Na primeira semana de junho, uma das disputas judiciais mais famosas entre empresas ganhou mais um capítulo. O entrave entre Apple (AAPL34) e IGB Eletrônica (antiga Gradiente) sobre a marca iPhone não teve conciliação após decisão do Ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF).
A batalha nos tribunais pela marca terá que ser julgada pelo plenário após as partes não entrarem em acordo. O caso estava em mediação pela ex-ministra Ellen Gracie até então.
A disputa que se arrasta nos tribunais desde meados de 2013, e chegou ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) ainda em 2018, tem como base a marca do smartphone mais famoso do mundo.
A Gradiente, em 2000, registrou como marca o nome “G Gradiente Iphone” no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), o que a colocou em um impasse com a gigante americana. Em 2013, a Apple chegou a tentar anular o registro, mas não conseguiu.
O caso é o mais emblemático dos últimos tempos entre os que chegam a processos judiciais por disputa de marcas, dada a legislação vigente que regulamenta as marcas industriais.
“A nossa legislação segue os padrões internacionais, e nós [no Brasil] nos apoiamos em convenções que seguem patamares mínimos. O que ocorre é que quando o público ouve sobre esses casos, acha um absurdo, mas a lei visa justamente o consumidor. Em vários casos é para evitar censura ou outras medidas mais restritivas”, analisa a advogada Fernanda Soler, pesquisadora na área de propriedade intelectual.
Além do caso iPhone, confira outras histórias de marcas famosas que precisaram entrar na Justiça para preservar seu nome:
Via e BIG brigam pelo “B”
As disputas, em grande parte, são fruto de ações que visam uma diferenciação de marcas, evitando vendas por engano ou uma associação errada, como foi visto no caso recente de Via (VVAR3) – ex Via Varejo.
O Grupo BIG (ex-Walmart) processou, em janeiro deste ano, a detentora das Casas Bahia pela utilização da letra “B” no logotipo em uma forma semelhante ao utilizado pela varejista.
Essa distinção sai da seara do “nome comercial” ou “razão social”, que são registrados em uma junta comercial. Nesse caso, os processos tratam do que conhecemos como nome empresarial.
Apesar de ser muito difícil criar algo 100% original, dado o volume de registros, os casos entre pequenas empresas tendem a ser menores e menos danosos. As grandes disputas ocorrem entre empresas com grande receita, mas também com marcas maiores e mais estabelecidas.
Ambev e as latinhas gêmeas
Outro exemplo famoso é o da Ambev (ABEV3), que moveu ação contra o Grupo Petrópolis por causa de uma embalagem utilizada na cerveja Itaipava que seria semelhante à da Brahma, em cor vermelha.
No fim das contas, em 2012, o Grupo foi proibido de vender a Itaipava na cor vermelha e teve de retirar as que estavam em circulação em um prazo de 30 dias.
Victoria’s Secret versus Monange
Em 2011, a norte-americana Victoria’s Secret processou a Monange após a marca brasileira promover um desfile com modelos de lingerie e asas de anjo.
O modelo de desfile, segundo a companhia, figura como plágio e concorrência desleal, e na primeira vitória a marca americana ganhou R$ 100 mil, em 2012.
Contudo, seis meses depois, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) reverteu a sentença e a Monange foi absolvida juntamente com a Globo, que havia transmitido o desfile das “monangels”.
Visa, de cartões, perdeu para Visa Laticínios
No fim de maio deste ano, a Visa (VISA34), bandeira de cartão de crédito, perdeu uma batalha na justiça tentando impedir a Visa Laticínios de utilizar este nome. A segunda companhia, brasileira, é uma fabricante de iogurte de Minas Gerais que está com o Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) inativo desde 2010.
O pedido já havia sido negado em 2009 pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), mas a companhia recorreu.
Segundo a decisão mais recente do STJ, não há possibilidade de os consumidores confundirem os serviços oferecidos pelas marcas, dada a distinção de segmento, além do fato de que a Visa não possui o registro de marca de alto renome, dado pelo INPI.
Marca Italiana ganhou nos tribunais pelo “J” de Steve Jobs
Apesar de as normas vigentes seguirem os padrões internacionais, diversos fatores são levados em consideração neste tipo de decisão.
Como exemplo, ainda falando da Apple, um processo singular entre a big tech e uma marca de roupa italiana levou em conta um fator bem distinto ao falar sobre identidade visual.
Em 2012, a marca da Itália registrou-se como “Steve Jobs“, como uma óbvia maneira de homenagear o criador da Apple. Contudo, a companhia entrou com processo alegando uso indevido de marca e citando que, além do nome, o “J” de “Jobs” possuía uma folha e uma marca de mordida, claramente em alusão ao logo da maçã da Apple.
Apesar da tese verossímil, a Apple sofreu um revés e perdeu nos tribunais em 2017, pois o argumento que prevaleceu foi o de que a letra “não é um elemento comestível”, logo, o recorte estilizado não poderia, oficialmente, ser considerado como uma marca de mordida.
O exemplo serve para alertar que nem tudo entra no campo de registros de marca, e nem todo tipo de logotipo ou elemento é “patenteável”.
O que fazer para evitar disputas judiciais
Nas primeiras anotações, no embrião de uma futura companhia, é necessário que seja reservado um tempo para checar a possibilidade de registros e o histórico do nome, da marca e da identidade como um todo. Isso porque a pior decisão possível é esperar a empresa crescer e se preocupar com essa parte somente depois.
“É claro que sempre temos um custo, por causa das custas com os advogados e afins, e eventualmente se você perder, há indenização. Mas é recomendável que se faça isso sempre no começo. Olhar o INPI é essencial, temos uma base de material grande, e é sempre recomendável ‘dar um Google’ antes, para checar se aquela inspiração que você tem não é uma versão de um trabalho de outro”, explica Soer.
Assim, desde o início, a recomendação é de registrar a marca e protegê-la como modo de evitar disputas judiciais, que independentemente do resultado, tendem sempre a ser mais custosas.