta ficar juntando aquilo lá. Tem de explorar mesmo, monetizar, porque um dia pode não valer mais nada”, afirma Albuquerque.

Por outro lado, o analista pontua que é perceptível que a Petrobras esteja dando passos rumo à transição energética. “Tudo é ainda muito modesto, tanto que o Plano Estratégico aloca a maior parte de seus recursos para exploração e produção (E&P). Mas está lá uma orientação de buscar novas matrizes energéticas, em busca de algo limpo, renovável e sustentável.”

Enquanto isso, Nathália Dias, pesquisadora do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep), pontua que outras operadoras de petróleo, cientes da limitação do combustível fóssil e sua consequente geração de dióxido de carbono (CO2), já estão impulsionando o mercado de renováveis no Brasil.

Entre elas, está a própria Equinor, que teve sua primeira planta de energia solar instalada e com início da operação em 2018, no Ceará. A pesquisadora ainda lembra da BP (B1PP34) e da Shell (RDSA34). A primeira, em 2019, formou junto com a Bunge a BP Bunge Bioenergia, e entrou no mercado com etanol, bioeletricidade e açúcar. Já a segunda atua no mercado de biocombustíveis a partir da cana de açúcar brasileira desde 2011.

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“As petroleiras estrangeiras têm se mostrado mais disruptivas no movimento da transição. Ainda que a Petrobras tenha investido em estudos nesse segmento, principalmente no âmbito da geração de energia eólica offshore, e se aproximado de suas algumas parceiras no E&P, para trocar experiências e avaliar a viabilidade técnico-econômica de projetos de geração de energia limpa, nenhuma ação efetiva tem sido observada até o momento”, afirma Nathália.

Passos (modestos) rumo à transição energética

A pesquisadora do Ineep ainda diz que o Plano Estratégico da Petrobras para o quinquênio é insuficiente quando o assunto são a transição energética e os investimentos em fontes alternativas de energia. Isso porque, do total de US$ 78 bilhões em Capex (despesa de capital), 83% serão destinados à exploração e produção.

“Grande parte dos investimentos continuaram focados em E&P, tendo sido privilegiados os projetos de descarbonização da produção de petróleo em detrimento de novas fontes de energia. A companhia manteve sua postura conservadora frente à transição, reforçando sua baixa competitividade na geração de energias limpas.”

Nathália ressalta a importância da descarbonização para a redução da emissão de gases de efeito estufa, que são os grandes vilões do agravamento das mudanças climáticas. No entanto, ela reforça que são as fontes de energias limpas que, de fato, aceleraram os resultados quanto ao alcance das metas estabelecidas pelo Acordo de Paris — e que a Petrobras se comprometeu a com metas intermediárias de redução de emissões e de redução das emissões absolutas operacionais totais em 25% até 2030.

“O que consta de ação no Plano Estratégico 2023-2027 ainda é pouco para tornar a estatal competitiva nesse segmento e protagonista na redução dos impactos ambientais.”

Já Albuquerque salienta que uma empresa do porte da Petrobras não pode ficar concentrada apenas em um modelo de negócio, sobretudo focada em uma commodity que cada vez mais é vista como atrelada à “velha economia”.

Segundo ele, além de questões de ESG (governança ambiental, social e corporativa), há o risco de apostar todas as fichas em uma matéria-prima que tende a ser substituída no futuro.

“É preciso trabalhar, sim, em prol da nova fase da transição energética. Não apenas para uma economia com menos emissões de gases, mas para a transição do modelo de negócios da companhia em decorrência da transição energética. Afinal, isso é que vai garantir a sobrevivência da Petrobras quando o petróleo, eventualmente, deixar de ser economicamente relevante”, diz o sócio da Quantzed.

Por que a eólica offshore assusta?

Segundo Albuquerque, o que preocupa os investidores da Petrobras é a motivação para o foco na eólica offshore, cujos parques eólicos se situam em alto-mar. O sócio da Quantzed aponta que os custos dessa modalidade são maiores do que o desenvolvimento da eólica onshore, em que os parques eólicos estão localizados em terra.

“Por que escolher o caminho mais difícil e, consequentemente, o mais caro? O foco em eólica offshore é questionável, pois seus custos são mais de três vezes maiores do que o desenvolvimento de parques eólicos onshore. O Brasil é vastíssimo em terras, e ainda há muito potencial a ser explorado onshore, tanto eólico quanto solar, inclusive.”

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Em contrapartida, embora os custos da eólica offshore sejam mais elevados, a pesquisadora do Ineep pontua que os investimentos no segmento fazem sentido por terem sinergia com empresas da indústria de óleo e gás, que é o caso da Petrobras.

“Por dois fatores: (i) é possível aproveitar as infraestruturas que já existem na costa para realizar as atividades da eólica offshore, permitindo a redução de custos e a otimização de investimentos para instalação das bases eólicas; e (ii) a existência de uma cadeia de fornecedores já estabelecida nos locais onde tem produção offshore também facilita o processo de desenvolvimento dessa indústria. Ou seja, os fornecedores que atendem o E&P offshore podem também atender o mercado de energia eólica offshore.”

Impacto nos dividendos da Petrobras

Para Nathália, o impacto dos investimentos em energia limpa para o acionista da Petrobras, no curto prazo, é relativamente pequeno, uma vez que eles representam muito pouco no Plano Estratégico. Para ela, a questão é outra: como manter o valor de mercado da empresa alto no longo prazo fora do segmento de energia limpa, que é a tendência para o futuro?

“Por ser uma estatal, vai depender muito do governo que estiver em vigência. Se for um momento mais favorável às energias limpas, a tendência é de que esse processo se acelere. Isso pode ser reforçado ou não, a depender do perfil dos acionistas que estão na empresa”, explica.

Já Albuquerque faz as contas do impacto à Petrobras com esse tipo de investimento: serão US$ 78 bilhões de Capex, com US$ 20 bilhões adicionais para novos afretamentos de plataformas. Segundo ele, se os planos com a Equinor forem para frente, haverá um adicional mínimo de US$ 52 bilhões e o valor pode saltar para US$ 152 bilhões.

“Vamos supor que não haja estouro de orçamento — o que é uma probabilidade baixíssima. Estamos falando de quase R$ 800 bilhões. O lucro líquido da Petrobras no recém-encerrado exercício de 2022 foi de R$ 188,3 bilhões. Ou seja, vai ter impacto na distribuição de dividendos“, afirma.

Porém, o sócio da Quantzed lembra que a possibilidade dos proventos da Petrobras serem reduzidos não é nenhuma novidade. “Desde antes de assumir a companhia, [o CEO Jean Paul] Prates vinha repetindo o discurso do governo de que a empresa precisa investir mais e distribuir menos dividendos.”

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Janize Colaço

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