Divergência entre PNAD e Caged: Qual a direção correta do mercado de trabalho?
Como anda de fato o mercado de trabalho no Brasil, aparentemente no meio de uma avenida de mão dupla, no qual os dois principais indicadores do governo andam em vias opostas? Enquanto o Novo Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Novo Caged), do Ministério da Economia, sobe a ladeira, mostrando que a criação de empregos com carteira assinada vai bem sim senhor, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), desce ladeira abaixo, na banguela, mostrando que a taxa de desemprego é algo preocupante, se mantendo crescente.
De acordo com os dados do Novo Caged, o emprego com carteira assinada vem se recuperando de modo pleno e já até superou os níveis do período pré-pandemia – o que tem sido alardado pelo governo. Por outro lado, a Pnad sinaliza situação deplorável, indicando o aniquilamento de milhões de postos de trabalho formais em pouco mais de um ano. Para falar a verdade, mesmo eu, economista e estudiosa das metodologias do Novo Caged e da Pnad Contínua fiquei confusa ao analisar os resultados recentes de ambos os levantamentos. Imagino o cidadão comum…
Para o Novo Caged, o total de trabalhadores formais no Brasil correspondia a quase 40 milhões em fevereiro de 2020. Com o advento da pandemia, a partir de março de 2020, o exército de trabalhadores com carteira assinada recuou por quatro meses consecutivos até atingir 38 milhões em junho. No segundo semestre de 2020, o estoque nacional de empregos formais mudou a direção e passou a subir mês após mês. Em fevereiro deste ano, ao passar de 40 milhões de vagas, superou pela primeira vez o nível pré-pandemia, e ainda avançou por mais três meses até alcançar a marca de 40,5 milhões em maio– último dado disponível. Nos últimos dez meses, somente em um (dezembro de 2020) o saldo de contratações e demissões ficou negativo.
Na contramão, a Pnad Contínua, que trabalha com médias trimestrais, contabilizou 33,6 milhões de empregados formais com carteira assinada no setor privado no trimestre móvel encerrado em fevereiro de 2020. Esse total despencou até os 29 milhões no trimestre encerrado em agosto, voltando a subir por alguns meses, mas recuando novamente nas últimas cinco divulgações, chegando à média de 29,6 milhões de vagas no relatório mais recente, referente ao trimestre findo em abril deste ano. Dessa maneira, na comparação entre o último dado do período pré-pandemia (fevereiro de 2020) e o número mais recente indica: a geração acumulada de cerca de 500 mil postos formais de trabalho, conforme o Novo Caged (até maio de 2021); e o fechamento algo em torno de 4 milhões de vagas com carteira assinada, pela medição da Pnad Contínua (até abril de 2021). Em qual pesquisa devo acreditar?
Aí pergunta-se, mas o mercado de trabalho não vai bem quando a economia vai bem e vice-versa? Sim e não, para deixar essa história ainda mais confusa. Siga o meu raciocínio: a criação de vagas formais apontada pelo Novo Caged nos últimos meses deste ano de 2021 efetivamente condiz com o crescimento do Produto Interno Bruno (PIB), contudo, essa correlação positiva entre PIB e mercado de trabalho não se confirma em 2020. No ano passado, o Novo Caged registrou a criação líquida de mais de 140 mil empregos, ao passo que o PIB anual encolheu 4,1%, no pior resultado em três décadas. A Pnad Contínua, por sua vez, caminhou alinhada à queda do PIB no ano passado, contabilizando o encerramento de 3,8 milhões de vagas formais. Em 2021, porém, os dados do emprego com carteira divulgados pela pesquisa vão mais uma vez na contramão do desempenho da atividade econômica. E aí… continuamos sem uma resposta!
A culpa de tal disparate está na metodologia, para variar. Os dados do Novo Caged são informados pelas empresas. Assim um dos problemas do Novo Caged seria a subnotificação dos desligamentos, muito por conta de atraso na prestação de informações por parte das empresas. Problema esse que pode ter tomado maiores proporções com a pandemia, que fez com que muitas empresas fechassem as portas e deixassem de prestar informações ao sistema oficial de dados. Já no caso da Pnad a coleta de dados é realizada por meio de questionários junto às famílias, que informam se estavam ou não empregadas. Com a pandemia, a coleta de dados, que era feita por meio de entrevistas presenciais, passou a ser por telefone, e o número de respondentes diminuiu – o que pode ter lesado a qualidade da amostra.
Para resumir a história, antes dessa coluna virar um tratado científico, gostaria de deixar aqui registrado que os dois levantamentos, tanto a PNAD como o Novo Caged têm potenciais problemas metodológicos que dificultam termos uma visão límpida e transparente sobre o que de fato está acontecendo no mercado de trabalho. Temos aqui apenas algumas impressões, alguns sentimentos a despeito do andar da carruagem no mercado de trabalho. Após me debruçar sobre os números e metodologias, consigo lhe dizer apenas que não há pesquisa melhor ou pior. São dois levantamentos distintos que não nos permite dizer em pé anda o emprego com carteira assinada. Um indicador alternativo do mercado do trabalho, elaborado por economistas do Itaú, mostra que o emprego formal ficou 1% abaixo do nível pré-Covid em março e que está agora 0,4% abaixo desse patamar em abril. Ele também mostra que o desemprego fechou em 14,1% em março, contra 14,7% dos dados oficiais. Sondagens alternativas também feitas pela FGV apresentam um cenário um tão quanto similar ao do Itaú: o ímpeto de contratações não está tão negativo quanto indica a Pnad, nem tão positivo quanto aponta o Novo Caged.
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