IPCA: Após sequência de sustos em 2021, expectativa para 2022 piora
Em escalada ao longo do ano, o Índice Preços ao Consumidor Amplo, o IPCA, foi um dos protagonistas do noticiário econômico em 2021. A escalada da inflação forçou ajustes monetários agressivos e penalizou especialmente os brasileiros mais vulneráveis socialmente, com boa parte do índice sendo puxado por alimentos e pelo combustível.
Atualmente, o IPCA – que é um número baseado em uma ‘cesta de preços’ de mercado – acumula dois dígitos, o que já é considerado expressivamente preocupante.
Em alguma medida, os especialistas enxergavam um IPCA perto dos 10,73% atuais. Contudo, ainda assim, a inflação foi considerada fora de controle por alguns analistas, que passaram a ver um ambiente macroeconômico deteriorado.
Essa piora já contamina as projeções para o IPCA em 2022, que têm aumentado. Confira as projeções do mercado para a inflação em 2022.
- Itaú: projeção para o IPCA em 2022 aumentou de 4,3% para 5,0%
- BTG Pactual: Mantém projeção de 5% para 2022
- Banco ABC Brasil: Mantém previsão em 5%
- Banco Safra: A previsão aumentou de 4,0% para 4,1%
- Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA): elevou previsão de 4,1% para 4,9% em 2022
- Relatório Trimestral de Inflação do BC: a previsão era de 3,7% e passou para 4,7%
- Ativa Investimentos: Mantém prognóstico em 4,6%
O Boletim Focus, que reúne os dados levantados com economistas consultados pelo Banco Central (BC), vê a inflação acima do teto da meta estipulado pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), em 5,03%.
O BC tem como meta que a inflação fique em 3,5% em 2022, com um intervalo de tolerância de 1,5 p.p. para cima ou para baixo. Ou seja, 2% é o piso da meta e 5% é o teto.
Tendência do IPCA em 2022
Para 2022, um dos principais motivos de preocupação é a política fiscal do governo, segundo os analistas do Bank of America (BofA).
Em relatório, o analista David Beker afirmou que a política atual focada no pagamento de auxílio à população – devido à Covid – pode pressionar a demanda agregada e causar uma deterioração ainda maior das contas públicas. “Os questionamentos sobre a questão fiscal aumentam riscos de desancoragem da inflação”, afirma.
Outro ponto de pressão é o dólar, que deve ficar em alta devido às incertezas eleitorais, pressionando os preços dos produtos importados, incluindo alimentos e combustíveis. Ao mesmo tempo, o aumento da circulação de pessoas devido ao avanço da vacinação, tem impulsionado o preço dos serviços.
“O grau de incerteza associado ao câmbio no ano que vem é gigantesco. Ele tem chance de chegar muito mais do que R$ 5,70, dependendo das chances dos candidatos e das agendas. Com a incerteza, não sabemos quais são as agendas. Por enquanto, o cenário fica em aberto e pode atingir patamares maiores, sendo um gatilho para alguns outros avanços da inflação”, afirma Étore Sanchez , economista-chefe da Ativa Investimentos.
A trajetória da inflação em 2021
A escalada da inflação foi intensa em 2021, se acelerando principalmente no segundo semestre. Veja os dados:
Os principais motivos que explicam a alta em 2021 são a deterioração recente do cenário fiscal – que ocasiona alta do dólar – a injeção de capital e a crise na cadeia de suprimentos, ou supply chain.
A alta do petróleo, do minério e das demais commodities ao longo do ano foi um dos motivos de pressão nos custos de produção.
No caso do minério, a cotação chegou ao patamar de US$ 200 entre maio e agosto, maior preço da última meia década. Mas, segundo a autoridade monetária, a principal pressão vem dos barris.
“Em comparação com a estimativa do modelo apresentada nos Relatórios de Inflação de setembro e dezembro de 2020, observa-se uma elevação do repasse cambial, explicado em boa medida pelo aumento do peso dos derivados de petróleo no IPCA, sobretudo da gasolina”, diz o Banco Central em box do Relatório de Inflação (RI) do mês de dezembro.
Outro ponto de preocupação é a pandemia, depois da identificação da nova variante, a Ômicron – que ainda causa incerteza nos analistas acerca do impacto nos preços.
Além disso, a conta de luz teve altas sucessivas no ano, com a crise hídrica sendo um dos principais drivers. Isso já era previsto no fim do ano passado, quando a Aneel aplicou, para o mês de dezembro, a bandeira vermelha em patamar 2, o rótulo mais oneroso para os consumidores.
O custo extra será de R$ 6,24 para cada 100 quilowatts-hora consumidos.
“Além da bandeira tarifária da Escassez Hídrica, que acrescenta R$ 14,20 na conta de luz a cada 100 kWh consumidos, em vigor desde setembro, houve reajustes nas tarifas em Goiânia, Brasília e São Paulo. Em Belém e Porto Alegre o recuo decorreu da redução da alíquota de PIS/Cofins”, detalha o gerente do IPCA, Pedro Kislanov.
Com isso, os especialistas do Banco Safra elevaram a estimativa para o IPCA à época. As estimativas de mercado miravam algo abaixo de 5%, ao passo que nenhuma casa vê o IPCA abaixo de 10% em 2021.
Apesar disso, uma surpresa positiva no fim de 2021.
Itaú e BTG veem cenário mais deteriorado
Com patamares já elevados, acima das análises feitas em meses anteriores, os especialistas seguem vendo uma maior tensão inflacionária para o ano de 2022.
“O ambiente econômico e político do Brasil realmente piorou nos últimos meses, fazendo com que as principais variáveis macroeconômicas se deteriorassem maciçamente. De acordo com a pesquisa Focus do Banco Central, a inflação agora deve terminar 2021 em 10,0% e, talvez mais preocupante, as expectativas para 2022 subiram para 5,0%, cada vez mais longe do centro do intervalo da meta”, dizem os analistas do BTG Pactual.
Além disso, o banco de investimento destaca que a inflação e taxas de juros mais altas irão claramente impactar a atividade econômica em 2022.
“A mesma pesquisa Focus mostra que as projeções de crescimento do PIB para 2022 foram revisadas novamente para baixo, com o consenso apontando agora para um crescimento de apenas 0,5% no próximo ano”, diz o relatório.
“O ambiente, segundo os analistas, está forçando o BACEN a aumentar agressivamente as taxas de juros, que encerrarão 2021 em 9,25% (ante 2,0% no início de 2021) e deverão atingir um pico de 11,75% em março de 2022″, segue.
Em consonância, a última revisão do cenário macroeconômico do Itaú, feita pelo economista-chefe do banco, Mário Mesquita, também mira 5%, mas dá ênfase nos custos de produção e nos problemas na cadeia de suprimentos.
“Projetamos IPCA de 5,0% em 2022, após alta próxima a 10,0% neste ano. O choque de bens industriais ligado a gargalos de produção segue mostrando maior persistência, com efeitos secundários sobre demais preços na economia, principalmente em serviços. Com efeito defasado da alta de juros e hiato ainda aberto, esperamos alta de 3,3% no IPCA em 2023”, diz o relatório, intitulado ‘Novo ano, mesmos desafios’.
Novembro teve IPCA melhor do que a expectativa – mas o pior desde 2015
Vendo a escalada dos preços, o consenso de mercado projetava que a leitura mais recente do IPCA seria acima de 1% – dado o cenário global que também demonstrava inflação descontrolada em países da Europa, por exemplo.
“O mês de novembro trouxe mais uma surpresa para a inflação, algo que que tem sido frequente neste ano. Desta vez, o IPCA ficou bem abaixo das projeções, ao subir menos de 1% na comparação com outubro”, diz o Safra.
“Com isso, o Safra fez um leve ajuste para o IPCA de 2021, esperando agora alta de 10,0%. No entanto, como a maior parte do arrefecimento da inflação no mês passado esteve concentrada em poucos itens, é importante destacar que, estruturalmente, o comportamento dos preços segue desfavorável”, segue o banco.
Para Étore Sanchez, da Ativa Investimentos, a leitura de novembro teve um impacto direto da Black Friday, o que sinaliza alguma desaceleração do índice, mas não é necessariamente um indicativo de otimismo.
“Acho que a leitura foi esporádica, ficou concentrada nos itens da black friday. O esperado é que isso [inflação] volte em dezembro ou janeiro. O alívio pontual não se trata de alívio estrutural. Acho que os índices devem se desacelerar, mas não nesse nível”, analisa.
A inflação segundo os dados do IBGE
Nos últimos meses, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o IBGE, o grande vilão do índice tem sido a gasolina, que encareceu o segmento de ‘transportes’ na mensuração dos preços.
No mês de novembro, por exemplo, a alta foi puxada pelos transportes (3,35%), influenciados pelos preços dos combustíveis, principalmente, da gasolina (7,38%), que teve, mais uma vez, o maior impacto individual no índice do mês.
Houve altas também nos preços do etanol (10,53%), do óleo diesel (7,48%) e do gás veicular (4,30%). Com o resultado de novembro, a gasolina acumula, em 12 meses, alta de 50,78%, o etanol de 69,40% e o diesel, 49,56%.
A tendência, contudo, é que o combustível fique mais baixo no varejo.
“O potencial baixista é fruto da queda no preço do barril de petróleo internacional, sendo negociado próximo aos US$70 dólares nesta quinta. Em geral, o mercado e diversas commodities reagiram à incerteza trazida pela nova variante Ômicron com o temor de possíveis novas restrições de mobilidade e queda de demanda”, explica Guilherme Sousa, economista da Ativa Investimentos.
Em movimento recente, a Petrobras (PETR4) informou que o preço da gasolina nas refinarias terá redução de R$ 0,10, passando dos atuais R$ 3,19 para R$ 3,09.
A mudança de preços equivale a uma redução de 3,24% e deve arrefecer a pressão do preço para encher o tanque, que atualmente se encontra em patamares recordes, na faixa dos R$ 7 em diversos estados.
Desta forma, além do Câmbio em elevação, outro driver relevante deve ser a mudança das decisões em cartel – como mudanças na Opep+ – acerca da produção e da oferta de petróleo.
Em caso de redução de oferta e de um novo imbróglio, os preços podem voltar a patamares mais altos, e consequentemente puxarem novas altas no IPCA, conforme visto na segunda metade deste ano de 2021.