De uma mina de ferro em Nova York, em 1951, nasceu a Iron Mountain (I1RM34), empresa global dedicada a armazenar, proteger e gerenciar ativos. Agora, depois de 70 anos de atuação, a companhia busca dar uma cara nova ao negócio, tendo na transformação digital sua “palavra-chave”.
Ainda em meados do século XX, a Iron Mountain se especializou na guarda e proteção de documentos e bens valiosos de empresas. Na época, tinha-se como pano de fundo a Guerra Fria e a companhia oferecia a solução de resguardar esses ativos, de gravações originais a testamentos, deixando as informações a salvo de ataques nucleares ou qualquer outro desastre.
O desenvolvimento do negócio levou a companhia a armazenar outros gêneros de conteúdo, incluindo BioSafe, obras de arte e artefatos culturais. E, conforme mais mudanças iam surgindo, a empresa decidiu fornecer um portfólio mais completo de soluções, indo do físico ao digital.
“Foi um caminho único, versando sobre o core, que é o conteúdo”, disse Orlando Souza, presidente da Iron Mountain Brasil.
Hoje, a companhia atua na custódia de informações e ativos, gestão de arquivos, e dados e destruição segura. A empresa ainda presta auxílio a clientes na redução de custos de armazenagem, no cumprimento de legislações, na administração de riscos e na utilização de valores gerados por suas informações.
“A Iron Mountain é uma empresa que está interessada em ajudar o cliente em várias etapas, e está preparada para isso”, ressaltou o executivo. “A transformação digital para nós é uma palavra-chave e, principalmente, queremos ser uma plataforma de serviços de conteúdo.”
Atualmente, a companhia armazena e protege ativos de mais de 225 mil clientes, incluindo 95% das maiores empresas do ranking Fortune 1000. No Brasil, onde completa 20 anos, a Iron Mountain está presente em sete estados, além do Distrito Federal, com 38 unidades, 1.800 funcionários e mais de cinco mil clientes.
Confira a entrevista exclusiva de Orlando Souza ao SUNO Notícias.
♦
Me conte um pouco mais sobre a história da Iron. Como mudou tanto o modelo de negócios da empresa?
O negócio continua versando sobre uma parte, que é o conteúdo, o dado.
A primeira coisa que fizemos, na década de 1950, foi proteger o dado de uma forma física, através tanto de caixas quanto outros métodos de armazenagem, e isso foi evoluindo para outros tipos de formatos de conteúdo, como obras de artes, fitas de data center e até plaquetas de exame para BioSafe.
Nos Estados Unidos, temos uma divisão de data center, o que ainda não temos ainda no Brasil, mas é uma outra forma de guardar informações.
Porém mais do que uma empresa de guarda, somos também uma empresa de logística, porque vamos buscar a informação, a trazemos de volta e, quando o cliente precisa de um dado específico, mandamos uma pasta, um arquivo específico, se assim for necessário. Isso é customizado.
Surgiu, então, a necessidade de fazer imagem sob demanda, ao invés de de repente utilizar o transporte; começou a ter o storage virtual. Hoje, fazemos isso usando um mecanismo de busca. Pode-se guardar conosco um arquivo de voz, de imagem e mais uma série de coisas. Nós ajudamos a buscar o dado que se procura.
Onde estão localizadas e como funcionam as instalação da companhia no Brasil?
A Iron Mountain começou as operações adquirindo algumas empresas. Nos últimos 10 anos, fomos como uma consolidadora do mercado. Compramos mais de nove negócios.
Temos mais de 83 galpões espalhados pelo Brasil inteiro, em Pernambuco, em Brasília, em Minas Gerais, no Espírito Santo, no Rio de Janeiro, em São Paulo, no Paraná e no Rio Grande do Sul.
Nos Estados Unidos, a questão da mina foi muito pontual. É uma mina de ferro, seca, que favorece muito o negócio. São quilômetros e quilômetros de oportunidade lá. Mas a maior parte de nossa armazenagem está em galpões com alto nível de segurança, tanto predial, com práticas de combate a incêndio, de LGPD [Lei Geral de Proteção de Dados], de ISO 27101, quanto de segurança física.
O que mudou para a Iron com a chegada da LGPD?
A LGPD trouxe um pouco mais preocupação para o cliente e colocou na linha de frente esse aspecto da segurança do conteúdo, o que para nós é muito bom.
Tem muita empresa no nosso negócio que nasceu com a oportunidade de usar um galpão e não é o core daquela empresas fazer isso. A LGPD sobe um pouco a régua para o que é necessário.
O que nós temos feito? Temos tentado ajudar muito o cliente nessa questão da LGPD, há muita dúvida ainda, sobre o que pode ser armazenado, que não pode ser armazenado, como eles poderiam destruir um documento, se não podem destruir. Nós temos ajudado o cliente nessa parte de “consultoria”.
A LGPD trouxe um boa discussão e nos favoreceu, porque ela subiu a régua de padrão, de qualidade. Como uma empresa global, com capital aberto na Bolsa e as práticas que nós temos, isso é muito bom, porque estamos jogando esse jogo há muito tempo.
E quanto à companhia, qual foi o impacto?
Como uma empresa global, nós já havíamos vivido essa mudança na Europa, depois nos Estados Unidos, e agora [vivenciamos] aqui no Brasil.
A nossa Lei é muito baseada na da Europa e nossos padrões globais, nossos contratos, nossas práticas já seguiam alguns preceitos.
O que fizemos por volta do ano passado foi muito mais pegar alguma especificidade da Lei brasileira, além de contratar especialistas jurídicos para garantir que estávamos aderentes, mas foi muito ajuste fino.
Todas as práticas que tínhamos em função das leis americanas e europeias já estavam seguindo padrões de contratos, de funcionários e clientes, estavam muito aderentes a isso.
Agora, o que vamos fazer bastante é investir em treinamento para deixar nossa área de operações mais apta a oferecer essas consultoria a nossos clientes de uma forma mais massificada.
Entre os segmentos de soluções digitais que a Iron deseja entrar estão “Gerenciamento de Dados em Nuvem”, “Serviços de Digitalização”, “Restauração e Migração de Mídia” e “Automação de Processos”. Como é esse mercado hoje?
Acho que a Iron é a única empresa de nosso mercado no Brasil que está presente desde o começo do ciclo, o físico, até o final, que é o digital.
70% desse mercado é interno, o cliente mantém a guarda interna. Existe ainda uma adoção diferente. Por exemplo, esses 70% ainda estão no começo da jornada de buscar alguém mais especializado para terceirizar e profissionalizar isso.
Quando pegamos empresas mais maduras, que já fazem a guarda externa e já o fazem há um bom tempo, ela está em um processo em que deseja avaliar o processo se o que possui pode ou não ser destruído. Aí, entram a aderência à LGPD e as práticas de mercado, pois cada mercado e cada documento exige uma guarda.
Nós ajudamos o cliente a entender isso e, se for necessário, começamos a fazer a digitalização. Então, começamos a propor ao cliente outro serviço que oferecemos, de digitalizar esse documento e subi-lo ou em nuvem ou em guarda física. Nós entregamos um HD para ele ou fazemos o upload para a própria plataforma. Temos essas três modalidades, sendo normalmente o storage em nuvem.
Conforme subimos esses documentos, conseguimos fazer a destruição do material. E a Iron consegue destruir de forma segura tanto o documento físico quanto a destruição segura de equipamentos de tecnologia. Tem-se que olhar muito a questão de prática ambiental, de segurança de dados e assim por diante.
O cliente no meio disso tem um processo que nasce físico, com documento, com contrato, com ficha cadastral, e ele quer começar a entender como pode ser ser mais efetivo ou otimizar mais esse processo. Em vista disso, nós fazemos um assesment [uma avaliação de perfil], entende como é a jornada desse documento e propomos uma revisão desse processo com a terceirização para nós.
Nós temos clientes em várias etapas da jornada, do varejo, do setor financeiro, cada um em uma parta da jornada. O que é importante é que tentamos fazer nosso portfólio versar sobre cada um deles.
Como está a concorrência nesse setor?
Na parte de guarda, temos muitas companhias locais. São empresas menores que têm um um galpão, ou dois galpões no máximo em cada praça. O mercado de guarda é muito pulverizado e a Iron é líder pela nossa estimativa.
Quando falamos de storage, temos Amazon e outras grandes companhias. O grande ponto é: não fazemos storage normal, como a Amazon faz, o Google faz e outras fazem. Tentamos agregar sempre serviços.
O storage nunca vem sozinho. Ele nasce porque se digitaliza algum documento ou se pega algum dado, por exemplo a voz, e se joga na nuvem. E por trás dele haverá algum tipo de ferramenta pela qual será possível pesquisar da forma que o cliente precisa.
Não concorremos com o Google, porque não vendemos o storage puro e simples. É um storage ligado a algum tipo de serviço de digitalização ou de subir algo que se consiga buscar de acordo com a necessidade do cliente.
Na parte de digital, tem dois tipos. No final da cadeia, tem-se o mais sofisticado, de inteligência artificial e machine learning. Ali tem um monte de gente jogando, IBM, Accenture e assim por diante.
No meio, temos aquelas empresas que estão se transformando e precisam melhorar o processo e, com isso, conseguimos ser muito competitivos. Por quê? O dado deles na maior parte do tempo está aqui conosco.
A competição é híbrida. Há a competição das empresas que já citei e de outras menores, com foco em algum tema.
Com a pandemia, o que mudou para os clientes da Iron?
A pandemia, por um lado, acelerou a digitalização. Pesquisa da Accenture diz que ela acelerou em quatro anos o mercado, a transformação digital.
Isso fez com que algumas empresas olhassem a questão do estoque e verificassem como se poderia otimizá-lo. Houve um movimento nas grandes [companhias] de acelerar a transformação digital e, às vezes até, realizar a destruição segura, se fosse necessário.
Por outro lado, as empresas que fazem a própria guarda, que não terceirizavam, como precisavam otimizar espaço, devolver espaço, reduzir custos, aumentou-se a terceirização.
No meio disso tudo, mudou-se o serviço. Aumentou também o acesso a outras práticas, pelas quais é pedido alguma coisa, vamos lá, digitalizamos e se recebe na plataforma apenas o dados.
Mudou um pouco o comportamento e, por um lado, criou um mercado específico de destruição segura e de mais sofisticação de digitalização. De outro, aquelas empresas que não terceirizavam a guarda estão começando a fazê-lo.
Que perspectivas você vê para o setor, principalmente para o segmento de digitalização?
O grupo publicou, no dia 24 de fevereiro, os resultados na Bolsa de Valores de Nova York [NYSE] e um dos slides era: a gente está mudando um pouco do mercado endereçável por essa jornada toda do físico ao digital.
Então, o mercado endereçável, que o acionista ser em torno de US$ 10 bilhões, está indo para US$ 80 bilhões. Por quê? Estamos entrando mais sério em algumas das pernas que já citei, o storage virtual, a destruição segura de equipamentos de tecnologia.
Lá fora, temos a questão de data center, temos uma joint venture com uma empresa chamada MakeSpace para o mercado consumidor de guarda. Nós aproveitamos nossa logística para buscar na sua casa. É um produto que nós temos lá fora que deve chegar aqui mais cedo ou mais tarde.
Temos muitas fitas originais, discos originais. Lá fora é muito forte e aqui também. Temos muitos discos da MPB, de rock nacional que os originais estão conosco e pouca parte disso ainda está na questão de streaming. Podemos ajudar as empresas na conversão disso, na manutenção disso.
Esse mercado endereçável é muito grande. Temos uma oportunidade enorme. Costumo dizer nós [da Iron Mountain] temos uma cauda longa. Aqui no Brasil nós temos cinco mil clientes e nos Estados Unidos são mais de 98 mil clientes. Conseguimos entrar desde um pequeno escritório de contabilidade até um grande empresa, como um grande banco no Brasil.