Luciano Fantin

Riscos sociais, ambientais e climáticos

Políticas de responsabilidade socioambiental: instituições ainda estão aprendendo sobre o tema, especialmente sobre o relatório periódico e outros documentos específicos que foram criados em 2014 pelo CMN

As políticas de responsabilidade socioambiental das instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central não são um assunto recente, tendo sido regulamentadas em 2014 pelo CMN (Conselho Monetário Nacional). Mesmo assim, as instituições ainda estão aprendendo sobre o tema, especialmente sobre o relatório periódico e outros documentos específicos que foram criados desde então.

https://files.sunoresearch.com.br/n/uploads/2022/03/Ebook-Investindo-para-a-Aposentadoria-1.jpg

As exigências da regulamentação para as fintechs são as mesmas no que diz respeito às Instituições de Pagamento (IPs), Sociedades de Crédito Direto (SCDs) e Sociedades de Empréstimo entre Pessoas (SEPs), apesar de alguns temas estarem em normativos diferentes e de outros serem válidos para todos os três veículos legais. No caso de IPs, é importante ressaltar que a regulamentação só atinge as que integram conglomerados prudenciais do tipo 3.

Nos tópicos seguintes, vamos examinar a sopa de letrinhas das medidas e normas relativas às políticas socioambientais.

RSAC: Responsabilidade social, ambiental e climática

A RSAC engloba governança, processos e controles no que tange ao ambiente interno e externo da instituição, para gestão dos riscos social, ambiental e climático.

PRSAC: Política de responsabilidade social, ambiental e climática

A PRSAC é o conjunto de princípios e diretrizes de natureza social, ambiental e climática a ser observado pela instituição na condução dos seus negócios, atividades e processos, bem como na relação com as partes interessadas.

Em termos de governança, um comitê de responsabilidade social, ambiental e climática deve ser constituído e vinculado ao conselho de administração. Ele é de natureza obrigatória para as instituições do segmento 2 (S2)1 e facultativa para os demais. Sua composição deve ser divulgada no site da fintech, e suas atividades devem ser coordenadas com o comitê de riscos.

As atribuições do comitê de responsabilidade social, ambiental e climática são:

  • Propor recomendações ao conselho de administração (ou diretoria executiva) sobre o estabelecimento e a revisão da PRSAC;
  • · Avaliar o grau de aderência das ações implementadas à PRSAC e, quando necessário, propor recomendações de aperfeiçoamento;
  • · Manter registros das recomendações.

GRSAC: Relatório de Riscos e Oportunidades Sociais, Ambientais e Climáticas

As instituições dos segmentos S1 a S4 ou de conglomerado do tipo 3 devem divulgar anualmente o relatório GRSAC, com data-base de 31 de dezembro, até 90 dias depois desta.

O GRSAC deve conter as seguintes informações:

  • Governança do gerenciamento do RSAC, incluindo as atribuições e as responsabilidades das instâncias envolvidas, como o conselho de administração, quando existente, e a diretoria da instituição;
  • Impactos reais e potenciais, quando considerados relevantes, do RSAC nas estratégias adotadas pela instituição nos negócios e no gerenciamento de risco e de capital nos horizontes de curto, médio e longo prazos, considerando diferentes cenários, segundo critérios documentados;
  • Processos de gerenciamento dos riscos.

DRSAC: Documento de Risco Social, Ambiental e Climático

O DRSAC é um documento de periodicidade semestral, denominado Cadoc 2030. Suas informações devem estar de acordo com a PRSAC e a data-base do último dia de junho e de dezembro.

Estão sujeitas a essa exigência as instituições financeiras autorizadas dos segmentos 1 a 4 (S1 a S4), bem como todos os conglomerados prudenciais liderados tanto por instituições financeiras dos segmentos 1 a 4 (S1 a S4) quanto por IPs, do tipo 3, dos segmentos 2 a 4 (S2 a S4).

As informações a serem prestadas referem-se à avaliação dos riscos social, ambiental e climático, das exposições em operações de crédito e a títulos e valores mobiliários, e dos seus respectivos devedores, compreendendo:

  • Identificação;
  • Setor econômico;
  • Agravantes e mitigadores do risco;
  • Saldo devedor
  • Avaliação do risco social;
  • Avaliação do risco ambiental
  • Avaliação do risco climático;
  • Informações sobre o enquadramento da exposição aos conceitos de natureza social, naturez ambiental e natureza climática definidos na regulamentação em vigor relativa à PRSAC;
    · Informações sobre a emissão, neutralização e absorção dos gases de efeito estufa;
  • Localização.

Estrutura de gerenciamento, mecanismos e atividades exigidas

De uma maneira resumida, as fintechs são obrigadas a criar uma estrutura de RSAC, incluindo sua PRSAC, e a reportar 1) o GRSAC, ao mercado; e 2) o DRSAC (Cadoc 2030), ao BC. Além disso, deve-se apontar um diretor responsável pelo assunto junto ao Banco Central.

A exigência regulatória é, portanto, pesada e detalhada. Quando se fala em RSAC, o foco não são as questões apenas vinculadas à fintech em si, mas também – e talvez principalmente – com quem ela se relaciona.

Imagine sua IP provendo contas e serviços a um cliente envolvido com trabalho em condições análogas à escravidão. Ou sua SCD financiando uma empresa que é condenada por poluição irregular, ilegal ou criminosa do ar, das águas e do solo. Ou sua SEP envolvida em projetos que impactem negativamente a reputação da instituição, como não contribuir com a transição para uma economia de baixo carbono. Esses exemplos, trazidos mais à frente, são caracterizados pelo Bacen como eventos de risco
para sua fintech.

A regulação do CMN e do Bacen prevê que as fintechs adotem mecanismos para identificação e monitoramento dos riscos social, ambiental e climático.

As atividades devem contemplar:

  • Identificação, avaliação, classificação e mensuração dos riscos social, ambiental e/ou climático com base em critérios e informações consistentes e passíveis de verificação, incluindo informações de acesso público;
  • Registro de dados relevantes para o gerenciamento, incluindo, quando disponíveis, dados referentes às perdas incorridas pela instituição, discriminadas, conforme o caso, em risco social, ambiental e/ou climático e com respectivo detalhamento de valores, natureza do evento, região geográfica (definida com base em critérios claros e passíveis de verificação) e setor econômico associado à exposição;
  • Identificação tempestiva de mudanças políticas, legais, regulamentares, tecnológicas ou de mercado, incluindo alterações significativas nas preferências de consumo, que possam impactar de maneira relevante o risco social, ambiental e/ou climático incorrido pela instituição, bem como procedimentos para a mitigação desses impactos;
  • Monitoramento de concentrações de exposições a setores econômicos ou a regiões geográficas, definidas com base em critérios consistentes e passíveis de verificação, mais suscetíveis a sofrer ou causar danos sociais, ambientais e/ou climáticos, e, quando apropriado, estabelecimento de limites para essas exposições;
  • Identificação tempestiva de percepção negativa de clientes, do mercado financeiro e da sociedade em geral sobre a reputação da instituição, quando essa percepção possa impactar de maneira relevante o risco social, ambiental e/ou climático por ela incorrido;
  • Realização de análise de cenários, no âmbito do programa de testes de estresse, que considerem hipóteses de mudanças em padrões climáticos e de transição para uma economia de baixo carbono.

Num mundo globalizado, a velocidade e a capacidade integrativa dos mercados mitigam as distâncias geográficas, e um exemplo recente disso foi a matéria “Britânicos querem barrar listagem da JBS (JBSS3) nos EUA”, publicada pelo Valor Econômico (2024). Parlamentares do Reino Unido pressionaram a Securities and Exchange Commission (SEC), órgão regulador do mercado de capitais nos Estados Unidos, para bloquear a listagem da JBS, a maior fornecedora de carne do mundo, na Bolsa de Nova York. A alegação era que a listagem da empresa nos EUA ameaçaria os esforços para reverter as mudanças climáticas.

A questão da RSAC é um caminho sem volta. Talvez o tema não esteja ainda tão desenvolvido no Brasil como em outros países, no que se refere às instituições do mercado financeiro e de capitais.

https://files.sunoresearch.com.br/n/uploads/2023/04/1420x240-Planilha-vida-financeira-true.png

Nota

Os textos e opiniões publicados na área de colunistas são de responsabilidade do autor e não representam, necessariamente, a visão do Suno Notícias ou do Grupo Suno.

Luciano Fantin
Mais dos Colunistas
Luciano Fantin Fintechs: uma grande revolução 

Estamos vivendo uma revolução, uma mudança de paradigmas. É um privilégio podermos fazer parte de um momento que futuramente será provavelmente estudado como uma grand...

Luciano Fantin
Luciano Fantin As potenciais consequências da não conformidade regulatória em fintechs 

Sua fintech deve trabalhar sempre com o intuito da plena conformidade legal e regulatória, e alinhada às melhores práticas de mercado. Não obstante isso, podem haver p...

Luciano Fantin

Compartilhe sua opinião

Receba atualizações diárias sobre o mercado diretamente no seu celular

WhatsApp Suno