Selic: por que a inflação alta nos EUA pode azedar o ritmo de cortes de juros no Brasil

Uma série de indicadores econômicos divulgados nos Estados Unidos levou o mercado financeiro a revisar suas expectativas em relação ao início do processo de redução de juros pelo Federal Reserve (Fed). Anteriormente previsto para junho, o primeiro corte da taxa básica dos Fed Funds agora é esperado para o segundo semestre deste ano, o que tem implicações importantes para os investimentos não só nos EUA, mas também em mercados emergentes, como o Brasil. Esse cenário intensifica incertezas e pode trazer mudanças no ritmo de cortes da taxa Selic nas próximas reuniões do Comitê de Política Monetária do Banco Central.

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Segundo o BB Investimentos (BB-BI), dados como o índice de preços ao consumidor (CPI) e o relatório do mercado de trabalho (payroll) de março foram determinantes nessa mudança de perspectiva. Os estrategistas dizem que o mercado agora precifica uma probabilidade menor de cortes de juros nos EUA nos próximos meses, o que tem impacto direto nos investimentos estrangeiros em renda variável.

Com os investidores estrangeiros buscando segurança nos títulos do Tesouro americano, afirma o BB-BI em análise, é provável que menos recursos sejam direcionados para as bolsas de países emergentes, como o Brasil. Isso pode impactar negativamente o desempenho da Bolsa brasileira, o Ibovespa, e desacelerar o fluxo de capital estrangeiro para o país – e a taxa Selic.

Demora do Fed e impacto na decisão do BC sobre a Selic

Além disso, segundo os analistas, a demora do Fed em reduzir os juros nos EUA pode influenciar a política monetária brasileira e, consequentemente, a taxa Selic. A possibilidade de que o Fed adie a redução das taxas pode levar o Banco Central do Brasil a adotar uma postura mais cautelosa em relação ao processo de afrouxamento monetário, reduzindo o ritmo atual de cortes da taxa Selic.

O BB-BI diz que é importante ressaltar que a trajetória da taxa Selic também depende de fatores internos, como o desempenho da economia brasileira e a evolução da inflação. Embora indicadores recentes sugiram um possível crescimento positivo do Produto Interno Bruto (PIB) e um aumento nas vendas do varejo, incertezas persistem em relação à dinâmica da inflação e ao cenário econômico futuro.

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Em reunião com o BC, economistas relatam preocupação com juros do Fed

As preocupações com a dinâmica econômica global e os rumos da inflação nos Estados Unidos dominaram as discussões nas duas primeiras reuniões entre economistas de mercado e diretores do Banco Central nesta sexta-feira (12). O aumento da incerteza em relação ao início dos cortes nos juros pelo Federal Reserve (Fed) e os possíveis impactos na economia brasileira foram temas centrais dos encontros, juntamente com preocupações inflacionárias e fiscais internas. As informações foram publicadas pelo jornal Valor Econômico.

A visão predominante entre os participantes foi a de que o Fed adiará os cortes de juros, com alguns levantando a possibilidade de que essas medidas sejam postergadas para o próximo ano. Isso pode sinalizar um fortalecimento do dólar globalmente e dificultar o fluxo de capitais para países emergentes, incluindo o Brasil.

No âmbito doméstico, o Valor informou que as discussões se concentraram mais em aspectos qualitativos do que quantitativos. As projeções para a inflação giraram em torno de 3,5% a 4% tanto para este ano quanto para o próximo. Houve preocupação com a dinâmica da inflação de serviços, considerando o crescimento econômico e o mercado de trabalho aquecido, com a possibilidade de o IPCA de 2025 superar o deste ano.

Os participantes, segundo o jornal, mantiveram a visão de que o mercado de trabalho permanecerá aquecido. Algumas discussões também abordaram o crescimento econômico, com surpresa em relação à resiliência da atividade econômica diante de uma política monetária ainda restritiva. Houve debate sobre o impacto dos estímulos fiscais, do mercado de trabalho e do crédito na economia, com algumas opiniões divergentes sobre o nível atual do crédito em relação ao ciclo econômico.

Após sexto corte consecutivo, Selic caiu para 10,75% ao ano

O BC anunciou, em 20 de março, o sexto corte consecutivo na taxa básica de juros do país, a Selic, totalizando uma redução de 0,50 ponto percentual e levando-a a 10,75% ao ano. Esse movimento representa o menor nível da Selic desde fevereiro de 2022. A série de cortes reflete uma melhora gradual do quadro inflacionário no Brasil, com o BC adotando medidas para estimular a atividade econômica e o consumo.

A redução da Selic pode tornar o crédito mais acessível para empresas e famílias, estimulando o consumo e os investimentos. Os próximos passos do BC serão acompanhados de perto, pois suas decisões têm impacto direto em diversos setores da economia, do mercado financeiro ao consumo e aos investimentos em empresas.

Varejo tem avanço forte, e mercado vê risco para corte maior da Selic

A preocupação do mercado com o o freio no ritmo de redação da Selic não fica apenas com a inflação nos EUA e a postura do Fed sobre juros, O comércio varejista começou o ano com crescimento robusto. Após expansão de 2,8% em janeiro, o volume vendido avançou mais 1% em fevereiro, o que fez o setor atingir novo patamar recorde, segundo os dados divulgados nesta quinta-feira, 11, pelo IBGE.

O resultado surpreendeu analistas ouvidos pelo Projeções Broadcast, que esperavam uma queda mediana de 1,3%. Com mais esse dado, economistas passaram a ver espaço para uma expansão maior do PIB no primeiro trimestre deste ano. Mas também levantou preocupações sobre o processo de desinflação no País – e, consequentemente, sobre o ritmo dos cortes da Selic.

“A contar pelo número do varejo, me parece que a probabilidade de um crescimento mais forte do PIB aumentou”, afirma o economista Helcio Takeda, da Pezco, que adicionou viés de alta nas projeções de expansão da economia no primeiro trimestre (0,6%) e em 2024 (2,2%). “O cenário já estava melhor com os dados de janeiro, e esse resultado (de fevereiro) aumenta a sensação.”

O analista chama atenção, porém, para o crescimento de alguns segmentos do varejo mais atrelados ao crédito, o que pode indicar algum estímulo ao setor vindo dos cortes já promovidos pelo Banco Central na Selic. “Se essa percepção for verdade, e começarmos a ver condições favoráveis para o varejo nos próximos meses, pode ter um desafio na dinâmica da inflação de bens (industriais).”

Varejo e desaceleração do ritmo de cortes dos juros no Brasil

Outros economistas mencionaram avaliações similares após a divulgação dos dados. Em relatório, os economistas Álvaro Frasson e Victor Esteves, do BTG Pactual, afirmaram que os números do varejo podem não só levar o mercado a aumentar as projeções de crescimento do PIB neste ano, como também reforçam a chance de desaceleração do ritmo de cortes da taxa Selic a partir de junho.

“O dado reforça as probabilidades em torno da redução do ritmo de corte de juros pelo Banco Central na reunião de junho, que ganha corpo após a leitura do IPCA que, mesmo surpreendendo para baixo, mostrou resiliência na inflação de serviços intensiva em trabalho e também com o maior pessimismo sobre o ciclo de flexibilização monetária pelo Fed (o banco central americano)”, escreveram eles.

O Santander aumentou as suas estimativas de alta frequência (tracking) para o crescimento do IBC-Br (espécie de “prévia” oficial do PIB) de fevereiro, de 0,4% para 0,7%, e do PIB do primeiro trimestre, de 0,7% para 0,8%. Já o C6 Bank adicionou viés de alta à projeção de crescimento da economia em 2024, hoje em 2,4%, e mencionou a percepção de menor espaço para o afrouxamento monetário. “Há chance de a autoridade monetária não chegar a uma taxa terminal de juros de 9,25%, que é a nossa atual projeção para a Selic de 2024”, diz a economista do banco Claudia Moreno.

Crescimento do varejo e expansão do crédito

O crescimento do varejo no primeiro bimestre de 2024 foi impulsionado pela expansão do crédito, pelo aumento da massa de salários em circulação na economia e pela redução de preços em itens como vestuário e eletrodomésticos, enumerou Cristiano Santos, gerente da pesquisa do IBGE.

Na passagem de janeiro para fevereiro, houve aumento nas vendas em seis das oito atividades pesquisadas pelo órgão: artigos farmacêuticos e perfumaria (9,9%); outros artigos de uso pessoal e doméstico, que inclui lojas de departamentos (4,8%); livros e papelaria (3,2%); móveis e eletrodomésticos (1,2%); equipamentos de informática e comunicação (0,5%); e vestuário e calçados (0,3%). Na direção oposta, o volume vendido recuou em combustíveis (-2,7%) e supermercados (-0,2%).

Quanto ao varejo ampliado – conceito que inclui as atividades de material de construção, veículos e atacado alimentício -, as vendas cresceram 1,2% em fevereiro ante janeiro, outro dado que o BC deve avaliar na hora em que o Copom se reunir para decidir sobre o rumo da Selic.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Com Estadão Conteúdo

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Murilo Melo

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