Constatação prévia: equilíbrio entre o uso da recuperação judicial e a proteção a possíveis fraudes
A recente decisão judicial que suspendeu o processo de recuperação judicial da 123 Milhas no Tribunal de Justiça de Minas Gerais levanta questões cruciais no contexto econômico e jurídico que pautaram as reformas recentes na legislação – assumindo ainda maior relevância no debate público com o aumento dos pedidos de Recuperação Judicial observados, especialmente, ao longo deste ano.
O recurso que motivou a suspensão apresentado pelo Banco do Brasil (BBAS3) argumenta que as empresas em recuperação não apresentaram a totalidade dos documentos exigidos pela Lei de Recuperação Judicial e que os documentos não estariam em conformidade com as prescrições legais, prejudicando a análise dos credores e demais interessados. Além disso, o Banco argumentou a complexidade do caso, com centenas de milhares de credores e uma movimentação financeira significativa, o que exige uma abordagem mais minuciosa – e no caso levaria, na linha defendida, a impossibilidade do regular processamento da Recuperação Judicial.
A esse respeito, por sua vez, a instância judicial pautou sua decisão na preservação da empresa, sem ignorar que esse ideal não pode ser alcançado às custas da adequada proteção dos direitos dos credores.
Optou-se, portanto, pela suspensão temporária do processo de recuperação judicial para permitir que uma avaliação técnica seja conduzida, nos termos do Art. 51-A da Lei de Recuperação Judicial, introduzidos formalmente em nosso ordenamento em 2020, para que seja realizada a etapa de Constatação Prévia.
A utilização desse mecanismo representa importante passo para uma análise cautelosa sobre a capacidade da empresa recuperanda em alcançar os objetivos da Recuperação Judicial, especialmente em um caso de grande complexidade, em que os valores envolvidos são expressivos e o número de credores é considerável – sem considerar a complexidade tecnológica inerente ao escopo de atuação da 123 Milhas, em específico.
Essa etapa também é relevante para verificar se as empresas atendem aos requisitos para o pedido de recuperação judicial e se há indícios de abuso de direito ou cometimento de fraudes. No caso da 123 Milhas, a suspensão da Recuperação Judicial manteve o denominado stay period, protegendo a empresa de ações e execuções de credores.
Importante destacar, portanto, que essa suspensão, por si só, não significa o fim da recuperação judicial.
Ao contrário, é uma medida que visa garantir que o processo seja conduzido de forma adequada e pautado na legalidade. Caso a constatação prévia seja favorável à recuperação, o processo poderá ser retomado.
Os textos e opiniões publicados na área de colunistas são de responsabilidade do autor e não representam, necessariamente, a visão do Suno Notícias ou do Grupo Suno.
Usada como instrumento jurídico para dar sobrevida a empresas que estão em situação financeira delicada, o recurso à Recuperação Judicial vem se expandindo no Brasil e...
Após anunciar o rombo fiscal de mais de vários bilhões e entrar em recuperação judicial, a Americanas possui um grande desafio que é tentar se reestruturar e se reergu...