Foi anunciado oficialmente nesta quarta-feira (20) o Auxílio Brasil, programa que irá substituir o Bolsa Família. No pronunciamento sobre o benefício, o ministro da Cidadania, João Roma, disse que o auxílio entrará em vigor em novembro e, de acordo com ele, o número de famílias atendidas pelo programa terá um aumento: de 14,7 milhões para aproximadamente 17 milhões.
“O programa permanente, o Auxílio Brasil, que sucede o Bolsa Família, esse programa tem um ticket médio de acordo com composição de cada família. Existem famílias que estão recebendo menos de R$ 100, e outras que ganham até mais de R$ 500. O programa terá reajuste de 20%”, declarou o ministro.
O governo quer levar o benefício a R$ 400 em 2022, ano em que o presidente da República, Jair Bolsonaro, concorrerá à reeleição.
Roma informou que o reajuste de 20% não é acima de um valor unitário, mas sobre a execução de todo o programa permanente. O ministro não disse será a fonte dos recursos, mas afirmou que não será de crédito extraordinário, prometendo responsabilidade fiscal.
Também foi informado que o governo pretende zerar a fila de espera do Bolsa Família até dezembro deste ano. Até setembro, 2,2 milhões de famílias estavam aguardando para serem incluídas no programa.
Mais cedo, o presidente da República, Jair Bolsonaro, confirmou que queria pagar R$ 400 aos beneficiários do programa até dezembro de 2022, como revelou o Broadcast (sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado) na segunda-feira à noite.
Nos últimos dias, instalou-se um verdadeiro cabo de guerra entre ala política e econômica do governo em torno da definição do valor que ficará fora do teto de gastos.
A equipe econômica quer limitar a R$ 30 bilhões, mas a ala política quer uma cifra maior.
Fonte de recursos não detalhada
Em pronunciamento no Palácio do Planalto, Roma não detalhou qual será a fonte de recursos para o reajuste permanente, nem como será viabilizado o pagamento do auxílio temporário.
“Não estamos aventando que o pagamento desses benefícios se dê por créditos extraordinários”, disse o ministro.
Sempre que questionado sobre despesas fora do teto de gastos, a regra que limita o avanço das despesas à inflação, Roma citou compromisso do governo com “responsabilidade fiscal”, mas não foi enfático sobre o teto.
O ministro da Cidadania ainda deixou claro que as negociações incluem conversas com o relator da PEC dos precatórios, Hugo Motta (Republicanos-PB). A proposta busca limitar o pagamento das dívidas judiciais para abrir espaço no Orçamento de 2022 e seria usada para permitir gastos do Auxílio fora do teto.
“O presidente Bolsonaro nos demandou que todos aqueles que fazem parte da pobreza e extrema pobreza, que estão no programa social através do cadastro único, através do sistema único de assistência social, que nenhuma dessas famílias beneficiárias receba menos de R$ 400”, disse Roma, negando qualquer caráter eleitoreiro da medida. “O benefício transitório visa equalizar que nenhuma família receba menos de R$ 400.”
O ministro prometeu que tudo será feito dentro das regras fiscais, mas não explicou a fonte de recursos para as parcelas temporárias sem furar o teto de gastos, como prometeu mais cedo o presidente Jair Bolsonaro em evento no Ceará. “Estamos tratando, área social e econômica, para que atendimento disso ocorra seguindo responsabilidade fiscal”, afirmou.
O ministro da Cidadania disse também que o auxílio emergencial executou cerca de R$ 359 bilhões nesse período de 2020 e 2021 e ajudou a oferecer dignidade aos brasileiros em um contexto de crise.
“Anúncio teve conotação de campanha”, diz economista
O economista-chefe da Ativa Investimentos, Étore Sanchez, observou: “Para viabilizar o benefício, o governo precisa mostrar o espaço no teto, para 2022, e indicar a origem dos recursos, para 2021 e daí em diante. Para esse ano pode ser usado o resquício do direcionado ao Bolsa Família, mas para o ano que vem o direcionamento precisa ser feito.”
Sanchez ponderou: “O ministro pelo menos negou que isso se dará por meio de créditos extraordinários, mas colocou à mesa a PEC dos precatórios como originária das respostas financeiras.”
E mencionou a possível fonte de recursos: “A chance da PEC dos precatórios ser aprovada no meu ver é baixa, ainda mais este ano para vigorar no orçamento de 2022. Além de todo o trâmite que precisa ser feito na Câmara e Senado, a medida é usada como palanque político e postulantes ao cargo de presidente da república da Câmara alta, como Rodrigo Pacheco, impedirão o progresso da matéria.
Sanchez conclui: “Roma ainda indicou a vontade de Bolsonaro de mudar os critérios do programa, o que necessita de tramitação legal, de um PL, que também precisa do Senado. Fato é que as pretensões seguem vagas e, a meu ver, pouco prováveis de serem executadas. O anúncio teve conotação de campanha, que se promete sem expor viabilidade, além do populismo do discurso e justificativas.”
Mercado reagiu negativamente ao Auxílio Brasil ontem
O Ibovespa cedeu 3,28% ontem (19) e fechou a 110.672,76 pontos, com o mercado atento à possibilidade de flexibilização do limite de gastos, com a solução “extra teto” para acomodar parte do volume de recursos destinados ao Auxílio Brasil. Ainda ontem, o dólar atingiu o maior valor em seis meses.
Pressionado pela aguda percepção de risco fiscal, que pode colocar em questão a lealdade de parte da equipe econômica à agenda de reeleição, com rumores sobre possíveis baixas no quadro técnico, a referência da B3 chegou a mostrar perda de 3,92% no pior momento da tarde, aos 109.947,21 pontos, mas rapidamente recuperou o nível de 110 mil e mesmo o de 111 mil pontos ao se confirmar o cancelamento do anúncio oficial do novo programa.
“Brasília parece ter encontrado a chave do cofre. O mercado está preocupado com a falta de disciplina para manter o teto ou, se realmente passar disso, que as despesas ‘extra teto’ com o Auxílio Brasil não fiquem muito além dos R$ 30 bilhões indicados o correspondente a R$ 100 de cada R$ 400 a serem concedidos aos beneficiários em 2022”, disse Scott Hodgson, gestor de renda variável na Galapagos Capital, acrescentando que o valor de R$ 400 ressurgiu sem aviso prévio, como uma “fênix renascida das cinzas”.