A Hashdex, gestora de recursos focada em criptoativos, não enxerga o Bitcoin (BTC) como o bad guy do futuro e disse que 2% de exposição ao mercado de cripto pode fazer a diferença no portfólio do investidor.
Nos últimos meses, o Bitcoin foi alvo de escrutínio de autoridades e ativistas ESG, pela dificuldade de rastreabilidade, o que poderia favorecer cibercriminosos e causar impactos socioambientais com o consumo massivo de energia. Mesmo assim, Roberta Antunes, Chief of Growth da Hashdex, afastou a possibilidade da criptomoeda ser a vilã do futuro. A executiva acredita na regulação e até no potencial verde do ativo.
Neste mês, a gestora — que hoje conta com R$ 3,5 bilhões sob gestão e 230 mil clientes — lançou um ETF de Bitcoin com critérios ambientais, sociais e de governança. O objetivo do BITH11 é estimular o potencial sustentável do criptoativo, mas há outro atrativo: a exposição ao mercado.
De acordo com Antunes, uma alocação de 1% a 5% pode não doer tanto no bolso do investidor caso o investimento venha a falhar. Por outro lado, o potencial de retorno o qual o mercado de cripto proporciona pode fazer a diferença no final do dia.
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O mercado de cripto é tido como de risco e alta volatilidade. Como a senhora avalia o segmento hoje?
Porque o Bitcoin foi o primeiro criptoativo, entende-se cripto como moeda. Esse é o principal desafio. O mercado tem dificuldade de sair dessa conversa. A blockchain é uma maneira descentralizada de abordar diferentes problemas. Por isso, entendemos cripto como inovação tecnológica, um acesso a essa rede, aos projetos dentro dela.
Quanto maior o valor gerado, mais alta a a adoção e maior a valorização do cripto. Métricas de valuation utilizadas no mercado financeiro, como o fluxo de caixa, não são adequadas ao segmento, pois os fundamentos estão relacionados a inovação tecnológica. É uma nova forma de ver.
O cripto viabilizará o desenvolvimento de outras indústrias, algo que hoje não é possível enxergar. A infraestrutura está sendo feita e aparecerá muito nos próximos anos. Isso facilitará o entendimento do uso e do social dessas plataformas. Ainda é difícil investir em cripto. A fricção é grande — conta na exchange, escolher o ativo, chave privada. E mesmo assim é um mercado de US$ 2 trilhões. Com o crescimento, facilidades surgirão e o entendimento aumentará. Estamos só no comecinho.
Porém existem criptoativos que são criptomoedas, o Bitcoin, por exemplo…
Dizem que acreditariam no Bitcoin apenas quando for possível usá-lo para comprar um sorvete. Não é necessariamente a melhor comparação. Acreditamos na tese de reserva de valor. A primeira grande inovação do Bitcoin é gerar confiança, sem a necessidade de um centralizador. Isso faz com que grandes investidores o vejam como uma opção ao ouro, para se proteger de eventos macro.
O Bitcoin traz para o portfólio uma característica de descorrelação, porque a tese é outra. Recomendamos Bitcoin — e criptomoedas, de maneira geral — como uma oportunidade de retorno, sem elevar o risco. Falamos em incluir de 1% a 5% no portfólio do investidor. Se colocar 2% e for a zero, perdeu-se 2%. Não é that big of a deal. Mas, se esses 2% crescerem 1.000% ao ano, como têm feito historicamente, podem fazer a diferença. Não é para colocar 50% na carteira. É muito volátil, porque é uma tecnologia muito incipiente. Ao mesmo tempo, a oportunidade está na volatilidade. Se fosse algo estabelecido, estaria precificado.
Há uma preocupação relativa ao perigo de regulação?
Não vejo a regulação como negativa. A comunidade cripto tem medo de ser regulada, e eu entendo. Uma parte levanta a bandeira da privacidade, de não ser possível identificar o investidor. Isso tem valor para pessoas fugindo do Líbano, da Venezuela.
Mas a regulação indica sinais — como a possibilidade de declaração de cripto no imposto de renda separadamente, tanto nos Estados Unidos quanto no Brasil — são caminhos para normalizar e tornar aceitável para investidores institucionais, onde está o dinheiro. A evolução da regulação na verdade abre espaço para um novo dinheiro.
Quanto à privacidade, uma crítica é de que o mercado de criptoativos poderia ser usado para crimes. Como a senhora enxerga a questão?
O agente de má fé tem o incentivo de tomar o risco da inovação. O senado dos EUA considerou há muitas décadas proibir o automóvel, pois era uma ferramenta utilizada por criminosos para fugir da polícia. A insegurança é normal, porém hoje existem controles, principalmente no ambiente onde se negocia.
Todas as exchanges com as quais a Hashdex trabalha são obrigadas a acompanhar as transações da rede para fazer KYC (sigla em inglês para Conheça Seu Consumidor). Como a blockchain armazena informações históricas, é possível identificar uma operações suspeitas, para evitar lavagem de direito, operações ilícitas.
A Hashdex ainda contrata um sistema para monitorar transações que passam por exchange e saber quais são os endereços, verificá-las, classificar risco de carteira. Hoje, dentro do mercado regulado, existem infinitas maneiras de mapear e entender a procedência do dinheiro.
Que exchanges a Hashdex utiliza?
Negociamos no exterior. Usamos Coinbase (C2OI34).
Há outros riscos associados à classe, como as pressões devido aos critérios ESG. Qual a visão da senhora quanto a isso?
Pela rede do Bitcoin ser proof of work, gera um consumo de energia. Todo o sistema, para gerar confiabilidade, gastará energia. É caro garantir segurança e a escalabilidade. Não achamos que o Bitcoin será o bad guy do futuro — virará algo verde, mas ainda não é, como o ouro e o dinheiro.
Por isso, lançamos o primeiro ETF de Bitcoin green, para minimizar esse impacto. Compramos esses crédito de carbono dos bitcoins do fundo.
A Hashdex anunciou o seu segundo ETF de Bitcoin quase um mês depois da QR Capital lançar um produto semelhante. Ambas também lançaram fundos de índice de Ethereum. Onde está a Hashdex está nessa disputa?
A Hashdex posiciona-se como uma gestora de cripto que busca oferecer acesso dentro de três frentes: simples; seguro; e regulado. Nada mais natural, portanto, do que começar com HASH11, que é um investimento beta, comprando o mercado. É onde acredito no longo prazo. Blockchain é uma tecnologia iminente e é muito difícil escolher, diante desse cenário de mundo, quem é o vencedor.
Ao mesmo tempo, não somos quem tem de dizer ao investidor quanto de cripto terá na carteira. A ideia do ETFs de Bitcoin e de Ethereum é a possibilidade de comprá-los na Bolsa, com o respaldo do ecossistema: com segurança, conforto e tranquilidade.
A Hashdex se enxerga em uma corrida para oferecer os melhores produtos?
Não olhamos para QR Capital, especificamente. A Hashdex é nascida no Brasil, porém a mentalidade é de ser uma gestora global. Queremos oferecer os melhores produtos de investimento em cripto em âmbito global. Não olhamos para QR como um competidor específico. Pode ser que existam overlaps, mas não acho que as empresas têm necessariamente a mesma estratégia.
Como pretendem se diferenciar no mercado de ETFs?
Trazemos um nível de excelência para formação de produtos, de parceiros. Não foi fácil trazer Nasdaq para cripto. Não foi fácil trazer uma big four para auditar cripto. Não foi fácil ter BTG (BPAC11) como administrador. Muito mais que preço, trazemos a capacidade de grandes service providers para garantir a qualidade.
Saímos de como montar o melhor produto. Depois, o que gostaríamos de ter em relação a conforto, segurança, pois nosso dinheiro está lá. O meu está. O do Marcelo está. Em seguida, partimos para o custo e como faz isso acontecer.
Há novos produtos para sair do forno?
Temos. Não posso abrir ainda, mas 2021 deve um ano de muitas novidades para a Hashdex.