Não é só a CVC: crise impacta as maiores empresas de turismo do mundo

É consenso no mercado internacional que a pandemia do novo coronavírus (Covid-19) impactou — e continuará impactando — as economias globais como poucas vezes na história. Entre alguns setores pouco influenciados e outros muito impactados, sem sombra de dúvidas o turismo é um dos destaques negativos. Aqui no Brasil, lembramos da CVC (CVCB3), a maior empresa do setor no País.

O mercado da maior agência de turismo do Brasil é um exemplo prático de que o temor dos investidores pelo segmento é factível durante esta crise. A CVC iniciou o ano com suas ações cotadas a R$ 44,71, e, desde então, os papéis chegaram a cair mais de 85% em pouco mais de três meses. Recuperando parte das perdas, o atual valor de mercado da empresa é de aproximadamente R$ 2,8 bilhões, número que chegou a ser quase quatro vezes maior no começo de 2019.

Junto a isso, uma série de externalidades impactaram o desempenho da CVC no período, como os imprevistos com a quebra da Avianca, a crise argentina e o óleo nas praias nordestinas no ano passado, e a recente mudança na presidência da empresa, além da resolução de uma auditoria externa sobre as contas da companhia. No entanto, é inegável que as dúvidas sobre o setor de turismo pairam sobre a empresa. De acordo com a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), somente até junho deste ano o setor de turismo no Brasil já havia perdido R$ 90 bilhões, dizimando 727 mil empregos — o que explica parte do pessimismo com a CVC.

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A própria diretoria da CVC entende que os reflexos da crise no turismo vão se prolongar para os próximos anos, não se atendo somente a 2020. Para um setor que, segundo o Conselho Mundial de Viagens e Turismo (WTTC, na sigla em inglês), tem crescido acima do Produto Interno Bruto (PIB) global e que demonstrava boas perspectivas de crescimento, uma pandemia desta magnitude pode fazer as empresas passarem por complicados entraves e repensarem seus modelos de negócio.

Entretanto, por se tratar de uma pandemia, os efeitos ocorrem em todo o planeta, mesmo que em grau e intensidade diferentes do observado na CVC, por exemplo. Desconsiderando as companhias aéreas (que também sofreram com a baixa da demanda e medidas contra o coronavírus), confira como as quatro maiores empresas de turismo do mundo sofreram e estão lidando com a crise, cada uma com sua particuliaridade de atuação dentro do setor.

TUI Group

Em termos de receita total, a Touristik Union International (TUI) Group (ETR: TUI1) é a maior empresa do setor do mundo. A companhia, sediada em Hannover, na Alemanha, controla cinco companhias aéreas europeias — a maior frota de férias da Europa — e vários operadores turísticos que operam no Velho Continente.

Em julho, a TUI fechou 166 lojas de rua, no Reino Unido e na República da Irlanda, em função da pandemia. Segundo a diretoria da empresa, a decisão ocorreu tanto pelas medidas de contenção ao vírus, como pela mudança no comportamento dos clientes. “O comportamento do cliente já mudou nos últimos anos, com 70% de todas as reservas da TUI UK ocorrendo on-line. Acreditamos que a Covid-19 apenas acelerou essa mudança nos hábitos de compra, com as pessoas procurando comprar on-line ou desejando falar com especialistas em viagens do conforto de suas próprias casas”, disse Andrew Flintham, diretor-geral da empresa naqueles países.

As marcas da TUI.

O fechamento das lojas, no entanto, não foi suficiente para mitigar os impactos nos números da empresa. A receita total do grupo caiu 98% no período entre abril e junho, na comparação anualizada, para € 71,8 milhões. O Ebit (lucro antes de juros e impostos) foi negativo em € 1,1 bilhão. Os custos com hedge, realizados para proteger a empresa, além de terem sido elevados mostraram-se ineficazes.

As vendas para o verão europeu de 2020 caíram 81% no geral; o preço médio de venda recuou 10%. Dessa forma, a TUI atingiu apenas 16% das vendas do programa de viagens planejado. Um ano atrás, 88% da meta foi atingida. A empresa, todavia, pontuou que 15% do portfólio de hotéis, ou seja, 55 unidades, foram reabertas no segundo trimestre.

O prejuízo da TUI fez com que a empresa recebesse um pacote de € 1,2 bilhão em forma de auxílio do governo alemão neste mês. “O pacote de estabilização de € 1,2 bilhão fortalece a posição da TUI e forneceria liquidez suficiente neste ambiente de mercado volátil para cobrir a oscilação sazonal da TUI durante o inverno 2020 e 2021″. A empresa já havia recebido € 1,8 bilhão do KfW, o banco público de desenvolvimento da Alemanha, em abril.

As ações da companhia são negociadas na Bolsa de Valores de Frankfurt e na London Stock Exchange (LSE), e compõe o índice FTSE 250. Nos últimos 12 meses, os papéis da TUI caíram mais de 70% (movimento parecido com o da CVC), não se recuperando em sua totalidade — assim como boa parte dos mercados europeus.

Expedia

A Expedia Group (NASDAQ: EXPE) é um dos maiores grupos de turismo misto em todo o mundo. Com mais de 25 mil funcionários em todos os cerca de 80 países em que atua, a empresa é responsável por gerenciar dezenas de marcas de sites que estão entre os mais acessados por aqueles que procuram reservar passagens aéreas, carros, hotéis ou atrações.

A empresa teve uma receita de US$ 12,06 bilhões em 2019, com um lucro líquido de US$ 565 milhões — o que havia representado uma alta de 39% sobre o reportado um ano antes. No entanto, a pandemia fez com que os resultados da empresa recuassem de forma acentuada. No segundo trimestre deste ano, o faturamento caiu 82%, perfazendo um prejuízo líquido de US$ 753 milhões, enquanto no mesmo período do ano passado havia registrado um ganho de US$ 183 milhões.

“O segundo trimestre de 2020 possivelmente representa o pior trimestre já visto na história moderna para a indústria de turismo, e a Expedia não foi exceção. No entanto, após uma forte queda em abril, observamos um consistente movimento de recuperação na receita entre maio e junho, com os cancelamentos em menor ritmo nesse período”, disse a empresa em seu balanço.

O CEO da empresa, Peter Kern, pontuou que “nós não conseguimos controlar o movimento de demanda no curto prazo, então estamos focados em nossa estratégia de longo prazo. Reorganizando e simplificando nossa empresa, nós podemos otimizar nossas marcas, nossas informações e nossas plataformas tecnológicas”.

Escritório da Expedia, em Seattle.

E não para por aí: a Expedia lançou programa de apoio a pequenos negócios do setor de turismo. O projeto, que também engloba o Brasil, levantará até US$ 275 milhões para hotéis, hostels e pousadas que foram fortemente impactadas pela pandemia, trazendo seu faturamento a praticamente zero. Entre as medidas estão as condições de pagamento da plataforma em três meses, ferramenta de análise de dados e treinamento para profissionais que perderam seus empregos.

Atualmente, as ações da Expedia na Bolsa de Valores de tecnologia dos Estados Unidos são negociadas por volta de US$ 90. A empresa ainda não se recuperou da máxima histórica atingia em fevereiro, de US$ 122,80. A companhia é avaliada em US$ 12,52 bilhões.

Booking

Assim como a CVC, a Booking Holdings Inc. (NASDAQ: BKNG) também tem passado por desafios e, em consequência das adversidades, procura mitigar os impactos da pandemia com medidas drásticas. A companhia está prevendo uma reestruturação de suas despesas e prevê o desligamento de 25% de seus funcionários, ou seja, cerca de 4.500 pessoas.

O CEO da Booking, Glenn Fogel, salientou em um vídeo direcionado aos colaboradores da empresa, há cerca de duas semanas, que “a indústria de viagens permanece sobre significativa pressão”. A companhia, que atua em mais de 65 países e conta com 26 mil funcionários, pretende concluir os planos de afastamento em setembro, ao passo que planeja encaminhar os avisos de demissão aos funcionários até o fim de 2020.

A empresa é considerada o player mais eficiente no mercado de agências de viagens on-line, atuando em mais de 40 idiomas — o Brasil, inclusive, é uma das operações mais rentáveis da companhia. No entanto, a liderança do mercado não fez com que a empresa deixasse de apresentar resultados aquém do esperado em função do coronavírus.

No segundo trimestre deste ano, a receita total da empresa foi de US$ 630 milhões, uma queda de 83% sobre o reportado no mesmo período do ano passado. O lucro líquido ficou em US$ 122 milhões, enquanto no segundo trimestre de 2019 havia sido de pouco menos de US$ 1 bilhão.

A empresa, entretanto, vem se mexendo para estimular a demanda em seu curso normal. Em Portugal, a Booking fechou, na última sexta-feira (21), uma parceira com a Continete e passará a dar saldo em cartão dos usuários da empresa. A agenciadora de turismo retornará 4% do valor de qualquer reserva efetuada diretamente em sua plataforma.

Atualmente, as ações da Booking são negociadas na Nasdaq a US$ 1.775. Os papéis acumulam uma baixa de aproximadamente 14% em 2020. Ainda assim, a relação Preço/Lucro da empresa está em quase 30 vezes.

TripAdvisor

A TripAdvisor (NASDAQ: TRIP), amplamente conhecida no Brasil, foi considerada pelo Jumpshot for Tripadvisor Sites, em novembro de 2019, a maior plataforma de viagens do mundo. A empresa diz, em seu site e aplicativo, que existem 867 milhões de avaliações sobre viagens, hospedagem, serviço, que ajudam mais de 460 milhões de viajantes todos os mês. No entanto, dadas as circunstâncias dos últimos meses, isso não se repetiu.

No período entre abril e junho, a empresa teve uma receita total de US$ 59 milhões. Em comparação ao mesmo período do ano passado, o resultado é 86% menor. O lucro líquido, que foi de US$ 34 milhões um ano antes, se tornou um prejuízo de US$ 153 milhões. O fluxo de caixa livre também foi negativo, em US$ 93 milhões.

O resultado do segundo trimestre da empresa veio abaixo das estimativas dos analistas de Wall Street em todos os aspectos divulgados. A Tripadvisor, no entanto, disse que “a empresa ainda acredita que o negócio tem liquidez suficiente para suportar um longo período de receitas em declínio, e continua confiante na sua capacidade de honrar a dívida das obrigações em 2020, 2021 e no futuro”.

Como suas concorrentes, a TripAdvisor também anunciou o desligamento de cerca de 1/4 de sua força de trabalho total, com o objetivo de estancar a sangria do momento. A companhia, que interage com mais de 8 milhões de estabelecimentos de hospedagem em todo o mundo, está preparada para enfrentar os desafios, segundo sua diretoria.

O CFO da Trip Advisor disse, em teleconferência com analistas, que “à luz do que é desconhecido, planejamos nossas ações com conservadorismo. Durante o segundo trimestre, tomamos medidas rápidas e combinadas para preservar o caixa e manter nossa sólida posição financeira”. “Estamos operando com prudência e estamos preparados para uma variedade de cenários de recuperação”, disse.

A empresa possui uma operação estruturalmente distinta à apresentada pela CVC, mas foi impactada da mesma forma. Do começo do ano até o fim de março, auge da crise no mercado, as ações da TripAdvisor caíram mais de 50% — os papéis ainda apresentam uma baixa de 40% em comparação ao preço de 12 meses atrás.

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Jader Lazarini

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