Os países-membros do G7 e seus convidados para a cúpula de Hiroshima fecharam um comunicado conjunto neste sábado, 20, sem críticas à Rússia pela guerra e com foco na segurança alimentar. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) é signatário do documento. Na prática, o texto – resultante da reunião entre os chefes de governo presentes no evento – alivia o impasse no qual estava mergulhado o presidente, que resistia a assinar qualquer comunicado potencialmente hostil a Moscou.
No comunicado exclusivo dos países-membros do G7, porém, o tom elevado contra a Rússia foi uma marca que será reforçada ao final da cúpula. Enquanto o Grupo dos Sete é coeso no apoio à Ucrânia, Lula e outros líderes de países em desenvolvimento preferem adotar postura que chamam de neutralidade.
No texto conjunto de hoje, os signatários se comprometem a trabalhar juntos para responder ao agravamento da crise de segurança alimentar global, ampliada pela guerra entre Rússia e Ucrânia. O peso do conflito é reconhecido.
“A guerra na Ucrânia agravou ainda mais a atual crise de segurança alimentar em todo o mundo, especialmente nos países em desenvolvimento e menos desenvolvidos. Observamos com profunda preocupação o impacto adverso da guerra na Ucrânia e enfatizamos que ela está causando imenso sofrimento humano e exacerbando as fragilidades existentes na economia global”, diz o comunicado.
Na semana passada, o embaixador Maurício Lyrio, secretário de Assuntos Econômicos e Financeiros, afirmou que o Brasil negociaria este texto de forma a manter o tom neutro adotado pelo País quando o assunto é a guerra. “Como é uma declaração sobre segurança alimentar e há efeitos do conflito na Ucrânia sobre acesso a alimentos e nós sabemos disso, uma referência inicial deverá ser feita ao conflito na Ucrânia. E, naturalmente, o governo brasileiro negocia essa linguagem para que seja compatível com a linguagem que o Brasil tem usado sobre o tema”, declarou o diplomata.
Ao longo da declaração, o G7 e seus convidados se comprometem, inclusive, a apoiar as exportações de grãos da Ucrânia e da própria Rússia como forma de evitar um desabastecimento na cadeia global de suprimentos. Os grãos russos não foram alvo de sanções por seu papel relevante na alimentação da humanidade.
“Estaremos trabalhando em conjunto para responder à atual crise de segurança alimentar, inclusive por apoio à exportação de grãos da Ucrânia e da Rússia, com a expansão e extensão do BSGI (Iniciativa de Grãos do Mar Negro)”, dizem os signatários, o que inclui Lula.
O BSGI é um acordo da comunidade global que permite a exportação de grãos pelo Mar Negro como forma de garantir o abastecimento mundial apesar da guerra. A Rússia renovou por mais 60 dias seu compromisso com o tratado nesta semana.
“Apelamos a todos os participantes da BSGI a continuar a implementar plenamente sua operacionalização, em seu potencial máximo e pelo tempo que for necessário, e enfatizamos a importância de permitir que os grãos continuem a chegar aos que mais necessitam”, diz o texto conjunto
G7: Lula cobra responsabilidade de países ricos na questão climática
Em seu discurso na segunda sessão da cúpula do G7, neste sábado (20), em Hiroshima, no Japão, o presidente da República, Luiz Inácio da Lula da Silva, cobrou responsabilidade dos países ricos para enfrentar os desafios das mudanças climáticas. Segundo ele, é preciso, por exemplo, que essas nações cumpram promessa de alocarem US$ 100 bilhões, por ano, em ações climáticas.
“Não há dúvidas que precisamos ampliar nossos esforços de mitigação, em especial os países que historicamente mais emitiram gases de efeito estufa, mas não podemos perder de vista a demanda crescente por adaptação e perdas e danos. E é por isso que insistimos tanto que os países ricos cumpram a promessa de alocarem US$ 100 bilhões à ação climática. Outros esforços serão bem-vindos, mas não substituem o que foi acordado na COP de Copenhague”, disse Lula.
O presidente brasileiro destacou que é necessário que o mundo pense, junto, sobre uma transição ecológica e justa, com industrialização verde, geração de empregos dignos e combate à pobreza, à fome e à desigualdade.
“De nada adianta os países e regiões ricos avançarem na implementação de planos sofisticados de transição se o resto do mundo ficar para trás ou, pior ainda, for prejudicado pelo processo. Os países em desenvolvimento continuarão precisando de financiamento, tecnologia e apoio técnico para transformarem suas economias, combater a mudança do clima, preservar a biodiversidade e lutar contra a desertificação”.
Ele cobrou ainda a valorização das convenções internacionais sobre meio ambiente que discutem e resultam em acordos através de “amplo diálogo com a sociedade civil”.
“Estamos próximos de um ponto irreversível”, afirmou. “Não estamos atuando com a rapidez necessária para conter o aumento da temperatura global, como pactuamos no Acordo de Paris. Mas essa é uma crise que não afeta a todos da mesma forma, nem no mesmo grau, nem no mesmo ritmo. Mais de 3 bilhões de pessoas já são diretamente atingidas pela mudança do clima, em especial em países de renda média e baixa. E, da forma que caminhamos, esse número seguirá aumentando”.
Matriz energética brasileira
Lula aproveitou o discurso para mencionar o que, segundo ele, é uma das mais matrizes mais limpas do mundo, com potencial para produzir energia solar, eólica, biomassa, etanol, biodiesel e hidrogênio verde.
“Temos consciência de que a Amazônia protegida é parte da solução. É por isso que estamos organizando em agosto deste ano, em Belém, uma cúpula de países amazônicos. E é por isso que o Brasil teve sua candidatura à sede da COP30 do clima aprovada após decisão unânime do Grupo Latino-Americano e Caribenho. Seguiremos abertos à cooperação internacional para a preservação dos nossos biomas, seja em forma de investimento ou colaboração em pesquisa científica”.
O presidente agradeceu aportes anunciados recentemente ao Fundo Amazônia e afirmou que os indígenas serão os protagonistas da preservação do bioma. “O Brasil será implacável em seu combate aos crimes ambientais. Queremos liderar o processo que permitirá salvar o planeta. Vamos cumprir nossos compromissos de zerar o desmatamento até 2030 e alcançar as metas voluntariamente assumidas no Acordo de Paris.”
A preservação da Amazônia foi um dos assuntos tratados em reunião com o presidente francês Emmanuel Macron, também neste sábado. O bioma é compartilhado pelos dois países, já que a Guiana Francesa, que tem uma fronteira de 730 quilômetros com o estado do Amapá, integra o território da França.
Em suas redes sociais, Lula disse que também conversou com Macron sobre soluções para a paz na Ucrânia, que teve seu território invadido pela Rússia no início de 2022.
“Reencontro com o presidente da França, Emmanuel Macron, no G7. Falamos sobre a preservação da Amazônia e caminhos para a construção da paz na Ucrânia. Estamos retomando a amizade e a parceria entre nossos países, podemos fazer muitas coisas juntos”, escreveu Lula na postagem que inclui uma foto dos dois chefes de governo se cumprimentando.
Neste sábado, Macron também se reuniu no G7 com o presidente da Ucrânia, Volodimir Zelensky. “Um avião com as cores da República Francesa chegou em Hiroshima. A delegação ucraniana estava a bordo. Eles chegaram ao G7 para trabalhar conosco e com nossos parceiros. Pela vitória da Ucrânia. Pela volta da paz à Europa”, escreveu Macron em seu perfil no Twitter neste sábado, junto com um vídeo em que os dois líderes europeus aparecem conversando.
Lula também se reuniu neste sábado com o primeiro-ministro alemão, Olaf Scholz, e com a diretora-geral do Fundo Monetário Internacional (FMI), Kristalina Georgieva.
G7 promete esforços para atingir cobertura universal de saúde no mundo
Os líderes do G7 divulgaram neste sábado (20) um comunicado conjunto com mais de 60 pontos, depois de reunião de cúpula ocorrida em Hiroshima, no Japão. O grupo é composto por oito das principais economias do mundo, sendo sete países (Estados Unidos, Japão, Alemanha, França, Reino Unido, Canadá e Itália) e a União Europeia.
O Brasil participa do encontro como um dos oito países convidados. No comunicado conjunto, as lideranças do G7 se comprometem a trabalhar conjuntamente para investir na produção de vacinas em todo o mundo, no Fundo da Pandemia e em um futuro acordo para a prevenção, preparação e resposta a pandemias. Também destaca esforços para se atingir uma cobertura universal de saúde até 2030.
“Renovamos os compromissos de trabalhar, junto com nossos parceiros globais a fim de assistir aos países para que alcancem a UHC [cobertura universal de saúde, na sigla em inglês] através do apoio à assistência básica de saúde e ao desenvolvimento e restauração dos serviços de saúde essenciais”, diz o comunicado.
Outro ponto de destaque do comunicado é o compromisso de preservar o planeta com a aceleração da descarbonização dos seus setores energéticos e a implantação de energias renováveis. Também se comprometem a acabar com a poluição dos plásticos e proteger os oceanos.
“Nosso planeta está enfrentando desafios sem precedentes provenientes da tripla crise global das mudanças climáticas, perda da biodiversidade e poluição, além das crises energéticas em curso. Estamos firmes no nosso compromisso com o Compromisso de Paris, mantendo o limite de aumento da temperatura global em 1,5°C dentro do alcance através de ação ampliada nessa década crítica”, diz o documento.
Outros pontos do documento foram os compromissos de trabalhar juntos para combater o tráfico de pessoas, manter a estabilidade financeira global, promover o desenvolvimento sustentável, acelerar o atingimento dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) e reconhecer que a redução da pobreza anda de mãos dadas com o enfrentamento à crise climática.
Os líderes do G7 afirmaram que estão tomando medidas concretas para apoiar a Ucrânia contra o que eles chamam de “guerra de agressão ilegal da Rússia” pelo tempo que for necessário, reforçar o desarmamento e não proliferação nuclear, conduzir a transição para economias de energia limpa e lançar uma ação para o combate à fome.
Em outro trecho do documento, o G7 informou estar pronto para manter relações estáveis e construtivas com a China, mas demonstrou preocupação com a situação geopolítica dos mares do sul e leste do país.
“Nós nos opomos firmemente a quaisquer tentativas de mudar o status quo por força ou coerção”, diz o documento. “Não há base legal para as reivindicações marítimas expansionistas da China no Mar do Sul da China e nos opomos às atividades militares da China na região”.
Também houve espaço para condenar a Coreia do Norte por seus lançamentos de mísseis balísticos. Segundo o G7, eles violam múltiplas resoluções do Conselho de Segurança da ONU.
“Nós exigimos que a Coreia do Norte se abstenha de quaisquer outras ações desestabilizadoras e ascendentes, incluindo quaisquer novos testes nucleares ou lançamentos que usem tecnologia de míssil balístico, que minam a estabilidade regional e representam uma ameaça à paz e segurança internacionais”, diz a note do G7.
Com Estadão Conteúdo e Agência Brasil
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