No dia em que os Estados Unidos mantiveram o veto à importação de carne bovina brasileira em natura, a União Europeia (UE) informou que poderia tomar medidas contra as carnes brasileiras caso Brasília não forneça “informações suficientemente esclarecedoras”.
Foi essa a mensagem clara que o Comissário da UE para a Segurança Alimentar, Vytenis Andriukaitis, expressou durante a entrevista exclusiva com o SUNO Notícias.
Segundo o político lituano, “a segurança alimentar da UE é uma questão não negociável”. Por isso, as notícias sobre o novo desdobramento da Operação Carne Fraca, que mostrou como a gigante BRF teria pago propinas para auditores fiscais agropecuários federais, geraram “profunda preocupação” em Bruxelas.
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Confira os principais trechos da entrevista exclusiva com o Comissário da UE para a Segurança Alimentar, Vytenis Andriukaitis.
SUNO Notícias: Como foi percebida o novo desdobramento da Operação Carne fraca de outubro envolvendo a BRF?
Andriukaitis: Em Bruxelas nos consideramos que esse desdobramento é uma continuação da Operação Carne Fraca de 2017. A Comissão está em constante e permanente contato com as autoridades brasileiras sobre esse assunto. Mas não escondemos nossa profunda preocupação.
No dia 8 de outubro enviamos uma carta para as autoridades brasileiras pedindo para esclarecer todas as informações do caso. Aguardamos ainda hoje a resposta de Brasília.
Essa não é a primeira carta que enviamos para as autoridades brasileiras exigindo maior rigor na fiscalização e salientando as deficiências do sistema de controle sanitário. Em 2017 e em 2018 enviamos outras com o mesmo teor.
A segurança alimentar é um pilar fundamental e é uma questão não negociável União Europeia. Queremos novas informações sobre o que está ocorrendo no Brasil com as plantas e as empresas que exportam para a UE.
SUNO Notícias: Mas concretamente o que a UE pretende fazer sobre o caso?
Andriukaitis: Por enquanto, atender. Aguardaremos as informações das autoridades brasileiras, que esperamos cheguem em breve, sobre os estabelecimentos envolvidos nesse caso. A partir daquele momento iniciaremos a discutir sobre o que fazer a respeito.
SUNO Notícias: As empresas envolvidas no escândalo da Carne Fraca, como a BRF, ou também outros frigoríficos brasileiros, poderiam sofrer um bloqueio das exportações para a União Europeia?
Andriukaitis: não vou me manifestar sobre empresas individuais. Entretanto, poderíamos chegar a tomar todas as medidas cabíveis caso o problema continue. Isso já aconteceu no passado, como por exemplo no caso do embargo total a importação de carne de cavalo brasileira.
Entretanto, nesse momento não há mudanças sobre as empresas que estão autorizadas a exportar carne para a UE. Todavia, na União vale o princípio de precaução. Se nossos controles perceberão que os padrões de segurança alimentar das carnes exportadas por esses estabelecimentos não são totalmente seguros, poderíamos tomar providências a respeito.
Queremos dados concretos e análises sólidas que as carnes brasileiras são 100% seguras. Essa é uma questão muito sensível. E tem que se basear em controles sólidos. As respostas que recebemos até agora das autoridades brasileiras, também em relação ao passado, não foram satisfatórias. Mas ainda estamos aguardando antes de introduzir qualquer medida.
UE aguarda respostas do Brasil
SUNO Notícias: Que tipo de respostas das autoridades brasileiras a UE espera?
Andriukaitis: Respostas sólidas aos nossos questionamentos. Expressamos fortes dúvidas sobre o que está ocorrendo nos estabelecimentos brasileiros. Precisamos de sólidos controles nos locais.
Depois da Operação Carne Fraca de 2017 enviamos nossos peritos para realizar os controles nas plantas brasileiras. E esses controles mostraram um monte e problemas. Tanto que foi naquela ocasião que chegamos a bloquear totalmente a importação de carne de cavalo brasileira, além de impor uma série de outras limitações a plantas envolvidas no escândalo.
Os problemas continuaram ao longo dos anos. Em 2018, mais de um ano depois da Carne Fraca, novos controles mostraram que ainda tinham irregularidades nas plantas brasileiras. Registramos problemas de substâncias que não podem ser utilizadas no bloco, além de falhas nos receituários de remédios veterinários, entre outras coisas. Tanto que uma delegação de deputados do Parlamento Europeu chegou a visitar o Brasil. A questão ficou tão grave que se tornou política!
Em 2019 enviamos mais uma equipe de peritos e mais uma vez registramos problemas. São necessárias melhorias imediatas. Queremos respostas satisfatórias para nossos quesitos por parte das autoridades brasileiras.
SUNO Notícias: O acordo de livre-comércio alcançado entre a UE e o Mercosul poderia mudar algo?
Andriukaitis: O acordo não muda absolutamente nada. Quem quiser exportar carnes para a UE deverá seguir estritamente nossas regras. Nossos padrões de segurança alimentar não são negociáveis.
Acredito que o acordo seja algo muito positivo para ambos os blocos, pois permite criar padrões sanitários globais e fluxos previsíveis de comércio internacional, entre outras coisas. Mas nenhum produto poderá entrar na UE se não garantirá total segurança alimentar. Entre as missões da Comissão Europeia está aquela de proteger seus cidadãos também dessas potenciais ameaças.
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A UE não levará adiante nenhuma medida protecionista contra os “bons” produtores de carne dos países membros do Mercosul. Entretanto, todos deverão se conformar as regras previstas no acordo, com o mesmo nível de segurança alimentar garantido. Todos devemos respeitar as mesmas regras.
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