Fundos de infraestrutura são opção de investimento isento de IR; veja estratégia da Bocaina

Quando Miguel Ferreira deixou o posto de CEO da gestora de recursos do Santander (SANB11), em fevereiro de 2020, sua intenção era colocar em prática um novo projeto: a criação de uma asset especializada na gestão de ativos alternativos, principalmente de infraestrutura.

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Com experiência de longa data no setor – Miguel Ferreira já foi sócio e CEO da Tarpon Investimentos, além de presidir o conselho de administração da Ômega Energia (MEGA3) -, o executivo tirou do papel sua ideia em parceria com o sócio Gabriel Esteca, também da gestora de recursos do Santander, e assim nasceu a Bocaina Capital.

A proposta da gestora é oferecer um produto diferenciado, com risco balanceado e que funcione de alternativa à volatilidade das ações e à tradicionalidade da renda fixa. “Nós trabalhamos com a tese de proteção contra a inflação e rendimentos resilientes. Nosso objetivo é a geração de renda e retorno estável”, diz Ferreira.

Para tanto, a Bocaina Capital opera com financiamento de projetos e reestruturação de ativos por meio de dívidas que oferecem rendimentos isentos e não tributáveis. A própria gestora faz a originação dos recebíveis e trabalha toda a análise para entender os riscos associados, montar as garantias e modelar financeiramente o projeto.

Os investimentos da Bocaina em infraestrutura são feitos por meio da emissão de debêntures incentivadas em ativos dos setores de energia, saneamento e rodovias. Para Ferreira, o setor de infra do Brasil está num ótimo momento, com bilhões de reais já contratados em projetos para os próximos anos.

“Há muita oportunidade relevante em dívida para investir em projetos já contratados para o longo prazo, caso de parques solares e eólicos. Com a curva dos títulos do Tesouro abrindo, os fundos de infraestrutura precisam pagar acima desses valores, o que melhora os rendimentos das dívidas sênior”, diz Ferreira.

Miguel Ferreira, fundador e CEO da Bocaina Capital
Miguel Ferreira, fundador e CEO da Bocaina Capital. Foto: Divulgação

O que são os FI-Infra

FI-Infra são Fundos de Investimento em Infraestrutura. Desde junho de 2020, esses fundos podem ser listados na bolsa de valores do Brasil, a B3 (B3SA3). De lá para cá, nove fundos foram emitidos e listados na Bolsa.

Os FI-Infra podem investir em Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs), em Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDCs) e, principalmente, em debêntures incentivadas – que são títulos de dívida emitidos por empresas privadas. Eles são isentos de Imposto de Renda sobre rendimentos, ganhos de capital e amortização, para pessoas físicas.

Os títulos não são ainda tão conhecidos entre os investidores, mas a expectativa do mercado é de crescimento do produto financeiro nos próximos anos. Em 2021, as emissões de debêntures incentivadas bateram recorde, somando R$ 47,2 bilhões em captação frente a R$ 28,04 bilhões em 2020. Aumentou também o número de empreendimentos financiados por essas dívidas, de 58 em 2020 para 124 em 2021, outro recorde.

Ao todo, existem R$ 167,47 bilhões investidos em debêntures incentivadas em circulação, sendo R$ 149,27 bilhões dedicados à infraestrutura. Em paralelo a isso, o patrimônio dos FI-Infra soma, aproximadamente, R$ 5 bilhões apenas.

Mas a perspectiva é de crescimento, até para acompanhar os movimentos do governo federal em seus projetos de melhorias para a infraestrutura do País.

Entre 2019 e 2021, o governo federal realizou 115 leilões, gerando R$ 125 bilhões em outorgas e expectativa de mais de R$ 500 bilhões em investimentos, segundo a Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib). Para os próximos anos, mais 103 leilões são esperados nas áreas de saneamento, iluminação pública, energia, ferrovias, entre outros, que devem movimentar mais de R$ 445 bilhões.

Nome Ticker Valor Público-alvo 
BOCAINA INFRABODB11R$ 10,46Investidores em geral
BTG PACTUAL DÍVIDA INFRABDIF11R$ 93,70Investidores Qualificados
CAPITÂNIA INFRACPTI11R$ 100,40Investidores em geral
INTER INFRABIDB11R$ 94,91Investidores Qualificados
ITAU FDO INV INFRIFRA11R$ 105,90Investidores em geral
KINEA INFRAKDIF11R$ 133,10Investidores em geral
RIO BRAVO ESG INFRARBIF11R$ 103,87Investidores em geral
SPARTA INFRAJURO11R$ 101,77Investidores em geral
XP FDO INV INFRXPID11R$ 86,20Investidores Qualificados

Fundos de infraestrutura listados na B3. Fonte: B3

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BODB11: o Fi-Infra da Bocaina na Bolsa

Foi para navegar nessa onda que, em 2021, a Bocaina Capital começou seus estudos para a criação do seu primeiro FI-Infra, com o objetivo de listá-lo na Bolsa, em uma oferta pública para investidores em geral.

Durante 12 meses, 20 projetos de infraestrutura foram analisados e a escolha foi pelo financiamento de 4 deles, que somaram R$ 300 milhões em dívidas, nos setores de rodovias, saneamento, energia eólica e portos. As emissões de cada debênture são na casa dos R$ 50 milhões e R$ 150 milhões, por ser possível capturar um prêmio de liquidez e serem menos competitivas no mercado, segundo Ferreira.

Em sua primeira emissão, o Fi-Infra BODB11 atraiu 1.422 cotistas, com um preço por cota de R$ 10,00 e uma taxa de remuneração de IPCA +8,10%, em um produto isento de IR.

“Infraestrutura permite isso, ter baixa volatilidade com retorno estável. Podemos trabalhar uma boa quantidade de investimentos, com estabilidade de receita e reajuste pela inflação mensal. É o risco balanceado que propomos”, diz Ferreira.

O gestor ressalta ainda  que o público-alvo do Bocaina Infra são pessoas que olham para o longo prazo, até porque o duration e os prazos do fundo são mais longos. Para assegurar essa característica, o BODB11 nasceu com um lock up (cláusula que estabelece um período mínimo de permanência no papel) de quatro meses.

“Nós quisemos fazer esse filtro para captar investidores com perfil de longo prazo, porque é um fundo de carrego, não é para comprar e vender em seguida. Acreditamos que isso deve trazer qualidade para o BODB11”, explica.

A indústria de FI-Infra ainda está em construção. O volume negociado no mercado secundário dos Fi-Infra foi de R$ 123,48 milhões em dezembro. A média diária de negociação ficou em R$ 35,9 mi, mostra o último relatório do CPTI11 – FI-Infra da Capitânia que acompanha o setor.

Em entrevista ao SUNO Notícias, Miguel Ferreira conta detalhes sobre a administração de fundos de infraestrutura e a percepção dos investidores sobre esses ativos nos últimos tempos.

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O que motivou seu foco em ativos alternativos para criar a Bocaina Capital?

Nada melhor do que infraestrutura para entregar produtos excelentes dentro da proposta de risco balanceado que temos na Bocaina. Vivemos um momento para se olhar infra no Brasil, em particular, investimentos por meio de dívidas. Já foram contratados bilhões de reais em investimentos nos próximos anos. O mercado de energia renovável, com parques solares e eólicos, está aquecido. A mensagem é: tem uma oportunidade única aí. O Brasil está arrumando a sua infraestrutura e vai investir bilhões nos próximos anos.

A questão da dívida tem relação com os projetos e o momento da economia. Cerca de 70% do investimento desses projetos é em dívida. E vivemos um momento em que a precificação é boa para alocação dos investidores. Como os títulos do Tesouro Direto (NTN-b) abriram, no financiamento dos projetos de infraestrutura você vai colocar mais prêmio, de 2%, 3% acima desses títulos. Tem muito projeto sendo financiado hoje com IPCA +8%, por exemplo, o que é super legal para o investidor.

Como está o mercado para fundos de infraestrutura?

Estamos vendo a maior demanda da história por debêntures incentivadas, porque a pessoa física está sedenta por dívida isenta de imposto de renda. A busca é por melhores rendimentos na renda fixa e não só nos papéis mais tradicionais. Ao mesmo tempo, o mercado de fundos está sofrendo muito: fundos imobiliários, fundos de participação e fundos de infraestrutura também. A gente entende que é um movimento natural, porque quando os juros aumentam e a curva da NTN-b abre, o preço dos papéis vai cair, é normal.

Acontece que tem um componente de educação da pessoa física que ainda precisa evoluir – muita coisa já evoluiu, mas ainda tem um caminho a ser trilhado -, que é entender que quando o juros abre, esse tipo de papel tende a cair um pouco. Só que a pessoa física se assusta com esse movimento e acha que é ruim, e ela vende, aí o papel perde liquidez e cai mais ainda. Com isso o mercado entra em uma espiral negativa.

O que eu acho é que existem oportunidades enormes de compra. Tem Fi-Infra que está pagando IPCA +9,5%, IPCA +8,42% e descontados. Eu acho que é “call” de compra tudo isso.

Não existe também um desconhecimento por parte dos investidores a respeito dos Fundos de Infraestrutura?

Claro que sim. Não é um setor simples e ainda precisa de muita visibilidade. Eu acredito que as pessoas físicas só deveriam entrar nessas dívidas de infraestrutura via profissionais especializados e não diretamente.

É muito difícil para uma pessoa que não é do setor de infraestrutura entender os riscos de investir em uma rodovia A ou rodovia B. Um exemplo: como a pessoa física vai conhecer os riscos da obra, saber se precisa construir um trecho novo, se tem uma questão ambiental ou não, se precisa de mais cinco túneis, mais seis pontes, ele não sabe.

Infelizmente, o investidor brasileiro ainda olha mais para o retorno nominal, não entende tanto de risco. Existe um processo de compreensão sobre risco, análise de risco, que os profissionais, gestores de investimento podem fazer aos investidores pessoas físicas. Porque o que está acontecendo no Brasil é uma enorme transformação de um mercado que, até outro dia, a pessoa física só tinha CDB com liquidez diária e hoje ela precisa montar um portfólio.

Quais os próximos passos da Bocaina Capital em 2022?

Colocamos o nosso primeiro FI-Infra para investidores em geral na Bolsa e agora estamos em um segundo momento, de olhar para o mercado para a criação de um fundo voltado para investidores qualificados, com um grau de risco um pouco maior.

Esse fundo não deve ser listado: nesse primeiro momento pensamos nele fechado mesmo. A ideia é captar um valor maior, com dívidas maiores também e possivelmente um prazo determinado. É um projeto que ainda está em análise.

Também vamos aproximar nosso contato com os investidores do BODB11. Queremos fazer uma gestão ativa, mais próxima, com muita transparência, para educar os investidores em fundos de infraestrutura e apresentar mais do produto para eles.

Monique Lima

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