A elevação da taxa básica de juros (Selic) fez os investimentos em fundos de crédito privado, que aplicam em títulos de renda fixa de empresas privadas, brilharem novamente aos olhos dos investidores. A retomada ocorre depois de um ano difícil para esta indústria, que registrou em 2020 resgates na casa dos R$ 94,7 bilhões. Após meses consecutivos de saques, os fundos de crédito privado voltaram a apresentar captação líquida positiva de recursos, e há sinais de que a tendência positiva deve continuar.
O saldo começou a ficar positivo em fevereiro, quando as entradas superaram os resgates em R$ 120 milhões. Em março, eles acumularam um fluxo positivo de R$ 580 milhões. “Após um período bastante negativo para a classe de fundos de crédito privado entre o segundo semestre de 2019 e o fim de 2020, observamos um novo período de forte captação líquida para a classe”, informou o relatório da XP Investimentos.
Os especialistas apontam que a retomada dos investimentos em fundos de crédito privado se deve à alta na Selic que os tornam mais atrativos conforme os juros sobem. É válido lembrar que esses fundos investem em títulos de renda fixa como debêntures, Certificado de Recebíveis do Agronegócio (CRA), Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI) entre outros ativos e, são mais rentáveis que os títulos públicos, embora tenham mais riscos.
3 motivos para a debandada de 2020
A saída de capital dos fundos de crédito privado no passado recente é explicada por três motivos: temor de alguns investidores conservadores em razão da pandemia, queda na taxa Selic e o surgimento de novas oportunidades, como apontaram os especialistas.
O primeiro motivo foi a situação pandêmica, que de modo geral afetou todas as empresas. Com isso, muitos investidores temiam que as companhias poderiam não arcar com suas obrigações, o que levou a um movimento de venda de cotas de fundos de crédito.
“Nos meses de março e abril de 2020, início da pandemia, muita gente saiu devido à percepção de risco que as pessoas tinham em relação aos ativos de crédito. No primeiro momento da pandemia até houve medo de que as empresas pudessem falir. Mas depois, a partir de junho e julho, as pessoas observaram que tiveram alguns setores que se adaptaram muito bem, como o de varejo”, analisou o CEO da Valora Investimentos, Daniel Pegorini.
O segundo motivo foi a queda na taxa básica de juros no ano passado, que tirou a atratividade dos ativos de renda fixa.“O Banco Central promoveu uma queda muito forte na Selic. Quando o CDI caiu, o investidor viu que a aquela rentabilidade não estava mais tão interessante como estava em outros anos, quando, por exemplo, a Selic era dois dígitos”, disse o gestor da Integral Investimentos, Marcos Lorio.
O terceiro motivo foi a bolsa brasileira, que simultaneamente, ficou mais barata e esse movimento fez com que os investidores realocassem seus ativos procurando maior retorno.
“Houve disfuncionalidade em todos os mercados e ainda houve novos cortes na taxa de juros. Então observamos uma migração dos investidores aproveitando ativos com maior potencial de retorno, vimos essa migração, principalmente, para o mercado acionário”, analisou o CEO da Butiá Investimentos, Rodrigo Dias.
Após alta, investidor retoma olhar para investimentos atrelados a Selic
Apesar da saída ser explicada por três motivos, a retomada é explicada por apenas um: elevação da taxa básica de juros após quase sete meses em mínima histórica.
No dia 17 de março, os diretores do Banco Central voltaram a elevar a Selic, com um aumento de 0,75 ponto percentual, de 2% para 2,75%. No dia 5 de maio, a taxa subiu novamente 0,75 ponto percentual para 3,50%. O evento provocou uma maior atratividade dos investimentos atrelados à Selic.
Juntando a elevação da taxa e a percepção do investidor de que as empresas estão retomando suas atividades, os fundos de crédito privado seguem “muito atrativos” para o investidor. Além disso, com a retomada da procura por investimentos de fundos de crédito privado, as companhias irão emitir ainda mais dívidas, segundo Lorio.
Um exemplo disso é que as debêntures, principal ativo de crédito privado, representaram 61% das emissões no mercado de capitais em abril, segundo a Anbima. Isso representa R$ 24,3 bilhões, dentro de um universo de R$ 39,6 bilhões de operações realizadas no período. De janeiro a abril, as debêntures acumulam volume de R$ 55,3 bilhões, contra R$ 32,4 bilhões no mesmo intervalo do ano passado.
“Agora o investidor que deseja um ativo ao CDI irá ter uma rentabilidade maior. Ou seja, a alta na Selic eleva a rentabilidade para o investidor e a retomada da economia faz com que mais empresas acessem ao mercado de capitais. Veremos daqui pra frente mais emissões de debêntures e letras financeiras, já estamos vendo esse movimento bem forte. Então isso é ainda mais positivo para os fundos que vão ter mais opções de ativos”.
Ao mesmo tempo, a captação de recursos por meio da emissão de ações ficou mais tímida. O mês de abril foi o primeiro de 2021 sem a conclusão de ofertas iniciais de ações (IPOs).
Programa do governo de debêntures torna fundos de crédito privado ainda mais atrativos
Além da Selic, a perspectiva para investir em fundos de crédito privado seguem ainda mais atrativos com o programa do governo de emissão de debêntures incentivadas.
Em setembro de 2020, o Ministério de Comunicações alterou as regras, atraindo mais interessados. As empresas têm como incentivo descontar o imposto de renda dos investimentos realizados em redes com os recursos captados.
Por sua vez, para a pessoa física é uma oportunidade em investir em renda fixa emitidos com finalidade de captar recursos para projetos específicos e de interesse para o desenvolvimento do país.
Confira algumas empresas que emitiram as debêntures incentivadas:
- TIM (TIMS3)
- Algar Telecomunicação
- Brisanet
“A alta na Selic tende a aumentar a atratividade nos fundos de crédito privado e ainda tem o projeto anunciado pelo governo bastante robusta, o que atrai ainda mais a atenção do investidor”, concluiu Dias.