Por que o dólar continua em alta? Veja o que esperar da moeda
Com ativos de risco e mercados globais em queda, em agosto a atenção esteve voltada aos títulos de dívida do governo americano, os treasuries, de 10 anos. Suas taxas foram valorizadas em 20 pontos, alcançando um patamar de 4,34%, o maior registrado em comparação com o ano de 2007. Em razão desse último fator, o dólar registrou alta global de 1,7% – e, no Brasil, acumulou ganhos de 4,6%. Outro ativo que também teve uma apreciação elevada no mesmo período foi o petróleo (Brent: 1,5%), de acordo com dados de relatório da XP.
Apesar dessa movimentação, os especialistas recomendam cautela diante do cenário em curto e médio prazos com relação ao dólar. A avaliação é de que num futuro próximo a taxa de juros ficará elevada. Igualmente é prudente continuar mantendo certa atenção sobre os ativos de risco que seguirão em desvantagem sobre os treasuries, os quais tendem a manter o destaque recebido no último mês.
Ainda conforme informações do mesmo estudo da XP, essa precaução em relação à moeda americana se dá por uma contração na liquidez do sistema financeiro. De outro lado, a alocação em ações por parte dos investidores segue em fase de normalização.
Soma-se ao contexto um possível esgotamento dos impulsos de consumo vinculados à economia dos EUA que estavam para cima, puxados por grandes eventos. Sobretudo aqueles do setor de entretenimento, como as estreias de filmes como “Barbie” e “Oppenheimer”, cujos gastos globais com divulgações foram elevados. No caso do primeiro longa, a arrecadação informada até 24 de agosto e apresentada pela CNN era da ordem de US$ 356 milhões; no Brasil, foram arrecadados R$ 84 milhões em bilheteria com apenas quatro dias em exibição. Já o segundo filme havia ultrapassado US$ 700 milhões até meados de 20 de agosto, impulsionando o consumo de itens relacionados por parte dos consumidores.
O dólar à vista encerrou a sessão desta quinta-feira, 21, em alta de 1,13%, cotado a R$ 4,9352, perto da máxima, a R$ 4,9362, registrada na reta final dos negócios com o aprofundamento da baixa do Ibovespa. A perda de força do real ocorreu em meio a uma onda de fortalecimento da moeda americana no exterior e à alta das taxas longas dos Treasuries, ainda sob o impacto da decisão de ontem do Federal Reserve. Embora tenha mantido a taxa básica no intervalo entre 5,25% e 5,50%, o banco central americano deixou a porta aberta para uma alta adicional dos juros e sinalizou manutenção de política monetária restritiva por período prolongado.
Bolsa dos EUA
As bolsas dos Estados Unidos registraram queda em agosto — S&P 500 (-1,6%) e Nasdaq 100 (-1,5%). O Ibovespa seguiu a mesma tendência negativa (-8,8%), assim como os Mercados Emergentes (-6,1%), lembra a XP. O relatório também destacou a movimentação em baixa da China (-8,9%), que passa por um momento de instabilidade, em especial o setor imobiliário.
Ainda em relação à bolsa americana, os analistas ressaltaram a alta do percentual mensal em dólares num setor específico, o de energia (1,6%). Saúde demonstrou leve queda (-0,7%), seguido de tecnologia (-1,5%) e de comunicações (-1,5%). Já os segmentos de bens de consumo (XLP: -3,9%) e de utilidades públicas (-6,1%) acumularam as maiores perdas.
Especificamente sobre as big techs, o levantamento pontuou o seguinte: apesar de algumas surpresas positivas, estas não foram suficientes para manter o mercado aquecido. O destaque do período com percentual mensal em dólares ficou para Nvidia (NVDA: 5,6%), seguida da Amazon (AMZN: 3,2%) e da Alphabet, companhia detentora da marca Google (GOOG: 3,2%). A baixa do setor é liderada pela Meta (-7,1%), Apple (AAPL: -4,2%), Tesla (TSLA: -3,5%) e, por fim, Microsoft (MSFT: -2,2%) e Netflix (NFLX: -1,2%).
NY fecha em baixa, com expectativa de juros altos por mais tempo nos EUA
As bolsas de Nova York fecharam em baixa, com pressão dos juros dos Treasuries. Os movimentos ocorreram em função das expectativas por juros mais altos por mais tempo, após decisão monetária do Federal Reserve (Fed), renovadas por dado que mostrou força do mercado de trabalho americano.
O índice Dow Jones caiu 1,08%, a 34.070,42 pontos, enquanto o S&P 500 recuou 1,64%, a 4.330,00 pontos, e o Nasdaq perdeu 1,82%, a 13.223,98 pontos.
O número de pedidos semanais de auxílio-desemprego nos Estados Unidos foi menor que o esperado, pressionando os índices futuros das bolsas. O dado reforçou a percepção de que o Fed poderá deixar a política em nível restritivo por mais tempo, como indicaram ontem o presidente da instituição e o gráfico de pontos. Nesse pano de fundo, a ponta longa dos juros dos Treasuries subiu, também pressionando os mercados acionários.
O analista da Oanda Edward Moya disse que os investidores estão preocupados com as taxas de juros, as quais aparentam que “não vão cair tão cedo”. “O Fed vê um mercado de trabalho que não está enfraquecendo e os principais impulsionadores da inflação provavelmente ainda manterão os preços elevados”, disse ele em relatório. “Os dados sobre pedidos de auxílio-desemprego mostram que as demissões em massa ainda não começaram, o que deve apoiar as tendências de gastos do consumidor.”
Assim, todos os setores do S&P 500 fecharam em baixa. Em destaque, a ação da gigante Cisco teve queda de 3,89% após anunciar que vai adquirir a empresa de software Splunk por US$ 28 bilhões, ou US$ 157 por ação. A da Splunk, por sua vez, saltou 20,77%.
Entre big techs, o papel da Amazon cedeu 4,41%, o da Alphabet perdeu 2,47% e o da Meta, 1,31%. Microsoft teve queda de 0,39%, embora tenha chegado a subir durante o pregão, na esteira de notícias de adoção de inteligência artificial (IA) como parte do novo sistema operacional do Windows 11.
O segmento de chips também fechou majoritariamente no vermelho, com destaque para Nvidia (-2,89%). Broadcom recuou 2,67% depois de a imprensa reportar que executivos do Google discutiram amplamente a possibilidade de abandonar a empresa de semicondutores como fornecedora de chips de inteligência artificial (IA) em 2027.
Dólar sobe 1,13% nesta quinta (21) com perspectiva de juro alto por período prolongado nos EUA
Como é de praxe em episódios de ajuste global de portfólios motivados por aversão ao risco, o real amargou as piores perdas entre as principais moedas emergentes e de países exportadores de commodities. Operadores do dólar explicam que é mais fácil para os investidores reduzirem posições em real, dado que a divisa brasileira é mais líquida e, portanto, oferece opção de saída com custos menores. Apesar do escorregão hoje, o real e as demais divisas latino-americanas de países com juros altos, mas chamadas “moedas de carrego”, seguem liderando os ganhos em relação ao dólar em 2023. Destaque para os pesos colombiano e chileno, com valorização de dois dígitos.
Por aqui, analistas afirmam que decisão do Banco Central brasileiro, ontem à noite, de cortar a taxa Selic em 0,50 ponto porcentual, para 12,75% ao ano, e indicar novas reduções de igual magnitude nos próximos meses ainda não tira a atratividade do real. Apesar do estreitamento do diferencial entre juros interno e externo, o Brasil segue oferecendo taxas reais elevadas para os estrangeiros.
A economista-chefe da Armor Capital, Andrea Damico, classificou o comunicado do Copom como “um pouco mais duro na margem”. Além de um recado de que é necessário cumprir as metas fiscais para ancoragem das expectativas de inflação, o comitê sinalizou que pretende manter o atual ritmo de cortes “nas próximas reuniões”, o que tende a reduzir as apostas em redução da Selic em 0,75 ponto porcentual em dezembro.
“A rigor, o Copom ter sido um pouco mais duro deveria, em tese, contribuir para um desempenho melhor do real, mas o ambiente externo está preponderando hoje. A reação adicional ao Fed está levando a abertura dos Treasuries e ao fortalecimento do dólar“, afirma Damico, ressaltando que as projeções dos integrantes do BC americano para juros e indicadores econômicos em 2024 e 2025, incluídas no chamado ‘gráfico de pontos’, trouxeram uma mensagem “bastante dura” para o mercado. “E o Powell, que costumava suavizar o comunicado, desta vez manteve um tom firme, reforçando a confiança de que a atividade está resiliente, o que demanda mais juros”, acrescenta a economista, em referência a declarações do presidente do Fed, Jerome Powell, em entrevista coletiva.
Com Estadão Conteúdo
*Com Samira Moratti