Com o avanço do mercado de capitais no Brasil, o acesso a outras geografias passou a ser cada vez mais facilitado para quem quer diversificar seus investimentos. O desenvolvimento tecnológico e a demanda por ativos de risco fizeram com que o investimento no exterior chegasse aos pequenos investidores, sobretudo nos últimos anos.
Ao olhar para fora do Brasil, os investidores de varejo ampliaram a fronteira de oportunidades para alocação de capital. Somente nos Estados Unidos, são cerca de 4 mil empresas listadas, com uma capitalização de mercado que gira em torno de US$ 50 trilhões. O investimento no exterior também dilui o risco Brasil e expõe o pequeno investidor à mais forte moeda do planeta: o dólar.
Contudo, muitos se perguntam: ainda vale a pena investir com o dólar em alta? Desde o início da pandemia, a divisa dos Estados Unidos já se valorizou cerca de 40% frente ao real. O medo dos iniciantes no mercado internacional é aplicar suas poupanças fora do Brasil e ver o dólar cair — levando embora parte do investimento.
Vale ressaltar que a cotação do dólar é suscetível a diversas variáveis macroeconômicas, as quais muitas vezes são difíceis de prever. A chegada do coronavírus, por exemplo, trouxe uma crise econômica sem precedentes em todo o mundo, fazendo com que os investidores procurassem alocar seu capital na moeda mais segura do mundo, valorizando a divisa norte-americana.
A resposta para a pergunta citada não é consensual no mercado. Há pontos de vista diferentes, a depender do horizonte temporal para a aplicação e necessidades pessoais de cada investidor. Confira a opinião dos especialistas consultados pelo SUNO Notícias.
A diferenciação entre dólar e investimento no exterior
Para alguns, o dólar subiu tanto frente ao real, que a probabilidade mais alta é de desvalorização daqui para frente. Mas não é isso que tem acontecido.
Ouve-se que o dólar está caro há muito tempo e ele não para de subir, como diz o sócio e diretor da GeoCapital, Gustavo Aranha. “Ao mesmo tempo que todos acham que o dólar está em um patamar acima do justo, ninguém sabe o que acontecerá no mês que vem, ou ano que vem.”
A GeoCapital é uma asset focada exclusivamente em investimentos no exterior. Fundada em 2013 e com R$ 1,2 bilhão sob gestão, a visão da empresa é que para investir no exterior é necessário “separar as duas coisas”, os ativos de fora do País e o dólar.
“Existe uma confusão entre os investidores. Muitos costumam medir o patrimônio inteiramente em reais. Mesmo a parte que ele investe em dólar, ele pensa em reais. Então ele olha para o dólar como uma classe de ativo. É preciso tomar uma decisão de longo prazo de olhar para os ativos dolarizados como uma forma de estar exposto à moeda forte.”
Em outras palavras, Aranha defende que investir no exterior é uma boa pedida porque garante maior segurança e diversificação à carteira, e por isso vale a pena o investidor deixar um pouco o real de lado e pensar em sua carteira de longo prazo em termos globais.
Além disso, ele acredita que o dólar tem uma tendência de alta frente ao real. Isso porque a inflação prevista para os Estados Unidos é menor que a do Brasil, fazendo com que o real perca seu poder de compra em uma velocidade muito maior que o dólar.
“Na minha visão, há um ‘norte magnético’ que sempre valorizará a moeda norte-americana frente ao real”, afirma. Falando em longo prazo, sempre é dia de comprar ativos dolarizados, segundo ele.
Ativos dolarizados protegem quem tem custos em dólar
O investimento em ativos dolarizados também faz sentido para os investidores que possuem custos baseados na divisa norte-americana. Desta forma, uma alta no dólar fará o custo aumentar, mas também aumentará os ganhos com os investimentos, reduzindo os riscos.
Nesse sentido, vale ressaltar que todo e qualquer brasileiro está suscetível ao mercado internacional. Seja por meio das commodities, interferindo no preço dos alimentos e combustíveis, ou peças eletrônicas, que impactam o custo de maquinário de indústrias e montadoras de veículos.
“Afinal, quem nos garante que as contas públicas não piorem, depreciando ainda mais o real? Por questões de diversificação, faz sentido”, afirma o Laszlo Lueska, da Octante Capital. A Octante faz a gestão de aproximadamente R$ 500 milhões e é focada exclusivamente em crédito privado de emergentes, operando nos mercados internacionais.
Segundo Lueska, outra opção para os investidores pessoa física é aplicar em um fundo de investimento com hedge, ou seja, o ganho se traduz apenas pela valorização nominal dos ativos integrantes do portfólio do fundo, e a variação cambial não interfere no resultado.
Futuro do dólar é sempre uma incerteza
Embora investir no exterior tenha muitas vantagens, o dólar também é um risco. Isso porque quando são enviados recursos para o exterior, antes de qualquer ativo, a primeira compra é o dólar. No momento atual, alguns especialistas são mais cautelosos em relação a investir fora do Brasil.
“Ao investir no exterior, sempre existe um complicador adicionado à questão da volatilidade cambial. Para onde o dólar vai? Ninguém sabe. Quem disser que sabe está mentindo”, diz o economista-chefe da Infinity Asset, Jason Vieira.
Na visão do economista, que trabalha no mercado financeiro desde 1994, mesmo assim é preciso ponderar o movimento do dólar face ao real quando a decisão de se investir no exterior é tomada.
Para ele, “um ciclo de valorização do real pode acontecer a qualquer momento, pois a moeda já está estressada, o problema é saber quando será este momento”.
“Com um ambiente mais favorável ao real, isso pode se tornar um problema para o investidor que tem dinheiro lá fora”, pontua o economista. “É um momento delicado para o investimento no exterior.”
O enfraquecimento do dólar e a apreciação relativa
Um tema amplamente discutido no mercado é o possível enfraquecimento do dólar no mercado internacional. Em função da pandemia, o Federal Reserve (Fed), Banco Central norte-americano, se viu obrigado a sustentar a economia com extensos estímulos monetários, o que acabou por trazer críticas acerca da massiva impressão de dinheiro.
Até o fim do ano passado, os gastos dos Estados Unidos para superar a crise sanitária já haviam ultrapassado o Plano Marshall, programa de ajuda econômica do governo norte-americano aos países da Europa Ocidental depois da Segunda Guerra Mundial.
Neste ano, o presidente Joe Biden assumiu o governo e já distribuiu US$ 1,9 trilhão para famílias e empresas, e mantém um plano de US$ 2,25 trilhões para infraestrutura, criação de empregos e economia verde. Tudo isso têm um custo: mais ofertas de dólares em circulação podem derrubar o valor da divisa.
“Não há nenhum indício de que o Fed irá parar com a impressão de dinheiro. Até o fim deste ano, já está contratada a compra de ao menos US$ 120 bilhões mensais em títulos privados por meio do Quantitive Easing“, lembra Vieira.
“Vale lembrar que ano passado o próprio dólar já passou por um grande ciclo de desvalorização frente a outras moedas do fortes, o que aconteceu foi que o real se desvalorizou ainda mais”, diz.
Por outro lado, é factível que dólar se desvalorize ao longo do tempo, mas é preciso discutir em relação a que. “Nesse sentido, é preciso pensar do ponto de vista do real. Quando ouvimos que o dólar pode ficar mais fraco, isso não significa que o real ficará mais forte. O dólar pode, sim, perder valor, mas isso não quer dizer que a divisa vai se desvalorizar frente às moedas de emergentes”, afirma Aranha.
O sócio da GeoCapital diz que, inclusive, caso o dólar perca força contra as moedas emergentes, será prejudicial para esses próprios países. “Pensando em um horizonte de 20 ou 30 anos, aposto de olhos fechados no dólar frente ao real, embora não saibamos para onde ele vai no curto prazo. Isso não muda nosso processo de investimento no exterior.”