Semelhanças entre o comportamento do consumidor e do investidor
O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de outubro de 2023 revelou um aumento de 6,09% nos preços dos aparelhos de ar-condicionado no Brasil, em contraste com a variação global de apenas 0,24%. Essa é a maior inflação registrada para o produto desde outubro de 2020, quando houve um aumento significativo de 10,54%. Este aumento pode ser explicado principalmente pela maior demanda com a onda de calor registrada na região sudeste do Brasil, e a oferta um pouco mais limitada devido às secas do Rio Amazonas que dificultaram o escoamento do produto vindo à Zona Franca de Manaus.
O Google Trends mostra que as pesquisas na internet utilizando o termo “ar condicionado” (sem o hífen) sugere um aumento abrupto coincidente com a recente onda de calor no final de outubro de 2023 (figura abaixo).
Provavelmente, aqueles interessados em adquirir um ar-condicionado ou procurar serviços de manutenção estão reconsiderando seus planos devido aos preços elevados. Muitos estão refletindo sobre a necessidade de ter planejado essa compra antes da chegada do verão. A verdade é que realmente existe um componente sazonal muito forte no interesse das pessoas por um ar-condicionado. É o que sugere o gráfico abaixo, que mostra as buscas no Google Trends desde 2004.
Por outro lado, disrupções mais bruscas na cadeia de produção e variações abruptas nos preços são invariavelmente imprevisíveis.
A pergunta que estou interessado em discutir é: por que as pessoas esperam justamente o verão se aproximar para a aquisição ou manutenção de um ar-condicionado?
A resposta é composta por vários fatores como:
1) os aparelhos são mais utilizados durante o verão, portanto estão mais sujeitos a falhas e necessitam mais manutenção;
2) priorização de gastos, assim a compra de um ar-condicionado não é considerado um artigo urgente em períodos com temperaturas mais frias;
3) marketing mais agressivo das lojas com a aproximação do verão;
4) falta de planejamento;
5) o consumidor enxerga mais valor no produto durante o verão pelo conforto que ele proporciona em períodos quentes.
Dentre os fatores listados acima, acredito que os três últimos podem ser considerados eventos causativos mais associados ao comportamento do consumidor, e talvez, menos racionais do ponto de vista financeiro.
Transpondo esse exemplo para o universo dos investimentos, também temos alta ciclicidade nos preços de ativos financeiros que variam fortemente durante os ciclos de expansão e contração da atividade econômica. Esses ciclos envolvem variações no PIB, emprego, investimentos, entre outros indicadores econômicos. Uma leitura simplificada do ciclo econômico pode ser feita por meio da observação da taxa de juros referencial de uma economia.
De forma simplificada, altas taxas de juros estão associadas a períodos de contração econômica, quando as empresas contratam menos, enxugam os investimentos e acabam tendo resultados mais fracos, distribuindo menos dividendos aos seus acionistas. Nesses períodos, os investidores tendem em alocar seu capital na renda fixa e evitar a renda variável, que apresenta descontos mais elevados. Por outro lado, taxas de juros mais baixas estimulam a expansão econômica pois facilitam o crédito às empresas, que elevam os investimentos e abrem mais vagas de emprego devido à aceleração de suas operações, gerando mais crescimento e maiores lucros para os acionistas. Neste cenário, os investidores tendem pela alocação de grande parte de seus recursos em renda variável causando uma elevação nos preços dos ativos.
Acontece que, de maneira análoga ao consumo sazonal de ar-condicionado, a maioria dos investidores espera comprar ativos de renda variável durante o “verão” econômico, ou seja, em períodos de expansão econômica. É justamente quando a busca por ativos de renda variável cresce rapidamente e os preços explodem. Da mesma forma que precisamos ter melhor planejamento, evitar a impulsividade e buscar um comportamento racional na compra de um ar-condicionado, o mesmo pode ser dito na hora de comprar ativos de renda variável. Devemos criar um mindset de ser contrário à manada, comprar ativos de renda variável quando a demanda por esses ativos está baixa e considerar uma redução da compra quando o mercado estiver demandando fortemente esses ativos.
É importante entender que os ciclos econômicos podem durar muitos anos, o que deixa os investidores individuais bastante apreensivos sobre a manutenção de uma estratégia contrária à manada. Por isso é imperativo desenvolver o hábito da leitura e aprender os conceitos básicos de economia para navegar corretamente os ciclos econômicos como investidor. Só assim poderemos ter consciência e evitar os vícios mais comuns do investidor individual.