Materialidade é aspecto fundamental do ESG
A crise decorrente da pandemia ressignificou o termo ISR, Investimento Socialmente Responsável (ou SRI em inglês). O European Sustainability Forum (Eurosif) define o ISR como um processo de investimento que associa objetivos financeiros com valores que estariam relacionados à preservação ambiental, impactos sociais e questões de governança.
O ISR insere-se em um contexto de transição de mindset do mercado de capitais que passa a buscar a prática de um capitalismo mais consciente. Esse movimento ganhou relevância nas décadas de 60 e 70, com o surgimento de movimentos antiguerra e a maturidade de movimentos como igualdade racial, direito das mulheres, proteção dos consumidores e do meio ambiente.
Nesse sentido, ao lado da já estabelecida linha de investimento socialmente responsável, tem-se a análise ESG que empreende um esforço para avaliar a materialidade de dados não contábeis, para determinar quais companhias estão mais bem preparadas para competir em um mundo com disponibilidade de recursos naturais cada vez mais escassos, crescimento populacional e mudanças climáticas. Em resumo: entender quais companhias têm melhor capacidade de geração e proteção de valor, no médio e longo prazo, a ao longo de sua cadeia de valor.
A análise de materialidade, aspecto essencial, tanto da implementação de medidas ESG quanto da avaliação ESG, é um processo que consiste na apuração da relevância de temas para os negócios da companhia, considerando sua conexão com as operações da empresa, bem como seus impactos, positivos e negativos para o negócio.
A relevância de tópicos materiais varia entre indústrias, setores, e empresas, aspecto que não pode ser desconsiderado nem na análise financeira da empresa nem no planejamento corporativo onde adaptações e estratégias precisam se embasar em conhecimentos sólidos de temas e contextos diversos e, principalmente, o entendimento de sua materialidade para o resultado financeiro da empresa.
Para que seja possível avaliar o desempenho de uma empresa, e sua viabilidade para compor uma carteira de investimentos, é preciso que as informações digam respeito a temas materiais e que estes dados sejam comparáveis de alguma forma, entre si. Além da materialidade, profissionais do mercado financeiro, cobram consistência, precisão e comparabilidade nas informações relatadas, um dos grandes desafios do ESG já que não há consensos sobre métricas e indicadores
Do lado do negócio, para que seja possível identificar e endereçar os principais impactos que determinada atividade econômica gera, de modo que, efetivamente, a companhia construa um resultado sustentável, o processo de análise de materialidade é fundamental. Isso envolve conhecer profundamente a matriz de riscos corporativos, os relatórios de satisfação dos clientes, a avaliação de pares de mercado, além de referências padronizadas como a SASB e a GRI. São elementos que apoiam o processo de definição de materialidades, de modo que as companhias possam construir seu resultado de forma transparente e ética, entendendo os riscos corporativos e definindo o seu planejamento estratégico.
Para as empresas, mapear materialidade significa estabelecer prioridades. Afinal, o processo de levantamento de materialidades deve ocorrer com alguma regularidade. As organizações precisam atualizar seus critérios a partir da evolução de cenários sociais, ambientais e do negócio, conduzindo, inclusive, pesquisas e consultas com stakeholders.
A diversidade de categorias de stakeholders consultados enriquece o processo, resultando em uma variedade de temas que refletem as diferentes perspectivas. A escolha das organizações e stakeholders a incluir na análise exige um esforço hercúleo pelo fato de os impactos gerados por uma empresa estarem vinculados a um emaranhado de entidades que compõem a cadeia de valor do produto/serviço.
Relatar as iniciativas e resultados das práticas ESG é uma questão de transparência e prestação de contas, mas precisa fazer sentido e é aí que entra a materialidade. À medida em que a discussão avança, representa também a incorporação de demandas e preocupação do mercado e da sociedade. Um exemplo é o conceito da dupla materialidade – que considera o impacto da sustentabilidade sobre a performance financeira de longo prazo da empresa bem como sobre a sociedade e o meio ambiente. Nesse sentido, especialistas da SASB, citados pelo Financial Times, reforçam a importância de entender o público que se visa ao reportar sobre sustentabilidade, ESG.
Enquanto as empresas não tiverem clareza sobre os fatores sociais e ambientais que realmente importam para seu negócio, não terão condições de avaliar sua atuação ESG nem a sustentabilidade de seu negócio.
Deborah C. Batista e Luciana Lanna são, respectivamente, administradora e gerente de projetos, especialista em sustentabilidade; advogada, especialista em direito ambiental e responsável pela área de sustentabilidade do Lemos Advocacia para Negócios.
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