Por que as Bolsas de Valores cresceram 3,5 vezes mais do PIB global desde 2008

No dia 15 de setembro de 2008 o quinto maior banco de investimento dos Estados Unidos, o Lehman Brothers, declarou falência. A partir daquele dia, as Bolsas de Valores do mundo inteiro colapsaram.

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Entretanto, já no final de 2008, as Bolsas de Valores internacionais voltaram a subir, e nos últimos treze anos registraram uma capitalização de US$ 71.340 bilhões (cerca de R$ 400 trilhões), segundo os dados da Bloomberg.

Um valor 3,5 vezes superior ao crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) do mundo, que aumentou US$ 20.606, segundo os dados do Fundo Monetário Internacional (FMI).

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Em outras palavras: a valorização das cotações das Bolsas de Valores globais mais do que triplicaram a economia real do planeta.

Uma situação que gera preocupação, pois demonstra uma distância cada vez maior do mundo financeiro em relação ao resto do mundo.

Distância entre Bolsas de Valores e PIB aumentou na pandemia

Analisando os dados com mais atenção, aparece claramente como esse descompasso entre Bolsas de Valores e PIB foi acentuada durante a pandemia do novo coronavírus (covid-19).

Se não consideramos o ano passado, os mercados financeiros cresceram apenas 2,4 vezes mais do que o PIB do mundo desde 2008.

Em 2020, portanto, essa distância aumentou.

Uma tendência que, infelizmente, não é surpreendente. A eclosão da pandemia, junto com os vários lockdowns, por um lado, gerou uma contração nos PIBs do mundo todo.

Por outro lado, essa situação induziu uma intervenção global sem precedentes por parte dos bancos centrais, que atuaram todos ao mesmo tempo. O que gerou uma nova corrida aos ativos financeiros e uma forte alta nos mercados, que transformou a pandemia no maior Bull Market da história.

A introdução dessas enormes massas de recursos foi a principal causa do hiato entre as Bolsas de Valores e a economia real;

Para entender essa situação é útil olhar para a base monetária M2.

Entre 2008 e 2020 esse indicador aumentou em US$ 53.404 bilhões. Um valor próximo da diferença entre o aumento da capitalização dos mercados internacionais e o crescimento do PIB mundial, que foi de US$ 50.734 bilhões.

Ou seja, essa correspondência mostra como a maior parte da liquidez, injetada várias vezes durante as várias crises que ocorreram de 2008 até 2020, não chegou ao mundo real, e ficou “retida” nos mercados, contribuindo para o aumento nos preços das ações.

Realidade sempre mais complexa

Mas é necessário considerar também outras questões. Como a retro-alimentação do PIB pelos ganhos obtidos nos mercados financeiros por investidores, que utilizam as ações para obter renda que acabam gastando na economia real.

Isso aparece evidente analisando a tendência da relação percentual entre a capitalização e o PIB mundial. A fratura entre os dois diminuiu de velocidade nos últimos anos justamente por causa dos gastos das famílias, principalmente nos EUA, financiados pelos ganhos obtidos nos mercados.

Se em 2008 a diferença entre mercados e PIB era cerca de 50%, em 2017  passou de 100%, mas no final de 2020 chegou em 122% (em março passado, considerando as estimativas do FMI para o PIB de 2021, seria de 115%).

O impulso, portanto, permanece mais contido nos últimos anos. É a demonstração de que, em países como os EUA, o efeito riqueza vinculado às Bolsas de Valores resiste.

Os maiores ganhos nos mercados aumentam a renda das famílias, que acabam consumindo mais, sustentando dessa forma a própria economia real.

Mudança no capitalismo

Mas não é só uma questão de liquidez. Outro ponto é a transformação do capitalismo.

A crescente afirmação da economia do conhecimento, juntamente com o boom da alta tecnologia e de fenômenos como o ASG (Ambiente, social, governança), aumento drasticamente o valor dos chamados ativos intangíveis.

Esses, nos EUA, valem 76% de toda a capitalização das empresas listadas.

Pois bem: é claro que tais ativos, também e sobretudo pela dificuldade em serem quantificados, facilitam a inflação dos preços das ações.

Todavia, no topo das empresas mais capitalizadas dos Estados Unidos estão os gigantes da tecnologia. Empresas que, ao contrário dos grandes industriais do passado, não ocupam os primeiros lugares em termos de número de funcionários.

Ou seja: a dura lei de Wall Street diz que aqueles que geram menos empregos sempre valem mais.

Condição que, mais uma vez, pode ajudar a compreender a razão da cada vez maior desvinculação entre as Bolsas de Valores e a economia real.

Segundo alguns economistas, essas atividades pouco intensivas em termos de mão de obra, mas com volutuosos lucros corporativos geraram outro impulso para comprar títulos.

Os lucros dessas empresas que, por um lado, também são facilitados por uma baixa carga tributária e que, por outro lado, foram distribuídos aos acionistas sem impacto real positivo no PIB.

Volta à normalidade será um drama para os mercados financeiros?

A questão, porém, é: a estratégia de saída das políticas monetárias ultra-expansionistas se transformará em um drama financeiro?

Os bancos centrais, ao monetizar efetivamente a dívida, de fato criaram um oceano de liquidez.

Por um lado, todavia, as imponentes políticas fiscais que estão apenas no começo levarão à expansão económica que, por sinal, poderia tornar sustentável a dívida emitida.

E, por outro lado, as mesmas instituições financeiras central administrarão o “retorno ao passado” diluindo-o por muito tempo.

Por isso, no final das contas, o “novo normal” nas Bolsas de Valores será percebido como o velho normal.

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Carlo Cauti

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