Não é de hoje que o mercado de fundos imobiliários discute quais os parâmetros para a distribuição de rendimentos, em especial se o retorno aos cotistas pode exceder variáveis como o lucro de caixa ou o lucro contábil. Nesta terça-feira (26) o debate ganhou contornos mais definidos com a decisão da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) sobre o fundo Maxi Renda (MXRF11), divulgada em fato relevante ao mercado.
Em dezembro (mas só divulgado ontem), o colegiado da CVM decidiu – ainda que de forma não unânime – que a distribuição de dividendos dos fundos imobiliários não pode exceder o lucro contábil. O caso tem como base um processo em andamento do FII MXRF11.
Segundo a área técnica da CVM, a administração do Maxi Renda vinha distribuindo aos cotistas rendimentos com base no lucro caixa do Fundo, mesmo quando esses valores excediam o lucro contábil. O que não poderia ser feito na classificação de rendimento e, sim, como amortização ou devolução do capital investido pelos cotistas.
Até o momento, trata-se de um processo exclusivo do FII MXRF11, mas o caso levanta um debate para todo o mercado de fundos imobiliários, visto que, caso a decisão seja validada, poderá ser replicada para todos os FIIs.
Mas calma: a administração do FII MXRF11 vai recorrer da decisão e o processo ainda não foi concluído. Ou seja, a decisão pode mudar (ainda mais considerando que não foi unânime) e, até lá, tudo continua igual.
Dito isso, também vale esclarecer o que está em jogo.
O que muda com a decisão da CVM
Segundo o Art. 10, da Lei 8.668, que estabelece a obrigatoriedade de distribuição de rendimentos pelos fundos imobiliários, os cotistas devem receber 95% dos lucros do Fundo, apurados segundo o regime de caixa – não o regime contábil.
Enquanto o lucro de caixa considera todo o montante arrecadado pelos FIIs em forma de aluguéis e outras fontes de arrecadação, o lucro contábil também leva em consideração a avaliação patrimonial dos imóveis.
Hoje, os fundos imobiliários fazem da seguinte forma: o administrador apura todos os seus aluguéis, desconta as despesas que o Fundo tem e distribui o percentual devido aos cotistas. Tudo isso com base no lucro caixa.
Já o processo com o lucro contábil seria diferente: ao somar os aluguéis do Fundo, o administrador também teria que considerar as reavaliações dos imóveis antes de descontar as despesas, para depois calcular os rendimentos.
Na prática, todo o processo de distribuição de dividendos dos fundos imobiliários mudaria com essa decisão da CVM.
“O Maxi Renda sempre foi regime caixa. Com isso a gente teria até que mudar o argumento de venda. Porque sempre falamos para o investidor: não importa o preço do imóvel no Fundo, tá pingando aluguel e você está recebendo isento de imposto. Teria que mudar”, disse Evandro Santos, sócio da XP Asset, gestora do Maxi Renda, em live do Professor Baroni.
Problema em assumir o lucro contábil
Na decisão sobre o Maxi Renda, a CVM não proíbe a distribuição de lucros maiores que o apurado no regime contábil, mas entende que, nesse caso, o pagamento teria que ser feito na forma de amortização.
O principal problema disso é o fim de um dos pilares dos fundos imobiliários, que é a previsibilidade dos rendimentos.
Em live, o professor Marcos Baroni, especialista em fundos imobiliários da Suno Research, destaca o ciclo de recessão que os FIIs vivem nesse momento. Nas últimas reavaliações de imóveis, muitos viram seus valores patrimoniais caírem devido à crise no País.
Com isso, diversos fundos de tijolos poderiam apresentar prejuízo contábil neste começo de ano, segundo essa decisão da CVM, acarretando na não distribuição de rendimentos mesmo com o dinheiro dos aluguéis em caixa.
O contrário também é válido. Em casos de valorização do imóvel, o lucro contábil do Fundo ficaria acima do lucro de caixa, mas sem o valor total desse lucro em espécie, como o rendimento poderia ser completamente distribuído aos cotistas?
Marcelo Fayh, especialista em Fundos Imobiliários, afirma em live com o professor Baroni que com esse entendimento, a CVM desconstrói tudo o que se criou até hoje com FIIs do ponto de vista regulatório e de legislação.
Para os especialistas, o momento é de cautela e de espera. A decisão não é definitiva e eles acreditam que a CVM deve rever sua posição diante do impacto que isso poderia ter no mercado de fundos imobiliários. Assista aqui.
Como fica o MXRF11
Nesta quarta-feira (26), o Maxi Renda apresentou queda no Índice de Fundos Imobiliários (IFIX) da B3 (B3SA3). No fechamento, o FII perdeu 3,90%, com a cota valendo R$ 9,62.
O MXRF11 é um dos Fundos com mais cotistas do mercado, chegando a 488.875. Sua última distribuição de rendimentos foi de R$ 0,09, chegando a 9,82% de dividend yield.