No cotidiano, o brasileiro percebe a tradução dos efeitos que estão nos relatórios mais recentes das instituições financeiras. Por 32 semanas seguidas, o Boletim Focus, do Banco Central (BC), eleva as suas projeções para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo, o IPCA, no ano de 2021.
Da mesma forma, nas últimas previsões, as projeções dos principais bancos sobre a situação econômica brasileira têm se deteriorado.
A pesquisa do Banco Central reconhece que a deterioração do cenário macroeconômico deve elevar ainda mais os preços até o fim de 2021 e no início de 2022. Assim como o IPCA, que mensura a inflação, a Selic também deve ser mais alta do que o esperado há alguns meses.
Apesar desse descolamento das expectativas iniciais ocorrer semana a semana, a maior onda de revisões e pessimismo ocorreu na transição entre o mês de outubro e novembro.
Desde que começaram as especulações sobre um possível furo do teto de gastos e a PEC dos Precatórios tomou o noticiário, os analistas passam a enxergar um fim de ano cada vez mais complicado.
Bancos aumentam projeção para a inflação
Após a última reunião do Copom e a alta da Selic, o Safra citou “deterioração no cenário inflacionário“, o que sustenta um cenário de juros mais altos.
Poucos dias antes, na sua revisão, o Itaú Unibanco (ITUB4) já projetou um ano de 2022 mais atribulado e com um cenário econômico mais preocupante.
Em mais uma análise, nesta quinta-feira (18), a instituição financeira vê “inflação persistente”, um “aperto monetário” ainda mais intenso e “sinais claros de desaceleração”.
“Quedas recentes na produção industrial e nas vendas no varejo sugerem que o setor de bens já está em contração” , disse Mario Mesquita, economista-chefe do banco, em relatório.
Para a inflação, o Itaú sugere que o IPCA termina 2021 em 10,1%. Já a projeção para o IPCA em 2022 aumentou de 4,3% para 5,0%.
Ainda no radar, o arcabouço fiscal segue sendo um empecilho para o crescimento econômico.
Com incerteza fiscal, inflação virou ‘surpresa altista’
Assim como os demais pareceres sobre o tema, o documento diz que o aumento da incerteza fiscal provocado pelos eventos recentes -com furo do teto, Auxílio Brasil e Precatórios – forçam uma piora nas previsões.
“Essa situação fiscal transbordou muito rapidamente para o câmbio, que prejudica a inflação. E o BC subiu juros muito mais do que supúnhamos anteriormente. Estamos vivendo a tempestade perfeita no nosso país, Já antecipando as eleições do ano que vem”, afirma o Economista-Chefe e sócio da Órama Investimentos, Alexandre Espirito Santo, em entrevista ao Suno Notícias.
Nas últimas semanas, as divulgações das prévias da inflação foram motivo de surpresa para a maioria dos analistas. O IPCA-15 de outubro teve uma alta de 1,20% no mês, o que foi o maior valor para o período desde o ano de 1995. Com a “surpresa altista no radar”, as expectativas pioraram ainda mais.
“Restando apenas a divulgação das leituras de novembro e dezembro, projetamos IPCA em 10,1% neste ano. A inflação segue pressionada também ao longo do último trimestre de 2021, impactada principalmente pelo preço de combustíveis de veículos, alimentos in natura, alguns serviços, como passagem aérea e aluguel, e maior persistência do choque de bens”, analisa Mesquita, do Itaú.
O preço dos combustíveis tem sido assunto corriqueiro no noticiário, dado que a gasolina superou a cifra de R$ 7 em diversos estados. Deste modo, a previsão é de que a inflação acumulada some um número próximo de 10,8%, formando um novo pico na leitura do mês de novembro.
Analistas veem BC mais duro em 2022
É consenso no mercado de que a taxa Selic deve manter um ciclo de alta até o fim do ano de 2022, representando uma postura chamada de hawkish – que eleva os juros para conter inflação, mesmo que isso ocasione menor crescimento econômico.
Contudo, com os novos eventos, os analistas voltam às planilhas para subir os prognósticos em alguns números.
No caso do Itaú, a projeção para a Selic passou de 11,25% ao ano para 11,75%, enquanto os 9,25% previstos para 2021 se mantiveram.
Por sua vez, o Safra revisou sua projeção citando que a Selic deve ter uma nova alta de 1,5 ponto percentual na próxima reunião do Copom, em dezembro.
Em seguida, deve ocorrer uma elevação de 1 ponto na reunião de fevereiro do próximo ano, levando a Selic para o nível de 10,25% no primeiro trimestre de 2022.
No seu último parecer, o banco também teceu comentários sobre a ata da última reunião do BC.
“Os membros do comitê incluíram um comentário sobre as contas públicas, ressaltando os questionamentos recentes quanto ao arcabouço fiscal e o risco de desancoragem das expectativas de inflação. Assim, aumentaria a probabilidade de, no cenário alternativo, as projeções de inflação ficarem acima das apresentadas no cenário-base.”
PIB do Brasil deve crescer menos
Em um relatório com título “País deve crescer menos de 1% ano que vem”, o Safra cita que os juros mais altos devem afetar atividade econômica no Brasil. Nesse sentido, os analistas da casa praticamente cortaram ao meio a previsão de crescimento econômico.
“Por conta do impacto negativo no crescimento, diante de uma perspectiva de juros mais altos, revisamos ainda a projeção para o PIB para crescimento de apenas 0,6% em 2022 (ante 1,1% anteriormente)”, dizem os analistas da casa.
O Itaú, por sua vez, reitera que a previsão é de 0,5% de queda no PIB em 2022, prevendo uma contração da atividade econômica. Esse parecer é o mesmo do último relatório.
“Em relação à nossa projeção anterior, avaliamos que o aumento adicional da taxa Selic deve compensar os efeitos de eventuais fatores positivos, como uma maior expansão fiscal a nível subnacional. Quedas recentes na produção industrial e nas vendas no varejo sugerem que o setor de bens já está em contração. Revisamos nossa projeção para crescimento do PIB de 5,0% para 4,7% em 2021 e mantemos em
-0,5% para 2022″, diz o banco.
Além disso, em dado recente da Fundação Getúlio Vargas (FGV), a economia brasileira registrou uma retração de 0,1% no terceiro trimestre de 2021, segundo o monitor do PIB da instituição.
“A economia brasileira reverteu a trajetória de recuperação que havia sido observada no terceiro e quarto trimestre de 2020 e no primeiro trimestre deste ano, comparativamente aos trimestres imediatamente anteriores. No segundo e terceiro trimestres deste ano ocorreram duas taxas negativas de -0,1% em comparação aos trimestres imediatamente anteriores. Por sua vez, a taxa acumulada em 12 meses, até setembro foi de apenas 3,7%”, destacou Claudio Considera, coordenador do Monitor do PIB-FGV.
IPCA subiu 1,25% em outubro
Ainda em escalada, o índice de inflação divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o IBGE, subiu 1,25% em outubro, em alta de 0,09 ponto percentual (p.p.) acima da taxa de setembro.
Segundo a instituição, em 2021 o IPCA acumula alta de 8,24% e, nos últimos 12 meses, de 10,67%, acima dos 10,25% observados nos 12 meses imediatamente anteriores. Em outubro de 2020, a variação mensal foi de 0,86%.