O Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) promoveu hoje mais um corte de 0,50 ponto percentual na taxa básica de juros, confirmando a expectativa do mercado, e levando a Selic para 12,25% ao ano. Analistas divergiram sobre o tom do comunicado, mas a maioria ainda projeta uma Selic em 11,75% ao fim de 2023.
A decisão do Copom foi unânime e o comunicado sobre o corte da taxa Selic enfatizou a preocupação com o cenário externo, adicionando uma avaliação de que a conjuntura internacional é mais incerta do que a usual e exige cautela na condução da política monetária.
Além disso, o comitê do BC também reafirmou a importância de o governo perseguir as metas fiscais para a ancoragem das expectativas de inflação e para a condução da política monetária.
Segundo o head de pesquisa macroeconômica da Kínitro Capital, João Savignon, o comunicado veio em linha com as expectativas e pode ser recebido pelo mercado como dovish (suave), na medida em que havia uma possibilidade de o BC sinalizar a manutenção do ritmo de corte apenas na próxima reunião.
“O único elemento que pode ser considerado um sinal mais duro (hawkish) foi a preocupação com a conjuntura internacional, que na avaliação do Copom está mais adversa. Mas, em nossa visão, como a taxa de câmbio tem se comportado de forma relativamente benigna, isso não traz implicações imediatas sobre a condução da política monetária doméstica”, afirmou Savignon.
Copom: expectativas de inflação
Como esperado, os membros do comitê do BC revisaram também as expectativas para a inflação de 2023 para baixo (de 5,0% para 4,7%), mas elevaram as projeções do horizonte relevante para a política monetária. Assim, 2024 passou de 3,5% para 3,6% e a de 2025 de 3,1% para 3,2%.
Por fim, o comunicado reforçou seu plano de voo, atestando que esse ritmo de cortes nas próximas reuniões é apropriado para manter a política monetária contracionista necessária para consolidar o atual processo desinflacionário.
Já Alexandre Espirito Santo, economista-chefe da Órama, apontou que com o cenário de inflação mais favorável, de preços de alimentos e serviços mais comportados, as atenções se voltaram para preços administrados, sobretudo os combustíveis, face às guerras em curso, agora incluindo a que ocorre em Israel, e que pode perturbar o mercado de petróleo e provocar reajustes mais fortes nos derivados.
No documento, o Comitê ressaltou a necessidade de atenção e cautela quanto ao cenário internacional, destacando as elevadas taxas de juros de longo prazo nos EUA, que atingiram máxima desde 2007, e as novas tensões geopolíticas.
“Importante destacar que os recentes ruídos associados à política fiscal brasileira não podem ser desconsiderados. Como bem ressaltou o presidente do BC, Roberto Campos Neto, temos ‘desancoragem gêmea’. A equipe econômica vinha emitindo sinais de que tinha como alvo zerar o déficit primário em 2024, apesar do mercado duvidar que essa meta fosse exequível, como vinha apontando o boletim Focus. No entanto, uma demonstração oficial contrária do Executivo causa desconforto e, sob o olhar das expectativas, pode, sim, interferir na política monetária mais à frente”, continuou Espirito Santo.
Selic vai a quanto no final de 2024?
De toda forma, a Órama considerou decisão de hoje do Copom acertada. No comunicado pós-encontro, o Comitê sinalizou que avaliará os desdobramentos da inflação, salientou o balanço de riscos como de costume, e deu um enfoque maior ao cenário internacional.
A Órama manteve a estimativa de Selic em 11,75% ao fim de 2023 e para 2024 acredita que a taxa terminal ficará em 9,5% a.a., com quatro reduções de 0,5 p.p. e uma última de 0,25 p.p.
Os economistas Étore Sanchez e Guilherme Sousa, da Ativa Investimentos, apontaram que, como era esperado, o BC seguiu sinalizando corte de juros ao ritmo de 0,50 p.p. para as reuniões seguintes, sem restringir o horizonte prospectivo para apenas uma reunião adicional, ao manter o plural do termo “nas próximas reuniões” no parágrafo sobre o futuro da política monetária.
A autoridade reafirmou que irá preservar a “política monetária contracionista até que se consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas de suas metas”.
As projeções condicionais para o IPCA no horizonte relevante (2024 e 2025) ficaram acima do esperado pela Ativa e do estimado na reunião anterior. Sobre o fiscal, apesar da piora na percepção dos agentes nos últimos dias, o BC adotou tom neutro e apenas reafirmou a necessidade de persecução das metas fiscais.
“Assim, reafirmamos nossa projeção de o ciclo de corte de juros deverá ser interrompido a 10,50%, 1,50 p.p. acima do juro neutro estimado por nós. Os cortes projetados pela Ativa seguem em 0,50 até maio de 2024, quando a Selic deverá cair 0,25 p.p.”, completaram.
Copom analisa cenário internacional e adiciona cautela
Daniel Cunha, estrategista-chefe do BGC Liquidez, a decisão do Copom de cortar meio ponto e manter o forward guidance no plural (próximas reuniões) era esperada, apesar deste último ponto ainda reservar apreensões
“No comunicado, o comitê endureceu o tom ao atualizar o balanço de riscos que absorveu maior incerteza advinda do cenário externo, e quanto aos desdobramentos domésticos, sinalizou que estes (atividade + inflação) estão se desenrolando em linha com o esperado”, completou Cunha.
Para Débora Nogueira, economista-chefe da Tenax Capital, o comunicado apresentou uma combinação de elementos. Por um lado, as questões-chave foram mantidas, como o uso do plural na frase sobre passos futuros e a análise do balanço de riscos.
Por outro lado, o cenário internacional ganhou destaque em três novas situações, e a palavra “cautela” foi mencionada duas vezes. O Banco Central segue o plano de flexibilização com cortes ao ritmo de 0,50 p.p., mas buscou demonstrar reconhecimento do ambiente externo mais desafiador.
“Nesta semana, foi anunciada a mudança na alíquota única do ICMS para a gasolina, o que elevou a projeção do IPCA em 0,15 pontos percentuais em nossa avaliação. Esse deve ter sido o fator que levou o Banco Central a projetar uma taxa de inflação de 3,6% para o próximo ano”, disse a economista.
Quanto ao balanço de riscos, o parágrafo sobre o tema não sofreu alterações, mas ganhou uma nova frase no final, destacando o ambiente internacional desafiador. Isso não chega a desequilibrar o panorama de riscos, mas transmite a mensagem da necessidade de cautela.
Nicolas Borsoi, economista-chefe da Nova Futura, destacou o ponto importante que foi a afirmação de que 2024 e 2025 serão igualmente importantes para definir os próximos passos do Copom, reduzindo os efeitos negativos da elevação da projeção de inflação de 2024, que começa a ficar longe da meta de 3,0%.
“O Copom afirmou que o cenário global exige atenção e cautela, uma mensagem mais conservadora do que nas decisões anteriores. No cenário local, o Copom seguiu com a visão de desaceleração da economia e reconheceu a melhora nos últimos dados de inflação, apesar de seguir em níveis altos”, diz.
“Em nossa opinião, o objetivo do Copom é adequar o grau de restrição da política monetária, diante da queda da inflação e da desaceleração da atividade e, apesar do tom hawkish na conjuntura global, a manutenção do trecho sobre riscos fiscais, a maior importância de 2025 para a política monetária e a frase sobre os próximos passos nos fazem crer que o Copom seguirá com 0,50 p.p. até, pelo menos, março de 2024”, complementa Borsoi.
Por fim, a Nova Futura viu o comunicado bastante em linha, com um tom levemente dovish, o que os leva a esperar que a taxa Selic feche 2023 em 11,75% e 2024 em 10%, o que deve ancorar a ponta curta da curva de juros local.
Adriana Dupita, economista da Bloomberg, afirmou que a única mudança no comunicado foi a esperada menção à elevação dos yields americanos e às tensões geopolíticas, e a indicação de que isto pede uma especial cautela na política monetária.
“Este comentário abre espaço para que o BCB desvie do seu plano de cortar meio ponto a cada uma das próximas reuniões, caso o cenário internacional se deteriore”, completa.
Andre Perfeito, economista, afirmou que em sua opinião o mercado aproveita a fala de Lula para ajustar as posições que já estavam defasadas, apesar da perspectiva ser de queda para a Selic imaginar a taxa terminal em 9% o ano que vem era muito “otimismo”.
“Mantenho minha projeção em 10,75% o ano que vem”, diz. “Será interessante observar a discussão sobre os últimos dados da Pnad em que destaco a massa salarial real em patamar recorde e da elevação do rendimento médio real na margem”, finalizou sobre a decisão do Copom.