Como usar a mesada como aliada na educação financeira, sem mimar seus filhos

O planejador financeiro Carlos Augusto Santos, mais conhecido como Caco, dá mesada para suas filhas há quase dez anos. E é agora, na adolescência das meninas, que ele colhe os frutos desta iniciativa. Segundo ele, um dos maiores ganhos de ter seguido este caminho é a possibilidade de hoje sentar com suas filhas para ajudá-las a tomar decisões financeiras. “Uma das coisas mais legais da educação financeira por meio da mesada é poder sentar com minhas filhas e discutir as decisões de escolhas delas, como a compra do computador e a poupança para o celular”, conta.

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Segundo especialistas, dar mesada é uma ótima oportunidade para falar sobre dinheiro com as crianças e desenvolver desde cedo a responsabilidade sobre as decisões financeiras, sejam elas boas ou más. Mas a trajetória da mesada não é tão simples como se pensa. Não trata apenas de fornecer um valor em espécie; o pai ou a mãe precisa entender a necessidade do filho, da família e ensinar valores que o auxiliem em sua caminhada financeira.

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“A mesada é um ensaio para a vida adulta e lidar com dinheiro requer algum grau de sabedoria. Vemos muitas pessoas irresponsáveis com dinheiro e lá na frente elas começam a colher as consequências dessa inabilidade de lidar com os recursos. Por isso é tão importante que a criança seja introduzida no mundo do dinheiro”, explica o professor de mercado financeiro na Saint Paul, Eduardo Becker.

Mesada como instrumento de educação

Caco, com 51 anos e morador de São Paulo, introduziu a mesada na vida de suas filhas por acreditar ser um instrumento de educação financeira. Hoje ele conta que a mais velha, que tem 17 anos, e a mais nova, com 13 anos, sabem da importância de guardar, investir e gastar dinheiro.

“Eu tenho duas filhas, e a minha mais velha ganha mesada desde os 10 anos. Já a minha segunda começou a ganhar com 8 anos, por já ver sua irmã ganhando. Essa foi a idade que nós como pais escolhemos, sem certo ou errado. Fomos evoluindo e entendendo quais coisas devem ser pagas com a mesada e quais são de nossa responsabilidade fornecer como pais.”

Para calcular o valor que daria às suas filhas, Caco, em família, listou os gastos necessários para atender as necessidades e o quanto elas queriam receber. Com isso, chegaram a um número que não fosse muito folgado, para que elas pudessem fazer suas escolhas educativas, e nem muito apertado, de modo que elas não deixassem de atender suas vontades.

Com essa educação, sua filha mais velha fez uma escolha de economizar seu dinheiro para conquistar a compra do seu novo celular.

“A minha mais velha passou um ano e meio levando almoço de casa para escola. Havíamos calculado uma verba exata para ela almoçar, é a nossa função como pais prover o alimento. Porém, ela preferiu guardar esse dinheiro, levando marmita de casa, para comprar um celular novo. No começo, ela estava reticente por causa do que as amigas poderiam dizer, então houve um fortalecimento psicológico e nisso ela compreendeu que iria seguir com seu objetivo.”

Caco conta que a mais nova também queria comprar um computador novo neste período de pandemia e que ele enxergou ali uma oportunidade para introduzir a importância de pesquisar e consultar diversos preços. Juntos, decidiram qual dispositivo comprar e a melhor forma de pagar. Para o planejador financeiro, essa é a melhor parte: ver suas filhas desenvolverem escolhas inteligentes.

A partir de quantos anos?

As escolhas financeiras inteligentes das filhas de Caco só são possíveis hoje porque houve uma base introdutória da mesada na infância.

Para que os pais desenvolvam essa habilidade em seus filhos, os especialistas recomendam introduzir a mesada mais cedo do que se imagina.

O CEO do aplicativo Tindin, mesada eletrônica gamificada, Eduardo Schroeder, diz que o momento ideal é a partir do instante em que os pais conseguem enxergar uma finalidade útil ao recurso.

Schroeder recomenda que os responsáveis conversem com a criança. Para ele, essa é uma grande oportunidade para o filho desenvolver a capacidade de argumentação e negociação e com base nisso encontrar o valor da mesada. E para se basear neste argumento, o CEO usa seu exemplo.

“Por exemplo, quando iniciei a mesada do meu filho, aos 3 anos e meio de idade, ele já tinha um objetivo tangível definido, eu já sabia qual era o valor daquele objetivo e tracei um plano para que ele fosse capaz de atingi-lo em 3 ou 4 meses (um prazo que considerei suficiente para exercitar seu auto-controle). Com essas informações foi fácil chegar ao valor, só precisei dividir o preço do seu objetivo pelo prazo estabelecido, chegando assim ao valor da mesada ou mesmo da semanada.”

O CEO do aplicativo aponta também que, conforme seu filho foi crescendo, seus objetivos foram se tornando mais ambiciosos, e a mesada precisou acompanhar essa evolução. “Além da elevação do nível dos objetivos, aos poucos fomos acrescentando outras categorias de gastos, sempre tomando o cuidado para que o dinheiro nunca fosse o bastante para atender imediatamente aos seus desejos”, afirma.

Qual valor?

Os especialistas revelam que o valor depende primeiramente da condição financeira da família. Além disso, o valor tem que ser representativo para criança sem pesar para os pais.

“Se sua família frequenta lugares mais caros e consome produtos de maior valor, é natural que a criança mantenha uma tendência de consumo equivalente. Assim, uma mesada que funciona bem para crianças da classe D provavelmente não funcionará para crianças da classe A”, apontou CEO do Tindin.

O educador financeiro e fundador da DSOP, Reinaldo Domingos, aponta que para estipular um valor será necessário fazer como Caco: sentar em família e ver os gastos e necessidades das crianças.

Além do valor definido, os pais precisam ter em mente que a mesada deverá ser escalonada, para que aos poucos as crianças sejam introduzidas no mundo financeiro.

“A mesada precisa ser escalonada, aumentando conforme a idade. Comece, por exemplo, quando pequeno, com cinco reais em uma semanada, depois uma quinzenada, até atingir a mesada. Ela tem que se acostumar com o fato de que o dinheiro vem em etapas”, apontou o professor.

Mesada não é prêmio e nem castigo

A questão sobre remunerar crianças pelos afazeres domésticos costuma ser polêmica e dividir opiniões. No entanto, todos os especialistas consultados pelo SUNO Notícias não recomendam essa prática.

Caco diz que em sua casa obrigação é apenas obrigação e a criança não deve ser remunerada por isso. “Aqui em casa deixar o quarto desarrumado, por exemplo, irá arcar no máximo em uma chamada de atenção e não na retirada da mesada.” Da mesma forma, quarto organizado e louça lavada não ganham premiação, já que a recompensa é a organização do ambiente.

Na análise dos especialistas, a educação financeira é um dos aprendizados necessários para que a criança e se desenvolva como adulto. Portanto, os especialistas reprovam o ato de remunerar os filhos por suas obrigações diárias, pois quando for adulto, estas serão suas obrigações. Além disso, acrescentam que essa cultura pode criar no futuro um adulto ganancioso.

“A mesada não pode ser usada como prêmio e nem como castigo. Essa é uma regra fundamental da mesada. Há pais que decidem que vão castigar os filhos retirando a mesada por um período de tempo, isso vai contra os conceitos da educação financeira. A mesada deve ser respeitada e jamais virar uma moeda de troca entre pais e filhos. Porque você irá criar uma criança avarenta, sempre querendo troca”, analisou Domingos.

O fundador da DSOP aponta que remunerar a criança por suas tarefas inibem a generosidade e cria um “monstro” que só faz as coisas baseado na troca.

“Se a criança for fazer algo em sua casa, ela tem que fazer por generosidade, contribuição e colaboração. A partir do momento que os pais remuneram a criança pela tarefa o ato da mesada perde sentido porque amanhã essa criança vai só fazer essas coisas bacanas, sendo contributiva na família se tiver dinheiro, você está criando um monstro, está criando alguém que só faz as coisas se for pago.”

Apesar das armadilhas no caminho, a mesada é a única forma de fazer com que a criança tenha contato com a gestão do seu próprio dinheiro e, com isso, erre, acerte, e aprenda.

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Poliana Santos

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