O Comitê de Política Monetária (Copom) iniciou sua quinta reunião do ano nesta terça-feira (3), com um dilema econômico que tem assombrado bancos centrais mundo afora. A alta da taxa básica de juros da economia (a Selic) está contratada. O que resta saber é o viés do colegiado sobre o cenário brasileiro no comunicado que vai acompanhar a decisão do comitê do Banco Central nesta quarta.
A recuperação econômica do Brasil foi sentida na pele com o crescimento acima do esperado de 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB) no primeiro trimestre. A economia mostrou que tinha fôlego para retomar o terreno perdido durante a pandemia, mas obstáculos já estavam no radar do Copom. Entre eles está o cenário inflacionário.
A guinada da inflação nos últimos meses obrigou os diretores do Banco Central a mudar a direção e utilizar uma política monetária contracionista para frear a perda do poder de compra.
Contudo, o dilema é: seguir em busca do crescimento econômico, com um tom hawkish e relevando a tendência de alta do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), ou elevar a Selic e desacelerar a recuperação, enquanto o desemprego atinge mais de 14 milhões de pessoas no País.
Para especialistas do mercado, o BC está optando pelo segundo cenário, com a alta da taxa de juros. “A curva de juros já precifica 1%. Mas uma possibilidade é também o BC manter a alta atual de 0,75% com a divulgação de uma ata mais dura”, diz Jansen Costa, sócio-fundador da Fatorial Investimentos.
Com um passado recente conturbado, o mercado teme que a inflação não tenha um caráter transitório.
Com expectativa pelo IPCA em alta, BC não tem para onde correr
Em relatório recente, o Itaú (ITUB4) disse que elevou a projeção para o IPCA deste ano de 6,1% para 6,9%, incorporando, sobretudo, uma maior pressão em serviços no segundo trimestre deste ano.
Com isso, a expectativa para a Selic saiu de 6,5% para 7,5% neste ano, permanecendo neste patamar ao longo do ano que vem.
O banco espera que o Copom anuncie uma alta de 1 ponto percentual amanhã. Em setembro, a alta deve ser de mais 1 ponto percentual, seguida por elevações de 0,75 ponto percentual em outubro e de 0,50 ponto percentual em dezembro.
“Tal decisão é consistente com a sinalização da autoridade de realizar uma normalização mais rápida se a evolução dos preços mais inerciais no setor de serviços mostrassem uma aceleração da inflação e se as expectativas de inflação para 2022 continuassem a subir”, comentaram os economistas da instituição.
Na visão deles, ambas as condições se materializaram, expandindo ainda mais o risco de perenidade da inflação em alta.
“Esperamos que o Copom comunique que pode ser adequado levar a taxa Selic para nível ligeiramente acima do nível neutro.”
Copom: urgência é fruto de BC “atrás da curva”
Na reunião de junho, o colegiado do BC retirou o termo “parcial” da normalização da Selic, elevando-a em mais 0,75 ponto percentual, para o patamar atual de 4,25%.
Contudo, na visão do BTG Pactual (BPAC11), o comitê não “conseguiu ser assertivo e, agora, se mostra novamente atrás da curva”.
No comunicado da última reunião, cita o banco, o BC trocou o termo “parcial” por “neutro”, mas em seguida “não se compromete com essa posição” — ou seja, os passos futuros poderão ser ajustados.
“Dado que o cenário de deterioração das expectativas de inflação já era claro, o erro do BCB foi optar pela liberdade em esperar novos dados, enquanto acelerar a normalização seria o movimento adequado”, afirmaram os economistas da instituição.
O BTG espera que, amanhã, o Copom eleve a taxa de juros em 1% e aguarda que a sinalização para setembro seja de mais 1%.
“Mais do que isso, a comunicação do BC precisa optar por menor liberdade e mais firmeza na condução da política monetária nas reuniões seguintes”, disseram os especialistas. Eles salientam que, na curva de juros, o mercado já precifica 7,75% para a Selic ao final deste ano.
Expectativa por acerto do Copom mantém esperança por inflação na meta
Na última reunião do Copom, as perspectivas para o IPCA no cenário base eram de 5,8% para 2021 e 3,5% para o ano que vem. Desde então, o ambiente apresentou algumas alterações. Isso refletirá, também, nas projeções para a inflação no cenário base.
Neste cenário, o mais relevante, para a XP, é o que projetar para 2022. A corretora menciona que, pelas expectativas apresentadas pelo Boletim Focus, uma aceleração no IPCA deste ano reduz a projeção do índice para o fim de 2022.
Uma inércia maior no reajuste, no entanto, pode acarretar em uma elevação de até 0,17 ponto percentual na inflação do ano que vem. Os especialistas ouvidos pelo Focus estimam um IPCA de 3,81% ao fim do próximo período.
A corretora trabalha com um cenário base de alta de 1 ponto percentual amanhã. “Esperamos que o comunicado justifique esta aceleração, focando no objetivo de ancorar as expectativas de inflação.”
A projeção para o fim do ano é de Selic a 6,75%. As expectativas inflacionárias e a percepção do risco fiscal são potenciais vetores de alta da taxa de juros.
Expectativas convergem para um consenso
O cenário do mercado para a reunião desta semana está convergindo para um consenso.
Após o Copom deixar a porta aberta para mais um aumento de 0,75 ponto percentual no último comunicado, as expectativas foram deterioradas e a maior parte dos especialistas esperam por um aumento de 1 ponto percentual no fim da tarde da próxima quarta-feira (4).
O Banco Original ampliou de 0,75% para 1% a projeção de alta desta reunião. Segundo a instituição, o avanço da vacinação está no radar do BC, o que potencialmente pode pressionar ainda mais a inflação.
Já o Goldman Sachs, que também enxerga a Selic em 5,25% após as reuniões, entende ser factível que a taxa de juros atinja um patamar acima do neutro. A linguagem do BC frente à inflação também deve ser mais dura, segundo o banco.
O UBS segue a tendência, esperando uma alta de 1%, em função de dois fatores específicos: crescimento econômico acima do esperado pelo BC e riscos de inflação maiores em 2022, por mais que as pressões atuais sejam consideradas temporárias.
A equipe econômica da Suno Research, por sua vez, também prevê uma alta de 1% na Selic nesta semana, puxada por uma “desancoragem das expectativas”. A grande questão que fica, segundo a casa de análise, é até onde vai o ciclo de alta da taxa de juros sem impactar a retomada econômica. Ainda não há essa resposta.
A visão da autoridade monetária é o melhor balizador do mercado para o desempenho da economia, uma vez que sai dali a política monetária que norteará o País nos próximos meses. No primeiro dia de reunião do Copom, o DI futuro para janeiro de 2022 sobe 0,87%, para 6,35%; de janeiro de 2023 avança 1,08%, para 7,93%.