Com meses de idade, a Nau Capital entrou no segmento de multi family office, território de gigantes tradicionais, para criar uma estrutura independente, com olhar holístico. Agora, a casa busca provar seu valor apostando em ativos “fora da caixa”.
A Nau foi fundada em outubro do ano passado pelos sócios Evandro Bertho, Nathalia Paulino e Daniel Prado, todos saídos do BTG Pactual (BPAC11). Adicionalmente, o grupo trouxe para o bloco controlador José Acar, ex-membro do comitê executivo do BTG, além de antigo presidente e ex-vice-presidente do Banco Pan (BPAN4) e Bradesco (BBDC4), respectivamente.
A empresa estabeleceu uma parceria com a XP, a qual, por sua vez, gostou do capital comercial aportado para acessar as grandes famílias. Em dezembro, a Nau foi o escritório que mais fez crédito na XP e a segunda casa no ano (R$170 milhões).
“Estamos em um nicho entre o family office e o private banking“, disse Daniel Prado, diretor executivo da companhia. “Temos um “contrato com a XP e, por meio dele, recebemos apoio em determinadas questões”. “Por outro lado, temos toda a parte de serviços, atendimento e independência, naturais de um escritório.”
A empresa atua no segmento de high e ultra high, com ticket médio de R$ 40 milhões por família, o mais alto de toda a base de autônomos da XP.
Mas, para se impor no segmento de private, a Nau decidiu não se fixar no padrão produto financeiro. Para fazer o olho do cliente brilhar, o escritório procura soluções alternativas, incluindo investimentos em startups, ativos imobiliários e empresas de tecnologia.
“Nosso foco engloba dois aspectos do patrimônio do cliente, tanto o financeiro, quanto a parte mais ilíquida. Principalmente neste nível de juros, no qual clientes têm buscado ir atrás de alternativas de maior rentabilidade, acaba-se tendo um diferencial competitivo muito relevante”, destacou o executivo.
Veja a entrevista exclusiva de Daniel Prado, diretor executivo da Nau Capital, ao SUNO Notícias.
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Explique um pouco mais sobre a Nau. Qual a filosofia de investimentos da casa?
A Nau é um multi family office, formado por pessoas com bastante experiência na área de private banking. Sempre atuamos na área, mas pensávamos haver um modelo que fazia mais sentido, principalmente no cenário de juros baixos, focado em três pilares.
O primeiro é o de poucos clientes, com ticket médio mais elevado. Nosso foco são os com patrimônio investido acima de R$ 10-20 milhões. Hoje, nosso ticket médio é de R$ 40 milhões por família, sendo 36 na base. Dá mais ou menos um R$ 1,3 bilhão sob gestão. Poucos clientes significam atendimento mais personalizado e mais próximo.
O segundo pilar é um modelo independente, para ter os incentivos corretos para a venda de produtos. Enquanto em uma instituição sempre há aquela meta do mês, o produto a ser vendido, temos completa autonomia para escolher o que queremos vender e sugerir.
E o último, diria até o maior diferencial, é a visão mais global, holística para o cliente. Olhamos não só a parte de liquidez, de recursos financeiros, mas também a ilíquida — desde imobiliário até investimentos em private equity, ou startups — a qual passa despercebida por grandes bancos ou até family offices mais conhecidos.
Como é a gestão e a remuneração dentro da XP?
Hoje, dentro da XP, existem dois modelos de remuneração. É possível receber um “rebate”, mais tradicional, através do qual o produto remunera a casa. Ou o cliente opta por pagar um fee, percentual fixo anual, no qual todos os rebates retornam para a conta dele.
Quem toma a decisão é o cliente. Pode, inclusive, alterar o modelo de remuneração ao longo do tempo.
No nosso caso, especificamente, como o foco são clientes maiores, 70% do nosso AUM (recursos sob gestão) está dentro de estruturas de fundos exclusivos. Nelas, eles têm optado ultimamente pela segunda opção.
No contrato, negociamos um nível de liberdade com a XP: podemos sugerir e constituir veículos fora da plataforma tradicional. Produtos que não estão na plataforma da XP, seja por acordo comercial, seja porque ainda não houve demanda por parte dos clientes.
Vou dar o exemplo da Capitalis ou do Constellation Inovação, dois produtos demandados por clientes específicos. Estamos, neste momento, constituindo esses veículos, os quais poderão ser acessados via XP [pelos investidores da Nau], mas não remuneram por meio dela e nem estão disponíveis na plataforma.
O mercado de private está bem aquecido ultimamente, com casas tirando profissionais de outras… Como você vê tudo isso?
É um movimento natural. Aconteceu lá fora há cinco, dez anos, e no Brasil está sendo alavancado pela quantidade de bancos novos vindo ao mercado.
É Modal (MODL11), Nubank, C6, BTG Digital, uma série de instituições novas. Aproveitam uma janela de oportunidade do mercado e provocam alta da pressão de crescimento de curto prazo. Isso impulsiona todo esse movimento.
Em algum momento, vai se acomodar, é natural. Na minha opinião, teve muita transação, até do ponto de vista financeiro, tem dificuldade de fechar a conta.
Mas sem dúvida nenhuma tem um movimento natural de saída, mais do que XP e BTG, dos bancos mais tradicionais (Itaú, Bradesco e companhia), que deve continuar para uma mudança no modelo de atendimento.
Se antes se tinha 90% da riqueza concentrada em cinco instituições (Santander, Bradesco, Itaú, Caixa e Banco do Brasil), atualmente vemos um shift para assessoria independente. Mais, para um modelo de proximidade com o cliente, fora do ambiente da agência e dos grandes bancos.
Isso já aconteceu nos Estados Unidos. Essa dança das cadeiras deve continuar, embora não na mesma proporção vista nos últimos 12 meses.
No segmento high e ultra high, o ordinário não faz o olho do cliente brilhar, então vocês apostam em produtos alternativos. Conte mais sobre isso.
Existem dois fatores importantes. O primeiro é a queda de juros, a qual deixou o cliente high e ultra high desconfortável. Tudo aquilo cujo resultado não é substancialmente acima do CDI deixou de ser atrativo. Se antes se podia deixar o dinheiro no DI, ou em um multimercado menos agressivo, neste nível de juros isso fica menos atrativo.
O segundo é a abertura das plataformas, de praticamente todas as instituições, seguindo um pouco a tática de guerrilha sobre a qual falamos há pouco. Hoje, todas as companhias relevantes dão acesso a produtos muito além dos geridos por elas mesmas. Então, se o produto tradicional não fazia muito sentido neste nível de juros, ele perdeu ainda mais atratividade por não ser exclusivo. Você pode acessá-lo de qualquer lugar.
Para se diferenciar, é preciso achar produtos com alto potencial de retorno e caráter de exclusividade e seletividade.
Como fazemos na Nau? Vou dividir entre o chamado alternativo líquido e ilíquido.
Quando olhamos para o primeiro, o leque é muito menor, mas ainda existem produtos de difícil acesso. Existem uma série de gestoras, como Dynamo, Atmos, Constellation, Squadra, efetivamente fechadas, com exceção de janelas pontuais, há quase dez anos. Uma das estratégias é conseguir espaço nesses veículos.
Tentamos buscar produtos fechados e acompanhar novas gestoras para podermos oferecer um produtos diferenciado para um cliente que ainda deseja manter a parte líquida, mas quer algo diferente.
Na parte de produtos alternativos ilíquidos, o nível de complexidade é maior, porque são oportunidades pontuais. Procuramos interagir com casas de private equity, gestores de venture capital ou de imobiliários para ver onde conseguimos co-investir.
Co-investimos com uma gestora Concept em um ativo de cosméticos, em uma empresa chamada ForeverLiss. É um produto de private equity, ilíquido, o qual não foi disponibilizado em quase nenhuma plataforma, para dizer em nenhuma. E conseguimos, dado um relacionamento histórico com a gestora, um espaço.
Outro exemplo explorado são oportunidades de crédito. Se um cliente quiser tomar R$ 10 milhões, utilizamos a XP para dar a alavancagem. Esse é um produto tradicional. Mas existem clientes com demandas alternativas de crédito. Querem se alavancar para comprar uma empresa ou aumentar a participação em uma. Nesse caso, estruturamos a operação de ponto a ponta, contratamos o banco emissor, realizamos as diligências legais e distribuímos o produto.
O que a Nau tem feito quanto a ESG?
Tivemos uma iniciativa, e não vou nem roubar o mérito, porque foi uma provocação de um cliente, logo quando montamos a empresa. Decidimos criar um fundo chamado Nau Impacto, de renda variável para alocar nas gestoras as quais comentei. 100% da taxa de administração e do rebate são integralmente convertidos em dinheiro e disponibilizados para uma aceleradora de projetos sociais chamada Hub Social.
O volume ainda é pequeno. Temos uma meta mais ambiciosa. Hoje, basicamente esse fundo tem dinheiro dos sócios da Nau, mas a ideia é subir para R$ 50 milhões no curto prazo.
Clientes de family office procuram muito focar na tradição. Como a Nau pretende se provar?
Somos uma turma jovem prospectando clientes com média de idade bem superior. Não tem forma melhor de se provar do que entregando resultado.
É uma vocação diária para não errar. Se errarmos, não teremos o mérito de uma segunda chance, como outras pessoas mais antigas de mercado possuiriam. Temos de acertar.
Preferimos ter um retorno sustentável, mesmo menor, a outras alternativas. Já deixamos passar oportunidades de venture capital, de startups, prometendo resultados de 20%, 30%, 40% ao ano, sabendo que poderíamos estar abrindo mão do próximo Uber (U1BE34), do próximo unicórnio, mas também de um risco de virar 0%.
Por conta do conservadorismo de nossos clientes e pelo fato de serem de alta renda, preferimos pecar pelo excesso. Temos um excesso de conservadorismo. Podemos mudar ao longo do tempo, mas por hora a Nau prefere pecar pelo excesso.