Camila Nasser

No Venture Capital brasileiro falta o “Made in Brazil”

Precisamos parar com a síndrome de vira-lata, e fomentar um ecossistema de Venture Capital que de fato dialoga com o contexto do país

A indústria de Venture Capital brasileira se consolidou nos últimos anos como um espelho do que ocorre nos Estados Unidos, especialmente no Vale do Silício. Desde o próprio nome do mercado – VC -, que no Brasil seria o Capital de Risco – até jargões como “valuation” para se referir a valor do negócio, “founder” para se referir aos fundadores, e os diferentes estágios de aporte “pre-seed to Series F”, o mercado brasileiro incorporou a dinâmica americana para investimento em startups (opa, mais um termo gringo) com a tese de multiplicação de várias vezes o capital investido.

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Mas o Brasil não é os Estados Unidos (obviamente, Sherlock Holmes) e precisamos entender as diferenças e nuances de ambos os países para a consolidação de um mercado sólido e independente.

Nos EUA, o investidor tem um relacionamento especial com o capital: as baixas taxas de juros aproximam os investidores do mercado de ações: mais de 55% da população americana investe na bolsa e uma pesquisa realizada pelo Bank of America apontou que 80% dos jovens investidores estavam olhando para investimentos alternativos.

Do lado do empreendedorismo, este artigo sobre como o Vale do Silício foi formado narra com riqueza de detalhes o fomento à inovação enraizado na cultura das Universidades americanas, com apoio de capital governamental e filantrópico para tal. Somado à maior segurança regulatória, temos um ambiente propício para, de um lado, empreendedores inovarem em novos mercados e, por outro lado, investidores se arriscarem a financiar tais inovações.

Aqui no Brasil, nosso mercado de capital de risco está em outro patamar: lidamos com taxas altíssimas de juros e inseguranças regulatórias e tributárias. Estamos começando a desenvolver a educação empreendedora dentro de algumas universidades, porém, sem os endowments e apoio a pesquisas que os gringos têm.

De acordo com um levantamento da ACE, o ecossistema brasileiro precisaria de, ao menos, 15 vezes mais investimento nos estágios iniciais para alcançar o mercado americano. E enquanto 43% das empresas listadas nas bolsas americanas foram investidas por VC, no Brasil a taxa é menor que 2%.

Por que, então, replicamos o modelo americano para o nosso capital de risco?

Valuations

Imitamos os valores de captação e precificação de startups americanas, apesar de não termos o mesmo mercado endereçável e potencial de crescimento/retorno.

Crescimento dos negócios

A metodologia de blitzscaling (crescimento a qualquer custo) do Vale do Silício, que leva startups a captarem cheques gordos, não pode ser o padrão brasileiro – nossa oferta de capital é mais escassa, e portanto as startups precisam de premissas de crescimento mais sólidas, que dependam menos de capital externo.

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Vias de saídas

Se 98% das empresas que passam pelo VC no país não abrem o capital na bolsa, as teses de saída (exits) dos investidores precisam ser readequadas, junto com as premissas de rodadas futuras.

Perfil dos empreendedores

Importamos dos norte-americanos a premissa de que os melhores empreendedores virão das universidades mais renomadas, ou de experiências prévias em bancos ou consultorias. O pedigree de ter estudado em faculdades Ivy League como Harvard, MIT e Columbia exclui mais de 99% da população brasileira, e cria uma bolha de oportunidades que não condiz com a realidade local

O Brasil é o lar de mais de 203 milhões de pessoas, mais de 20 milhões de empresas. Somos a nona maior economia do mundo, país do Pix e da mais importante floresta tropical. Precisamos parar com a síndrome de vira-lata, e fomentar um ecossistema de Venture Capital que de fato dialoga com o contexto do país.

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Nota

Os textos e opiniões publicados na área de colunistas são de responsabilidade do autor e não representam, necessariamente, a visão do Suno Notícias ou do Grupo Suno.

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