Sobre escassez de recursos e de objetivos
Quem se dispõe a estudar economia é inicialmente apresentado ao conceito de escassez, base da teoria econômica, geralmente acompanhado da constatação de que os recursos são finitos e nossos desejos (ou necessidades) infinitos, implicando no desenvolvimento de funções utilidade, curvas de indiferença e outros cálculos que consideram as preferências dos agentes (pessoas como nós) nas tentativas de otimizar a alocação dos recursos.
Um erro comum aos que têm contato com a ideia pela primeira vez é pensar unicamente em necessidades materiais e tangíveis, o que simplificaria o problema. Porém, basta uma reflexão adicional para compreender que os bens materiais são meios para se obter bem-estar, este sim a finalidade da maioria das decisões que tomamos, muitas vezes de forma inconsciente. Obviamente, a quantidade de bem-estar desejável para uma sociedade ou indivíduo é infinita, ao contrário do bem-estar efetivamente experimentado. Lembro uma frase de Don Draper, personagem da série americana Mad Men: “Felicidade é um momento antes que você precise de mais felicidade”.
Uma vez que a conta de finito x infinito nunca fecha, fica evidente a importância de otimizar a utilidade dos recursos, dando origem aos problemas de alocação. Quem já se dispôs a realizar uma simulação básica com variáveis incertas conhece a dificuldade de estabelecer premissas realistas, principalmente quando o cálculo envolve longos horizontes de tempo. Há mais convicção dos agentes sobre o nível taxa de juros no mês que vem do que sobre a taxa de 5 anos no futuro, um dos motivos para os preços dos ativos financeiros oscilarem tanto, principalmente em economias como a nossa.
Da mesma forma, o nível de certeza sobre nossos desejos no dia de amanhã é bem maior do que a certeza sobre os desejos de daqui a 5 anos, o que é suficiente para muitos de nós tomarmos decisões financeiras irracionais, pensando apenas no curto prazo e ignorando a alta probabilidade de que o futuro não vá se resolver sozinho. No contexto econômico brasileiro, em que o custo de oportunidade (representado pelo CDI) por vezes supera o investimento no índice acionário, não fazer nada cobra um preço muito alto.
A teoria utilitarista considera que o julgamento de uma ação (boa ou ruim, certa ou errada) deve ser realizado com base nas consequências de tal ação, demandando uma avaliação correta das premissas e dos desdobramentos possíveis. Há certa discussão acadêmica sobre as diferenças entre o homo sapiens e o homo economicus (plenamente racional e sem vieses), este último geralmente predominante na literatura econômica clássica.
Independentemente da distância que nos separa do ser humano idealizado pela teoria, não há prejuízo em objetivar racionalidade na busca pela maximização do bem-estar. Mesmo que a felicidade real seja escassa, o processo de buscá-la deve implicar em consequências mais satisfatórias do que as causadas pelo acaso da probabilidade.
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