Macro Capital reduz exposição a Brasil, mas está positiva sobre Vale (VALE3) e tecnologia

A Macro Capital, gestora de um fundo de investimento multimercado, está com um pé atrás com o Brasil. Os últimos 30 dias mudaram drasticamente o cenário brasileiro traçado no fim de 2020 — para a casa, a pressão sobre a Bolsa se justifica.

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A gestora começou o ano com uma exposição relevante do seu portfólio ao Brasil, mas já colocou o pé no freio e se desfez de posições em empresas de consumo e varejo, em meio a dúvidas sobre a agilidade do processo de vacinação da população. Agora, a aposta da Macro Capital está concentrada sobretudo nos setores de commodities e tecnologia.

Os papéis de bancos também são considerados baratos hoje pela gestora, e devem ser beneficiados pela melhora no lucro e pela queda na inadimplência. Mesmo assim, incertezas no cenário governamental — como o aumento do CSLL — trazem dúvidas ao mercado.

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“O ambiente, de uma forma geral, piorou muito. Mesmo com a eleição no Congresso, ainda cresce o risco político, fiscal e de intervenção setorial”, afirma Priscila Araújo, gestora de renda variável na Macro Capital, que hoje faz a gestão de R$ 150 milhões.

Mesmo pessimista com o Ibovespa, a casa diz que enxerga a possível valorização de 30% a 40% em alguns papéis específicos como a Vale (VALE3), “que ainda continua muito barata, negociando a menos de três vezes o Ebitda”.

O fundo foi criado no fim de 2019, e hoje é composto por cerca de 20 profissionais — a maioria deles sêniores, com passagem por grandes instituições. Com book único, ou seja, com a tomada de decisões de forma unificada entre as equipes, a Macro Capital diz que cogita abrir novos fundos, embora não seja a prioridade no momento.

Confira os principais trechos da entrevista exclusiva concedida pela gestora ao SUNO Notícias.

Priscila Araújo, gestora de renda variável da Macro Capital.

O Macro Capital One FIC FIM é um fundo multimercado, então olha para diversas vertentes, mas vocês estão comprados mais em Brasil ou exterior? Qual tem sido a tendência do fundo nesse 1 ano e meio de história?

Como todo fundo multimercado, nós olhamos para todos os mercados e todas as classes de ativos. Como o nome já diz, existe um componente de pesquisa macroeconômica muito forte, com uma equipe que embasa todos os investimentos que fazemos. Obviamente, temos um conhecimento maior interno, então nosso fundo tem um componente bastante relevante em Brasil.

Desde que eu entrei na Macro Capital, no ano passado, vínhamos olhando muito para os mercados de Bolsa, a classe preferida era de renda variável, pois havia uma convicção maior sobre os retornos da renda variável. Até o começo deste ano, ainda estávamos bastante divididos entre mercado local e internacional (norte-americano, europeu e asiático).

Desde janeiro, no entanto, as incertezas com o mercado local fizeram com que nós reduzíssemos a posição líquida em Brasil, e mantivéssemos a posição lá fora, até pelo menos meados de fevereiro.

Hoje temos uma série de papéis e empresas que nos chama atenção, mas a posição brasileira está “neutralizada”, com índices e opções. Entendemos que, assim como no ano passado, é melhor estar exposto de alguma forma do que nunca estar, mesmo com as circunstâncias nebulosas.

Neste ano, vemos uma disparidade muito grande entre os setores da economia real, e isso também será refletido nos setores da Bolsa. Sobretudo pelo fato de que empresas do mesmo setor sairão da crise melhor do que as outras, e ainda podemos enxergar essas oportunidades.

Porém, ainda continuamos reticentes com o cenário de curto prazo, tanto por conta da aceleração da pandemia, como pelo risco fiscal. Lá fora, junto com a alta das Treasuries, fomos reduzindo a posição em Bolsa. Zeramos Europa, e continuamos com Estados Unidos e China.

Você entende que os últimos ruídos internos no Brasil, que têm abalado a Bolsa desde a última semana, representam uma real ameaça aos papéis listados, não só as estatais, mas da Bolsa brasileira como um todo?

O cenário mudou radicalmente nas últimas semanas. Atualmente enxergamos alguns riscos presentes e reais e que não ponderávamos há 30 dias. O ambiente, de uma forma geral, piorou muito. Mesmo com a eleição no Congresso, ainda cresce o risco político, fiscal e de intervenção setorial. Além disso, ainda há o risco de alta da inflação.

Até o fim do ano passado, com a tendência de recuperação econômica e com esses riscos em menor grau, víamos a possibilidade de manutenção da taxa de juros, ou então um aumento somente no segundo semestre. No entanto, a pressão inflacionária deve fazer com que o Copom aumente a Selic em 0,5% já na próxima reunião.

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Inicialmente, a nossa perspectiva era de que a taxa de juros encerraria 2021 em 4,75%, mas com os últimos eventos e o cenário macroeconômico deteriorado, passamos a estimar uma Selic em 5,25% no fim do ano. Nossa revisão do PIB, atualmente em 3,8%, também caiu, com risco de voltar a revisar para baixo, caso as medidas de restrição da pandemia aumentem.

Assim, comparando o cenário atual com o que prevíamos no início do ano, podemos ter lucros corporativos menores do que o esperado, um prêmio de risco maior causado pelo front político e fiscal.

Falando em Bolsa especificamente, as últimas semanas, tanto as perspectivas de fluxo de caixa como de múltiplos mudaram. Potencialmente teremos uma rentabilidade contraída em 2021 – por conta da pandemia – e uma taxa de juros maior, o que diminui os múltiplos das empresas, com uma taxa de desconto superior.

Para o mercado acionário no curto e médio prazo, a perspectiva se tornou bem mais negativa.

Essa guinada intervencionista do governo pode trazer desdobramentos similares à Bolsa como em 2014 e 2015?

Vamos pegar o exemplo dos bancos, que terão de pagar mais CSLL a partir de julho. Se olharmos os valuations das instituições, mesmo comparando com os pares internacionais, parecem muito baratos. O lucro deve voltar em 2021, impulsionado pela queda da inadimplência. Também entendemos que a concorrência não deva apertar no curto prazo.

No entanto, o aumento da alíquota de impostos dos bancos deve ser mantido até o fim deste ano, mas quem garante que não será renovado? Na época do governo da ex-presidente Dilma, o momento de maior compressão dos múltiplos dos bancos foi quando o governo utilizou os bancos públicos para baixar, na marra, a taxa de juros. Para não perder market share, os privados acompanharam.

Um dos riscos de intervenção do governo no mercado é justamente esse, a utilização dos bancos públicos de forma não racional para forçar algum movimento. Isso se reflete na nossa conversa da semana passada, quando dissemos que por conta dessa guinada intervencionista do governo as estatais e empresas de setores regulados podem voltar a patamares da recessão.

O fundo possui alguma previsão para o Ibovespa no fim do ano em termos de pontuação?

Não nos preocupamos com o índice no curto prazo. O que sempre dizemos aos cotistas e possíveis investidores é que o Ibovespa é uma cesta de ativos, alguns bons e alguns ruins, e olhar de forma generalizada não nos interessa.

Vemos potencial de 30% a 40% em alguns papéis da Bolsa para não muito longe, e isso não diz respeito ao índice. Mas, se quisermos falar sobre Ibovespa no fim do ano, depende do ciclo das commodities.

Temos cerca de 25% do índice neste setor, então o movimento de empresas do segmento irá influenciar muito. Veja o desempenho da Vale, maior posição do índice, por exemplo. Ela se valorizou mais de 100% nos últimos 12 meses apenas por uma reprecificação dado o patamar do minério de ferro. Ela continua negociando abaixo de 3 vezes em relação ao Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização). A Vale continua muito barata frente ao atual preço do minério.

O tal do “super ciclo de commodities” vai ser muito determinante no patamar do Ibovespa no fim de 2021. Também depende do cenário brasileiro ante a pandemia, além do risco político e fiscal, mas é razoável pensar que podemos ver o índice em patamares parecidos ao do início deste ano (o Ibovespa chegou a negociar acima dos 125 mil pontos em 8 de janeiro).

Quais são os setores que vocês têm olhado nos últimos meses e que chamam atenção, de forma positiva e negativa?

Nós viramos o ano otimistas com o processo de recuperação econômica no Brasil, dados os menores números da pandemia no início do quarto trimestre. No entanto, com a virada do ano e a nebulosidade do cenário local, junto às restrições de mobilidade, reduzimos bastante a exposição aos setores de consumo e varejo já no começo do ano.

Fizemos isso principalmente por conta das incertezas com a possibilidade de mobilidade das pessoas, além de dúvidas sobre a velocidade da vacinação da população, o que impacta diretamente o desempenho da economia.

O terceiro ponto, para consumo e varejo, é o auxílio emergencial. Durante o ano passado, houve um redirecionamento muito forte da renda das pessoas. A capacidade de consumo das classes mais baixas foi artificialmente elevada, e essa renda, que reforçou a atividade de consumo e deixou de lado os serviços, uma hora vai acabar.

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Por outro lado, continuamos vendo um cenário muito positivo para o setor de commodities. Não somente por conta do crescimento de China e Estados Unidos, mas também pelo rebalanceamento da oferta e demanda das principais indústrias. Após muitos anos com preços pressionados, o investimento no aumento da capacidade de produção das matérias-primas foi diminuído, o que acarreta uma oferta retraída hoje.

Outro tema que gostamos é a tecnologia. Seja via players de transformação digital, ou de e-commerce que podem se beneficiar desse movimento transformacional no varejo.

Como vocês têm visto as mudanças no cenário macroeconômico norte-americano, com a eleição do Biden e ampliação da liquidez agora em meio à pressão inflacionária?

Aqui na Macro Capital, vemos esse movimento do mercado ainda como prematuro, com o medo da inflação. Vemos um ambiente favorável para a recuperação econômica, estamos esperando um crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) na ordem de 7% em 2021 e de aproximadamente 5% em 2022, impulsionado pelos pacotes de estímulos que já atingiram US$ 4 trilhões nos últimos meses.

Entendemos que esse último pacote que deve ser aprovado, de US$ 1,9 trilhão, servirá como acúmulo de poupança das pessoas. A partir do segundo semestre, sem os estímulos, a economia deve ser sustentada por esse capital acumulado nos últimos meses.

Sobre a inflação, vemos uma pressão até o segundo trimestre, mas que deve desacelerar ao longo do ano. Para isso, observamos dois movimentos. O primeiro deles é o redirecionamento dos gastos, que saem de bens de consumo para serviços, o que deve acentuar a atividade econômica. O segundo é a capacidade ociosa da economia, que deve segurar o pico da inflação, pois terá mais oferta no ambiente econômico.

Além disso, sustentam essa tese novas tendências deflacionárias, com a digitalização dos processos da economia, desde o e-commerce até o entretenimento. Então não vemos essa pressão inflacionária que o mercado tem precificado para esse ano. Estamos menos preocupados.

Existem planos para a abertura de novos fundos?

Hoje, nosso foco está totalmente voltado à consolidação do Macro Capital One, que é o nosso único produto. Mas, não descartamos a possibilidade de criação de novas estratégias, como Long Short e Long Biased, em novos fundos. Estamos avaliando se faz sentido trazer ao mercado algum produto como esses ao longo de 2021.

Vocês também abrem espaço para modelagem estatística e levam em consideração aspectos quantitativos nas análises. Como funciona o processo de tomada de decisão?

Atualmente, o que possuímos de modelagem estatística serve para projeções macroeconômicas. Hoje, ainda, nós não temos estratégias quantitativas. O que utilizamos para a alocação de capital é nossa própria análise, de cenário macro, em juros e câmbio, e de empresa a empresa. 

Entretanto, estamos avaliando internamente para 2021 incorporar estratégias quantitativas, como mais uma das estratégias de investimentos dentro do time.

Você acredita que um ciclo de alta da taxa de juros no Brasil pode impactar essa tendência da ida das pessoas físicas à Bolsa?

Nós temos a expectativa por uma taxa básica de juros da economia (Selic) de 5,25% no fim do ano, o que seria resultado apenas de uma normalização da taxa de juros no Brasil.

Obviamente, esse processo vai esfriar o impulso de recursos para a Bolsa, ocorrendo uma desaceleração dessa saída de capital da renda fixa para a renda variável. Mas a Macro Capital não vê possibilidade em uma reversão do processo dos últimos três anos, uma volta completa aos investimentos sem risco.

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Jader Lazarini

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