Existem muitos fundos imobiliários hoje no Brasil e a grande maioria atua nos mesmos setores: shoppings, galpões de logística e hospitais. Uma das exceções é o HCTR11, fundo imobiliário (FII) com foco em certificados de recebíveis imobiliários (CRIs) “alternativos” e que foi uma das principais altas do IFIX, principal índice de FIIs da bolsa brasileira em 2020.
“A Hectare surgiu em 2018 como gestora de um fundo imobiliário. Os sócios já vinham trabalhando no setor, mas nenhum deles tinha um nome grande no mercado. Nós precisávamos oferecer algo diferente”, explica André Catrocchio, sócio e diretor de relação com investidores da Hectare, gestora responsável pelo HCTR11.
O diretor do HCTR11 não está errado. Dos 15 principais fundos imobiliários que compõem o IFIX, boa parte atua nos três setores mencionados por ele, além de nos fundos de lajes corporativas.
Grandes fundos imobiliários, como XPML11 e HGBS11, são dos setores de shoppings. Outros grandes nomes – BBPO11, BRCR11, HGRU11, JSRE11, KNRI11 – são de lajes corporativas ou híbridos. XPLG11 e HGLG11 são de logística. Os demais com peso maior do que 2% no IFIX são fundos de papéis ou fundos de fundos, que acabam também por estarem muito expostos a esses mesmos ativos.
“Queríamos um diferencial. Miramos ser uma gestora independente de ativos alternativos” esclarece o diretor e sócio do HCTR11 Atualmente, o fundo imobiliário tem negócios um pouco “exóticos” em seu portfólio – como, por exemplo, uma série de papéis de dívidas de resorts que estão sendo construídos pelo país.
Entre eles estão o Buona Vitta Resort Spa, em Gramado (RS), o Beach Resort, em Búzios (RJ), e o Resort do Lago Park, em Caldas Novas (GO).
“Começamos a investir nesses ativos a partir de 2019, após a Lei de Multipropriedade, que foi criada no Governo Temer”, explica Catrocchio. “2020, apesar de todas as dificuldades, foi um ano excepcional para nós. Conseguimos colocar nosso fundo imobiliário em um novo patamar”, fala.
Chamada de time sharing nos Estados Unidos, a lei de Multipropriedade trouxe um conceito novo para o Brasil: quem adquire participação nos resorts, aos quais o FII emprestou recursos através de CRIs, tem direito a usar a estrutura hoteleira por um determinado tempo.
“Hotéis quatro ou cinco estrelas não são comumente acessíveis às classes C e D. Essas pessoas não conseguem passar férias em lugares como esse. Mas com esses novos empreendimentos, elas podem alcançar”, afirma o sócio.
O texto, sancionado em 2018, estabelece que o período em que cada “dono” de um ativo pode ficar nele deve ser proporcional à participação dele no prédio, em intervalos mínimos de sete dias. A estadia pode ser de maneira fixa, em datas iguais todos os anos, ou flutuante, de forma, porém, necessária a se respeitar a relação dos vários proprietários.
Hoje, o HCTR11 possui 31 CRIs de multipropriedades em seu portfólio, ou 33,1% de sua carteira – a maior parte dela.
Em segundo lugar, o fundo de André Catrocchio investe em algo mais comum – edifícios corporativos. Em terceiro lugar na participação da carteira, estão os loteamentos, em quarto, os shoppings e em quinto as incorporações. Mesmo nos ativos mais comuns, porém, o HCTR11 busca diferenciais.
Em setor residencial, HCTR11 opta por regiões distantes dos grandes centros
“Em 2018, quando fundamos o fundo imobiliário, optamos também por investir em mercados pouco explorados. Como provedores de crédito, olhamos para o potencial de regiões fora do eixo Rio–São Paulo, principalmente no lado residencial”, aclara Catrocchio.
Entre os CRIs em que o HCTR11 investe estão, por exemplo, o Quatto Atlantis, loteamento em Sorriso, no Mato Grosso do Sul, ou lotes em Terra Nova, no Amapá.
“Os bancos privados não chegam em boa parte dos interiores de vários estados. Este mercado era muito dependente dos bancos públicos, que de 2018 pra cá viram seu potencial de empréstimo diminuir. Isso abriu uma oportunidade gigantesca”, explica.
Nos loteamentos, assim como nos resorts, os gestores do fundo imobiliário veem também como positiva a questão da pulverização. “Emprestamos dinheiro para operações que possuem muitos CPFs envolvidos, o que diminui o risco de crédito”, contextualiza André.
O fundo imobiliário também empresta para incorporadoras que desenvolvem projetos em locais mais distantes das grandes metrópoles, como, por exemplo, o CRI RR, relativo a um condomínio localizado em Teresina, no Piauí.
“Fazemos comumente parceria com pequenas incorporadoras, que muitas vezes não têm balanços bem estruturados. Nesses casos, e em todos os outros, como temos esse perfil mais alternativo, optamos por acompanhar de perto os empreendimentos em que aportamos. Temos sempre em mente que acompanharemos o desenvolvimento do ativo do início ao fim, em um prazo médio que vai de três a cinco anos”, explica André.
Risco aumenta com avanço da inflação
Com a alta da inflação, muitos fundos imobiliários que investem em CRIs se viram em meio a uma situação delicada. “A inflação alta é um perigo iminente no cotidiano do brasileiro. Nós conseguimos distribuir um resultado bom, atrelado ao IGP-M, que está rodando a 25% ao ano. A alta desse índice gerou recursos para nós, que foram distribuídos ao investidor, mas é um problema sistêmico e temos que ter um olhar crítico”, explica.
Em seu último relatório, de março deste ano, o HCTR11 tinha:
- 54,5% do suas alocações indexadas ao IPCA + 10,2%
- 26,5% no IGP-M +11,7%
- 11,9% ao CDI
- 2,5% ao INPC.
Em abril, o IPCA acumula alta de 6,76% em 12 meses. O IGP-M, no mesmo mês, acumulou alta de 31,80% no ano. O avanço dos índices acaba pressionando os devedores.
O HCTR11 já enfrentou uma renegociação em um de seus CRIs, mas, segundo André, o fundo imobiliário, além de ter a gestão acompanhando de perto os empreendimentos, conta também com margens de segurança.
“Trabalhamos com folgas de garantia. A cada R$ 100 mil que emprestamos, esperamos que o devedor ganhe R$ 120 mil. Se a inadimplência aumenta, temos alguma proteção. A alta do IPCA e do IGP-M apertou a margem das incorporadoras, mas a nossa operação ainda está saudável”, diz.
No começo de maio, o fundo imobiliário anunciou um rendimento de R$ 2 por cota relativo ao quarto mês do ano – com um dividend yield mensal de 2%. Nos últimos meses, este indicador do fundo imobiliário está sempre entre um intervalo de 1,70% a 2,1%.
Fundo imobiliário realizou nova emissão e vai às compras
Em março, o fundo imobiliário HCTR11 possuía cerca de R$ 141,5 milhões alocados em caixa – o previsto era que ele terminasse em abril a alocação de 100% dos recursos da oitava emissão, em que movimentou R$ 359,9 milhões, finalizada em março.
No mesmo mês em que pretendia terminar as alocações, a gestão anunciou uma nova emissão, a nona, em que pode levantar mais R$ 420 milhões.
“Ao invés de realizarmos duas emissões por ano de R$ 600 milhões, temos preferido realizar mais com valores menores. A crença da nossa gestão não muda. O perfil do investimento continuará, por enquanto, o mesmo”, explica Catrocchio.
“Em todos os empreendimentos que entramos, estudamos quem será o comprador daquelas unidades. Se há uma indústria em uma região e uma construtora quer subir um condomínio para os funcionários, isso significa que se aquela fábrica fechar, todos os moradores ficam com receita zero. É esse tipo de cuidado que avaliamos caso a caso”, diz.
No caso do turismo, em que o fundo imobiliário também atua, as variáveis mudam, mas a ideia é a mesma. “Buscamos entender se a região é atraente. Se o projeto tem potencial por si só”, diz. “Em último caso, o imóvel é minha garantia”, conclui.
Para o futuro, o HCTR11 tem, além dos mercados alternativos já explorados por aqui, novos tipos de negócio em vista. Residências estudantis e moradias para idosos estão no horizonte do fundo imobiliário, assim como a compra de prédios inteiros voltados ao aluguel residencial.
“O mercado alternativo está engatinhando. Acreditamos que o mercado imobiliário ainda tem muitas vertentes a serem exploradas”, finaliza o diretor do fundo imobiliário.