COE promete capital protegido, mas tem perda real e gordas comissões

Em busca de retornos consistentes na Bolsa, investidores recorrem a diferentes tipos de estratégias e produtos. No entanto, é preciso cautela e estudo antes de alocar seu dinheiro em determinados ativos que, muitas vezes, prometem ótimos resultados, mas não entregam. “A segurança de uma renda fixa, com a valorização da renda variável” pode parecer música aos ouvidos dos mais desatentos. Essa propaganda, porém, muito utilizada para enaltecer o COE (Certificado de Operações Estruturadas), esconde um produto de altas taxas, baixa liquidez e até prejuízo real.

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Um dos mais oferecidos por corretoras, assessores de investimentos e agentes do mercado de capitais em geral, o COE é um produto financeiro que une, de forma estruturada, operações de renda fixa, como títulos públicos, com uma operação em renda variável, como ações.

O produto é apresentado pelos agentes do mercado como uma alternativa viável para as pessoas que têm muita aversão a riscos, mas que desejam expandir seu capital por meio do mercado financeiro.

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De forma simples, ao investir em um COE, o investidor compra um mix com uma parte pequena de derivativos de um ativo ou um índice específico e o restante em renda fixa.

“A rigor o COE é estruturado como um ativo que tem variação de índice, como um S&P 500, por exemplo. Então você compra um derivativo desse índice e coloca isso em uma cesta, com 85% geralmente da cesta, em uma renda fixa. É essa renda fixa que vai garantir o patrimônio”, disse Elias Wiggers, analista da EQI.

Esses indexadores podem ser:

  • Ações e índices de ações
  • Commodities
  • Índices de inflação
  • Juros
  • Moedas
  • Ouro

Assim, é possível ter exposição a moedas (como dólar, euro, etc.), índices (como o S&P 500, por exemplo) ou ações (Google, Facebook, Nike, entre outras famosas) sem precisar comprar os ativos específicos.

Apesar de conhecido entre investidores, o COE é, de certa forma, relativamente novo no mercado, dado que a regulamentação do COE só entrou em vigor em 2014, ganhando mais ofertas a partir de 2016 e 2017.

Mesmo assim, o produto só cresce. De acordo com dados da Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiros e de Capitais), o mercado de COEs no país cresceu 180% em cinco anos.

Se a captação desse produto foi de R$ 6,664 bilhões em 2015, o número fechou o ano passado em R$ 18,668 bilhões.

Para Virginia Prestes, professora de finanças da FAAP, o COE registra altas tão expressivas graças à facilidade que entrega ao investidor.

“É uma maneira de acessar um mercado volátil sem ter risco de perda do principal capital investido. Alguns COEs até pagam taxa fixa, outros abrem oportunidade para que os investidores acessarem mercados internacionais”, afirmou

“Então é interessante pois você está investindo em algo simples, barato, já que o preço está todo embutido na taxa do COE, e não ter um custo adicional por isso”, completou ela.

Capital protegido?

Apesar da promessa de capital protegido pelos COEs mais comercializados no mercado, não é exatamente o que ocorre.

O analista de sistemas José Victor Sanchez, 27, decidiu investir em um COE por tentar proteger seu capital de qualquer maneira e, se possível, ainda ganhar com uma cesta de ações do exterior.

Ao comprar o COE por três anos, no entanto, ele não imaginou que, no término do período, o valor de R$ 5 mil investidos retornaria, mas sem lucro algum.

“Acabou que foi um prejuízo, né? Já que protegeu nominalmente o meu investimento, mas o valor real, descontado a inflação, eu perdi. Isso sem contar o custo de oportunidade, que eu poderia ter alocado em outro produto e rendido um bom dinheiro nesse tempo”, disse.

A taxa de juros nominal é a taxa que se encontra expressa em contratos das aplicações financeiras. Já a taxa de juros real é quanto, realmente, um investidor lucrou em uma aplicação financeira em um mesmo período de tempo, já descontada da inflação no mesmo período.

Além da diferença entre rendimento real e nominal, para Virginia Prestes, a falta de liquidez também é um dos problemas para quem investe em COE.

“Normalmente, eles têm um período mais longo e não tem liquidez, apesar de haver um mercado secundário, há uma penalidade a ser paga muito grande para sair. Se ela entrar, tem que comprar um COE pensando em levar até o vencimento”, afirmou Prestes.

Ciência refuta o COE

Os dados também provam que o COE é um mau negócio para o investidor. Um estudo realizado por pesquisadores da FGV (Fundação Getúlio Vargas) mostrou que cerca de 90% dos COE foram vendidos aos investidores de varejo com retorno esperado abaixo da taxa livre de risco.

De acordo com a publicação, 252 dos 284 COEs, que foram vendidos aos investidores de varejo entre 2016 a 2020 tiveram retorno abaixo da taxa livre de risco, ou seja, da Selic.

Entre os 50 principais COEs oferecidos, o retorno médio esperado era de 5,98% ao ano. Mas o retorno em excesso (o retorno esperado do COE menos o retorno de um título público com a mesma maturidade) médio é de -3,36%, sendo -10,94% o mínimo e, apenas, 0,88% ao ano no máximo.

Já entre os demais 234 COEs distribuídos por uma grande corretora entre 2019 e 2020, o retorno em excesso foi de -2,01%, enquanto o mínimo foi de -5,32% e o máximo de 3,0% ao ano.

“Enfatizamos que o fato de os retornos em excesso serem consistentemente negativos é um péssimo sinal para quem investe em COEs. Afinal, os COEs são mais arriscados que o ativo livre de risco (além de serem ilíquidos) e deveriam oferecer retornos esperados superiores ao do ativo livre de risco”, disseram os autores do estudo.

“É importante também pontuar que é improvável que os COEs atuem como um seguro e que, por causa disso, os investidores estejam conscientemente pagando um prêmio pela proteção oferecida”, completaram, em nota.

Custos do COE limitam ganhos e engordam comissões

A principal razão para que o COE não seja tão atrativo ao investidor quanto as propagandas tentam demonstrar é que os custos para montar tal estrutura são altos. Além disso, no mercado, os agentes recebem grandes comissões a cada venda desse produtos. Assim, se uma ponta recebe muito, a outra fica a ver navios.

Normalmente, o COE tem uma taxa de montagem, que é o custo de comprar os derivativos. Dessa forma, tem um percentual de remuneração de toda a cadeia que, normalmente, gira em torno de 0,8% a 1% ao ano, segundo apurou o SUNO Notícias.

Portanto, um COE de cinco anos de duração, renderia ao assessor 5% de comissão -taxa considerada boa pelos agentes e paga de uma vez só, no ato da aplicação.

“Muitas vezes dá a impressão de o assessor ganhar muito dinheiro, mas ele prendeu cinco anos de receita também. Agora, obviamente, que ele é bem interessante para quem vende e, a depender do caso, pode ser considerado para quem investe”, disse uma fonte com conhecimento do setor.

Para Elias Wiggers, o COE não é bom, nem ruim. “Tem que olhar o ativo objeto. Aplicar no COE não existe, é igual aplicar no CDI. O COE é o veículo. Tem que olhar o ativo na ponta. Pode ser um COE de empresas problemáticas, então pode ser um COE ruim e o contrário também é real”, disse.

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Vinicius Pereira

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