Grande parte dos fundos de multimercados vem obtendo resultados abaixo do esperado em 2023, principalmente quando comparado aos rendimentos do ano anterior.
No geral, segundo a Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiros e de Capitais), os fundos de investimentos tiveram mais saídas do que aportes de janeiro a setembro, totalizando R$ 84,6 bilhões de resgates líquidos.
Os dados mostram que o resultado foi puxado pelas classes de multimercados, ações e renda fixa. Os fundos de multimercados tiveram uma retirada líquida de R$ 57 bilhões, sendo responsável pela maioria dos resgates.
Para Marco Prado, CIO da BullSide Capital, um dos fatores que influenciaram as retiradas foi um cenário macroeconômico mais imprevisível. “O investidor migrou para produtos mais seguros. No caso, a renda fixa, pois a renda variável ficou completamente exposta.”
A dificuldade dos gestores de captar tendências econômicas também foi apontada por analistas como um dos pontos de dificuldades dos fundos. Segundo João Arthur, CIO da Suno Wealth, a classe de multimercado para operar bem precisa ter um cenário de volatilidade, a fim de tomar risco.
“Tivemos o mercado piorando de janeiro a março, dando uma oportunidade do mercado de bolsa, câmbio e juros operar de maneira pessimista, mas não operou. Novamente, nos últimos dois e três meses, o mercado piorou, mas a cota dos fundos de multimercado não reagiu”, explica Arthur.
Grande parte dos gestores de fundos que tiveram boa rentabilidade adotoram um posicionamento mais pessimista do que a maioria do mercado, apostando em um recuo mais moderado do juros e menor crescimento da bolsa brasileira.
Neste contexto, Arthur também cita oportunidades no mercado exterior, como a alta do tesouro americano (treasuries) e a própria subida da bolsa norte-americana, que não foram captadas pelos fundos de multimercado.
O IFHA (Índice de Hedge Funds Anbima), indicador de referência para multimercados, avançou 5% no acumulado do ano, menos que o CDI, que teve rentabilidade de 10%.
Fundos multimercados: o que influenciou a rentabilidade?
De acordo com Arthur, boa parte da perda no multimercado ocorreu por causa de juros, ou por erros na perspectiva sobre a queda na Selic. O analista aponta ainda que agora os fundos estão bem pessimistas sobre a queda do juros. “Se o juros caírem mais que o esperado, é possível ver as cotas do multimercado ‘sofrerem’ um pouco mais”, destaca.
Arthur avalia que o juros ainda estão ‘estressados’, mas podem haver posições apostando em sua queda, além de uma bolsa bem descontada, o que traz oportunidades.
Já Prado diz que o corte de juros já está precificado pelo mercado, citando que 9% a 10% na Selic ainda é um patamar alto e um atrativo para o investidor mais conservador ficar na renda fixa. “O mercado está mais cauteloso. A Bolsa pode ter um rali no final de ano, pois tem uns papéis descontados, principalmente no setor de varejo.”
Caso o corte da Selic chegue perto de 7%, Arthur projeta um fluxo mais forte de investimentos para bolsa de valores. “A maior parte dos gestores está precificando a Selic terminal em 11%. Acredito que esse fluxo está sendo subestimado”, explica.
Além disso, Prado lembra que neste momento a preocupação estará no cenário externo, com ênfase nos Estados Unidos. A dúvida é se a política de juros norte-americana deve arrefecer e parar de subir. “Se o Federal Reserve (Fed) sinalizar que vai começar a cortar os juros ano que vem, o BC pode até tentar reduzir a Selic de forma acentuada.”
Fundos multimercados que ‘nadaram contra a maré’
Mesmo com a classe registrando perdas neste ano, alguns fundos de multimercado conseguiram ter uma rentabilidade de dois dígitos. Conforme mostra uma pesquisa elaborada pelo Valor Investe, com base na plataforma Morningstar, casas como Canvas Capital e Matera RC Gestão de Recursos alcançaram rentabilidade de até 17% de janeiro a setembro
Criada em 2012 e com R$ 2,3 bilhões sob gestão, a Canvas Capital é a dona do fundo multimercado mais rentável do ano, o Canvas Vector.
Além do Canvas, a Sterna Capital ganhou boa rentabilidade, projetando cenários mais pessimistas. No passado recente, o mercado ficou muito otimista com o Brasil após a aprovação do arcabouço fiscal, mas os ativos estavam caros”, afirmou Bruno Magalhães, diretor de investimentos da Sterna, ao Valor.
Veja os fundos multimercados com melhores desempenhos no ano:
Fundos Multimercado | Retorno de janeiro a setembro (em %) | Patrimônio Líquido |
Canvas Vector FIC FIM | 17,67 | 130 milhões |
RC Hedge FIM | 17,45 | 50 milhões |
Mapfre Inversion FIM | 15,79 | 82 milhões |
Sparta Cíclico FIC FIM | 14,57 | 52 milhões |
Sterna Total Return FIC FIM | 14,23 | 57 milhões |
Vinci Total Return FIC FIM | 13,94 | 221 milhões |
Quantamental Cartor Mach5 FIM | 13,22 | 82 milhões |
Galápagos Evolution FIC FIM C Priv | 13,07 | 118 milhões |
Kínitro 30 FIC FIM | 12,80 | 342 milhões |
Pandhora Essencial FIC FIM | 11,50 | 74 milhões |
O impacto da China e dos Estados Unidos
Segundo Prado, a China, que foi uma decepção no primeiro semestre de 2023, com uma crise imobiliária não resolvida, melhorou um pouco devido às ações do Banco Chinês. “Nesta semana tivemos dados de deflação na China e o FMI anunciando que o país volta a crescer acima de 5%”.
Em relação aos Estados Unidos, Arthur cita que a treasuries influenciaram todos os ativos do restante do globo, determinado principalmente qual vai ser a faixa de queda da Selic.
Como escolher um fundo multimercado?
O primeiro passo para escolher um fundo multimercado é analisar seu perfil de investidor, além dos objetivos para aquele investimento. Em seguida, é preciso ficar atento às taxas que podem ser cobradas e conferir se são compatíveis com a estratégia.
Uma outra recomendação importante para investir em fundos multimercados é buscar o máximo de informações sobre eles, como desempenho ao longo dos anos e se obteve resultados satisfatórios.
Analisar a volatilidade e a liquidez dos fundos multimercados, assim como buscar o máximo de informações sobre ele, também é fundamental antes de começar a investir.