João Beck

O ser humano não foi feito para investir

Proteger sua carteira de uma pandemia ou uma guerra beira o impossível

Nós sobrevivemos como espécie por conta de instintos que dão um baita prejuízo quando aplicamos no universo de investimentos.

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O principal instinto é nossa capacidade de reação rápida ao primeiro sinal de perigo. Na natureza é o que nos diferencia. Mas na tela do home broker é a receita do desastre.

Os hormônios ativados no homo economicus quando a bolsa cai são os mesmos que nossa versão pré-histórica na presença de um predador, como um leão.

Ao ler a biografia dos grandes investidores, percebemos uma forma de lidar com o risco bem diferente do usual. Eles convivem com o leão. Dormem na mesma caverna. Se alimentam juntos e domesticam o animal. É assim que eles lidam com risco. Eles não fogem. A presença do predador é o ingrediente necessário para retornos extraordinários.

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Proteger seus investimentos não tem nada de errado. O problema é que seu desejo de proteção só irá surgir quando todos estiverem fazendo o mesmo num efeito manada.

E nas crises, o conceito de proteção vira uma classe de ativo como qualquer outra que oscila livremente às emoções do mercado. Ela fica cara. E especialmente a proteção que deriva de uma notícia ruim reage bem mais rápido do que uma notícia boa. A aversão ao risco provoca uma trajetória abrupta e exponencial no preço das proteções, enquanto uma notícia positiva leva mais tempo para ser incorporada aos preços.

Proteção é um conceito amplo. Cada crise tem a sua. Nessa guerra, por exemplo, podem se tratar de derivativos que atuam como seguros de quedas de bolsa ou simplesmente a compra de ativos ligados à commodities, energia e alimentos. Podem ser também a aposta de mais inflação no mundo via operações em favor de maiores altas de taxa de juros ou até a aposta na desvalorização de moedas de determinados países.

A proteção fica tão cara que chega a um nível em que mesmo se protegendo e a guerra piorar, você perde dinheiro.

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E o mercado reage mais rápido à guerra do que na crise anterior da Covid. Essa guerra foi incorporada aos preços mesmo antes de acontecer.

Ao longo dos últimos meses, o mercado tratava o evento como improvável e de resoluções diplomáticas, com razão, porque foi o que ocorreu no passado recente. Mas, diferente da pandemia, o mercado já começou a se proteger semanas antes. Isso ficou evidente desde o sobrepreço dos contratos de derivativos de diversas classes de ativos até a disparada do preço do petróleo e derivados. O Rublo já vinha se desvalorizando há semanas.

Essa proteção antecipada teve motivos:

1) Guerras e conflitos armados são mais frequentes na história. A última pandemia global foi em 1918.
2) A guerra foi escalando ao longo das semanas.
3) São mais sabidas e fáceis de prever as consequências econômicas desse evento. Mesmo que não exatamente sua magnitude, mas pelo menos em sua direção.

Não sabemos o quanto a moeda russa irá se desvalorizar, mas sabemos que vai. Na crise anterior da pandemia, mal acertamos a direção de alguns índices.

Achávamos que a desaceleração global resultado pela pandemia derrubaria commodities. Elas subiram.

Achávamos que a crise seria desinflacionária. Quando a inflação nos provou o contrário, mudamos o discurso e dissemos que pelo menos a inflação seria temporária. Não foi.

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Na pandemia, coisas que achávamos que ia cair, subiram e vice-versa.

  • Nessa guerra, não. O framework para analisar uma guerra já existe e funciona bem. O rublo se desvalorizou e vai continuar assim conforme a guerra escale e volta a se valorizar conforme surja alguma resolução no horizonte. Proteger carteiras não tem nada de errado, só tem de difícil. Fazê-la após algum evento já estourou é como, dizem, “fechar a porta do canil com o cachorro ao lado de fora.”

A proteção mais barata é a diversificação. E nesses momentos (se você tem uma carteira diversificada) o melhor é não fazer nada.

Infelizmente, você não vai ler um livro sobre uma grande lenda dos investimentos que não fez nada porque seria um livro em branco.

No pior fim de semana da história da economia americana, Warren Buffett descansava num resort do Canadá. Foi o fim de semana da quebra do Banco Lehman Brothers que quase levou a economia ao mesmo buraco de 1929. Tivesse virado um filme, certamente seria um fracasso de bilheteria, sem emoção e sem heróis.

Como diz o primeiro americano a ganhar o Prêmio Nobel de Economia, Paul Samuelson: “Investir é como ver a tinta da parede secar ou ver a grama crescer. Se você quer adrenalina vá para Las Vegas”.

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Nota

Os textos e opiniões publicados na área de colunistas são de responsabilidade do autor e não representam, necessariamente, a visão do Suno Notícias ou do Grupo Suno.

João Beck

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