Greve na CVM? Entenda imbróglio com ‘xerife do mercado financeiro’

Neste fim de fevereiro, a autarquia responsável por fiscalizar o mercado financeiro e operações análogas – a Comissão dos Valores Mobiliários (CVM) – passa por uma operação padrão, com uma paralisação que não é completa, deixando ainda algumas atividades ainda em funcionamento.

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O órgão, que é considerado o ‘xerife do mercado’, reivindica melhores condições de remuneração – pedindo, por exemplo, bônus de produtividade para os servidores da CVM, em linha com a Receita Federal. Além disso, os servidores pedem um aumento no quadro de funcionários.

As medidas pleiteadas gerariam um impacto na casa das dezenas de milhões, contudo ficam muito abaixo do superávit gerado pela autarquia – que arrecada cerca de R$ 1 bilhão ao ano.

O sindicato da CVM destaca que há negociação entre as partes, mas caso os servidores não sejam ouvidos a operação deve avançar para estado de greve.

“O MGI [Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos] não tem nos dado devolutivas, mesmo diante de reiterados pleitos. A nossa mesa específica foi instalada e tivemos apenas uma rodada, enquanto o Banco Central, que também compõe o Núcleo Financeiro, teve três encontros e, embora não tenha fechado acordo, já recebeu uma proposta”, disse o presidente do sindicato, Oswaldo Molarino Filho.

Em meio ao que considera o “sucateamento da CVM“, o advogado e ex-diretor da autarquia, Henrique Machado, destaca que a valorização dos servidores e, portanto, da própria CVM é fundamental para garantir o desenvolvimento do mercado de capitais brasileiro.

“Não se trata apenas de aumentar salários mas, principalmente, de dar condições de trabalho mediante o ingresso de novos servidores e a concessão de orçamento proporcional ao mercado que regula e às taxas que já cobra ordinariamente no exercício de suas atividades. Há uma sensível defasagem em treinamento e informatização da autarquia, frente à sofisticação das operações típicas do mercado de capitais”.

O advogado Marcos Manoel, sócio do escritório Nelson Wilians Advogados, que é especialista em mercado de capitais e Direito Societário, aponta que o mercado de capitais é importante para o desenvolvimento socioeconômico do país e, portanto, deve ser fomentado

“⁠Também é importante meio de financiamento das empresas e estimula o investimento e a poupança de recursos econômicos pelas pessoas. ⁠A CVM tem papel fundamental na regulação e fiscalização dos atores do mercado, o que é essencial diante da assimetria de informações entre os investidores e as empresas investidas”, afirma.

O especialista ainda destaca que é “imperativo que o órgão tenha boa estrutura, orçamento e quadros qualificados”.

Segundo o advogado, atualmente a CVM tem seu papel de fiscalizadora do mercado afetado, impedindo uma ostensividade contra práticas como o uso de informações privilegiadas para obter lucro e a manipulação de mercado.

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Victor Meira, advogado da área do Direito Público da Innocenti Advogados, comenta que a valorização dos servidores da CVM é “fundamental para alcançar dois objetivos essenciais à Administração Federal”.

“O primeiro é o compromisso de promover a dignificação, valorização e aperfeiçoamento da função pública e dos servidores públicos, princípios previstos no Decreto-lei nº 200 de 1967. O não atendimento a estes princípios é evidenciado pela falta de valorização da carreira nos últimos anos, além da notável defasagem de pessoal, demonstrada pela ausência de concursos públicos por mais de 14 anos, uma situação já reconhecida pelo próprio colegiado da autarquia, destaca.

“O segundo objetivo estratégico é a ambição do governo em fortalecer o mercado de capitais. Tal meta requer significativos investimentos nas estruturas dos órgãos reguladores, possibilitando que estes atendam eficazmente às crescentes demandas e ampliem sua atuação no setor”, completa.

Quais as reivindicações?

Em publicação em suas redes sociais, o atual presidente da CVM, João Pedro Nascimento, defendeu a operação padrão e as reivindicações.

“Tendo em vista o sucateamento sofrido pela CVM nos últimos dez anos, nossos servidores entenderam pertinente listar pleitos complementares às medidas anunciadas pelo Governo Federal e que promoverão o fortalecimento da autarquia”, disse.

Na lista, o presidente da autarquia destacou

  • Aumento da Estrutura organizacional em 84 cargos, que custaria R$ 5,7 milhões ao ano
  • Equiparação da remuneração de agente executivo à tabela do técnico do Banco Central, com impacto de R$ 3 milhões
  • Retribuição por produtividade (bônus), que pode impactar o orçamento em até R$ 36 milhões anuais

“Os impactos financeiros das medidas propostas são pouco expressivos diante do superávit anual proporcionado pela autarquia aos cofres públicos e, claro, de vido à importância do trabalho da CVM para o constante desenvolvimento do Brasil”, diz o presidente.

CVM recebe somente um terço do que arrecada

Conforme os dados da autarquia, o valor total das arrecadações proporcionadas pelas taxas de fiscalização da CVM ultrapassa, anualmente, a marca de R$ 1 bilhão, ao passo que o orçamento da CVM não chega a R$ 330 milhões ao ano – considerando o dispêndio de recursos junto aos servidores ativos e aposentados.

Em nota oficial, os servidores do colegiado da CVM se manifestaram favoráveis à operação padrão.

“O Colegiado da CVM, por unanimidade, apoia as demandas dos nossos servidores, que, inclusive, a despeito do contexto delicado, vêm se mostrando comprometidos com a manutenção de serviços tidos como essenciais pela Autarquia”, diz, em nota.

“O Colegiado da CVM também entende que as demandas pleiteadas pelos servidores podem ser resolvidas de maneira faseada, e observando-se uma temporalidade adequada junto ao Governo Federal”, completa.

Segundo o colegiado, as demandas:

  • ou não causarão qualquer impacto financeiro aos cofres públicos
  • ou que poderão gerar impacto financeiro, mas que deveriam poder ser atendidas não apenas pelos baixos valores envolvidos, mas também diante do superávit gerado pela CVM ao Estado Brasileiro

“Ao mesmo tempo, a Autarquia tem ciência das limitações do arcabouço fiscal e de demais medidas que fazem com que o Governo Federal seja obrigado a observar e analisar as demandas da Administração Pública de maneira sistêmica”, conclui o colegiado da CVM.

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Eduardo Vargas

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