Você já passou por alguma situação que fez querer ter aprendido mais cedo sobre como lidar com dinheiro? Já parou para pensar o quanto seria melhor se tivesse recebido conhecimentos sobre educação financeira quando criança? Muita gente com dificuldade para lidar com finanças pensa assim.
Pode-se questionar se faz sentido ou é fundamental aprender tão cedo sobre finanças. Outra dúvida é se existe uma idade ou faixa etária específica para começar a lidar com dinheiro. Outubro é o mês das crianças. Se você tem filhos, eis uma boa oportunidade para pensar no assunto. Para especialistas. a melhor hora para começar a aprender sobre finanças é mesmo a primeira infância: quando começamos a pedir para nossos pais ou responsáveis comprarem coisas para nós. Mas como abordar o tema de maneira delicada e ao mesmo tempo didática? Especialistas nos contaram qual a forma mais adequada — e a época apropriada — para uma criança aprender a cuidar de dinheiro.
Falamos também com pais e mães que criaram seus próprios métodos para ensinar seus filhos — na base da intuição. Sem nunca ter recebido educação financeira, Thais Andrade, professora, começou a tratar o assunto dinheiro no dia a dia da sua filha, Eduarda. Como boa parte dos brasileiros, Thais não tinha uma boa relação com o dinheiro: diz que sempre foi muito consumista e gastava além do que podia. “Sempre vivi no vermelho”, reconhece.
Thais decidiu então ensinar sua filha desde cedo sobre como cuidar do dinheiro. A história começou quando a professora abriu sua própria escola e Eduarda, ainda criança, disse que queria ajudar, pegando Thais de surpresa. A mãe resolveu que pagaria um valor simbólico para a filha, uma “semanada”, a mesada a cada sete dias — já que a filha procurava mesmo colaborar com a mãe em pequenas tarefas do cotidiano. Thais se viu na obrigação de ensinar Eduarda a lidar com o próprio dinheiro: queria que ela tivesse uma educação financeira melhor do que a que tinha recebido.
Assim como acontece com a maioria das crianças, Eduarda sempre pedia presentes para a mãe. Mas. quando começou a receber a semanada, Tais passou a ensinar a filha como avaliar o que realmente era necessário comprar, distinguindo do que era apenas algo que Eduarda queria ter. Em resumo, estabeleceu diferenças entre o consumo pertinente do que é somente uma vontade ocasional de consumir.
A professora lembra que. quando Eduarda tinha 11 anos, pediu para comprar um guarda-roupas novo. A mãe disse que ela teria que esperar um pouco. Então, para a surpresa dos pais, Eduarda pegou seu cofrinho e viu que tinha dinheiro suficiente para comprar o móvel. Essa foi a primeira grande aquisição da jovem, que hoje tem 17 anos.
Além de aprender o valor do dinheiro, um dos maiores benefícios vistos por Thais ao ensinar a filha ainda criança sobre como aprender, ainda que o básico, sobre finanças, é que hoje Eduarda sabe se organizar e usar seu salário com responsabilidade. A mãe acredita que não basta apenas ensinar a criança a guardar o dinheiro – também é necessário mostrar como e quando gastá-lo. “Não se pode apenas guardar todo o dinheiro que ganhamos”, comenta ela.
Mas o processo continua. Mesmo após anos ensinando sua filha sobre educação financeira, Thais conta que ainda sente Eduarda “um pouco ansiosa para lidar com dinheiro”. É que a filha hoje adolescente trabalha em uma loja de roupas — e ama moda. “Às vezes extrapola nos gastos, mas ela mesmo percebe”, diz. Quando isso acontece, Thais explica que tenta servir de exemplo para a filha.
A mãe reforça que continua ajudando Eduarda, e que pretende começar a ensinar a filha a investir.
É importante ensinar educação financeira para crianças?
Uma dica que Thais dá para os pais que querem falar sobre dinheiro com crianças é que comecem cedo. Vale o conselho de mãe, mas o que pensam especialistas sobre qual a melhor hora e idade para falar sobre dinheiro com crianças?
Para Thabata Abreu, fundadora e Consultora Financeira na FCP Consultoria e Investimentos, tão logo a criança começar a pedir coisas é interessante mostrar o valor do dinheiro e de como surge o processo e o interesse para ganhá-lo.
Luciana Ikedo, assessora de investimentos e sócia no escritório RV4 Investimentos, a melhor hora para falar sobre finanças com os pequenos é a partir dos 3 anos de idade. Assim como Thabata, ela acredita que o assunto pode ser abordado quando a criança passar a pedir para comprar algo. Aos poucos ela irá perceber que existe um sistema monetário e como ele funciona na prática.
Claro que a criança não vai entender tudo de uma vez sobre o tema, o que é complicado até mesmo para muitos adultos. Luciana recomenda alternativas mais didáticas para introduzir conversas sobre dinheiro no dia a dia dos jovens, como livros, brincadeiras lúdicas e dar exemplos simples como não gastar todo o dinheiro da mesada — ou semanada — no mesmo dia em que recebem.
Luciana lembra que “as crianças se espelham nos pais durante muito tempo e com a vida financeira não poderia ser diferente.” Assim, ela acrescenta, é importante que a criança conheça a realidade familiar e presencie pais e parentes próximos realizando boas escolhas no que diz respeito ao dinheiro — “como reservar uma parte do salário para o pagamento de dívidas e outra para compras.”
As especialistas acreditam no básico e essencial: a importância de pais e a sociedade, de modo geral, servir como exemplo para as gerações mais novas.
Devo dar mesada para meus filhos a partir de qual idade?
Muitos pais também recorrem a mesadas para introduzir educação financeira na vida dos pequenos, e essa pode ser mesmo uma boa ideia — mas com uma pequena ressalva. Na avaliação de Thabata e Luciana, a “semanada” pode parecer uma opção melhor, pois as crianças não ficam tão ansiosas esperando o “dia do pagamento”.
Thabata acredita que a partir dos 5 anos as crianças já podem começar a receber semanadas, e assim vão aprender a negociar e a guardar uma parte do dinheiro que recebem. As duas especialistas concordam que pode não ser uma boa ideia relacionar o pagamento da mesada com as obrigações das crianças.
As crianças devem aprender a separar suas responsabilidades do ganho financeiro, ponderam.
Segundo a pedagoga e educadora financeira especialista em jovens, Luiza Dalmazo, os pais podem falar sobre dinheiro com os filhos desde que são pequenos. Isso não quer dizer, claro, que educação financeira será um tema central, mas que é possível passar alguns conceitos importantes logo no início da vida.
Idas ao supermercado, por exemplo, são uma boa oportunidade para abordar o assunto. “A criança vai pedir algo no mercado e você tem a oportunidade de explicar por que vai comprar ou por que não vai. Por exemplo, ‘a mamãe vai comprar fruta pois é o que está faltando lá em casa’”. Para, ela, a conversa pode ser tão simples e direta quanto falar para a criança não colocar o dedo na tomada pois vai machucar.
Criança pode investir?
“Ah, eles crescem tão rápido…”, dizem os pais e mães corujas. Um dia você está ensinando seu filho sobre como funciona o dinheiro, como as pessoas trabalham para ganhá-lo, e no minuto seguinte ele ou ela já estão com idade — e muita curiosidade — para entender detalhes sobre o mercado financeiro.
Quando os jovens completam 12 anos, Luciana diz que podem estar aptos a aprender sobre o mercado. Mas com 12 anos e já às voltas com renda fixa e outros tipos de investimentos? A partir dessa idade, ela recomenda montar uma carteira de investimentos que deve ter uma função educativa, sob orientação dos pais ou de um um gestor ou especialista. Esse portfólio deve conter uma reserva de emergência, renda fixa e até renda variável.
A assessora considera que renda variável como ações e fundos imobiliários (FIIs) permitem que o adolescente experimente a renda passiva.
Pode-se aprender um pouco mais tarde sobre esses investimentos, dependendo do interesse dos filhos. Thabata acredita que é importante falar sobre dinheiro com crianças e adolescentes da maneira mais natural possível, até porque é algo que faz parte do nosso cotidiano. “Devemos estabelecer um ambiente aberto, honesto, de mutuo respeito”, sublinha.
Ter educação financeira, além de ser bom para o bolso, ajuda no futuro do país, explica Thabata. Quanto mais cedo esse assunto for introduzido no cotidiano, mais aumentam as chances de a pessoa ou uma sociedade se desenvolver economicamente.
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