Fora da meta fiscal, governo deve frear reajustes de servidores públicos, diz economista-chefe da Suno Research
Apesar da aprovação do Arcabouço Fiscal ainda no fim de agosto e dos esforços recentes, o Governo Federal provavelmente terá de lidar com um impasse: a consequência do não cumprimento da meta fiscal – o que inclui o não reajuste de salário de servidores públicos, o congelamento de novas vagas e concursos, dentre outras questões.
Isso porque o não reajuste para servidores públicos e outras medidas fazem parte dos ‘gatilhos’ do Arcabouço Fiscal.
A grande questão é que há consenso de que o governo não deverá cumprir sua meta de superávit primário neste e nos próximos anos, dado o cenário atual.
Gustavo Sung, Economista-Chefe da Suno Research, destaca que seu cenário inclui 1% de déficit primário neste ano, 0,8% em 2024 e 0,2% no ano de 2025, com viés de baixa.
Isso considerando que a meta fiscal do Arcabouço é de 0,5% de déficit neste ano, de zerar o déficit em 2024 e de apresentar superávit de 0,5% em 2025 e de 1% em 2026.
Todas as metas têm uma ‘banda’ – que pode ser interpretada como uma margem – de 0,25%.
“Temos anos de eleição em 2025, com tendência de aumentar gastos, e depende de até onde o governo vai adotar as medidas para contrabalancear receitas e despesas para cumprir a meta”, destaca Sung.
“O funcionalismo público tende a sofrer consequências negativas de um modo geral caso os gatilhos sejam ativados pelo não cumprimento das metas”, completa.
Dentre os gatilhos estipulados caso o governo fure a meta em um ano, estão a proibição de:
- Criar cargo, emprego ou função que implique aumento de despesa
- Alterar estrutura de carreira que ocasione aumento de despesa
- Criar ou aumentar valor de auxílios
- Criar ou reajustar despesas obrigatórias
- Conceder ou ampliar incentivos fiscais
Para dois anos fora da meta, as consequências são a proibição de:
- Aumento e reajuste de despesas com pessoal
- Admissão de pessoal
- Realização de concurso público
- Ajuste por parte do presidente da república
Com isso, o salário de servidores pode ficar ‘congelado’, incorrendo inclusive em um desgaste político maior por parte do Governo Federal.
O consenso de mercado já espera esse descumprimento, e que os gatilhos são praticamente inevitáveis.
A XP, por exemplo, também projeta descumprimento da meta do Arcabouço Fiscal
“Continuamos a estimar déficit primário do setor público de 0,9% do PIB em 2023 e 0,7% do PIB em 2024 e 2025. A dívida pública deve seguir em trajetória de alta nos próximos anos. A sustentabilidade fiscal segue como risco relevante para o cenário econômico brasileiro”, diz a casa.
Meta alterada, credibilidade afetada
Segundo Sung, da Suno Research, um dos caminhos que o Governo pode escolher para evitar essas consequências – e também a perda de capital político – pode ser alteração das metas do Arcabouço.
O ponto é que, com isso feito, haveria uma desancoragem massiva das expectativas e o Governo perderia muita credibilidade junto ao mercado.
“O novo Arcabouço Fiscal mal começou e, se alterarem a meta, perderá muito a credibilidade. Se trocar agora, pioram todas projeções e tudo já começa mal”, comenta Sung.
Segundo o especialista da Suno, com a alteração da meta as projeções da Selic seriam afetadas diretamente, com o mercado provavelmente mirando cortes de 0,25% em vez de 0,5% nas próximas reuniões, ou até mesmo um ‘congelamento’ da taxa básica de juros, freando o ciclo baixista.
A meta fiscal, aliás, foi um dos pontos ressaltados pelo Banco Central (BC), presidido por Roberto Campos Neto, na última Ata do Copom.
“Tendo em conta a importância da execução das metas fiscais já estabelecidas para a ancoragem das expectativas de inflação e, consequentemente, para a condução da política monetária, o Comitê reforça a importância da firme persecução dessas metas”, diz o comitê de política monetária.