Sergio Rial, ex-CEO da Americanas (AMER3), abriu o jogo sobre o rombo contábil de R$ 20 bilhões encontrado na empresa. Nesta quinta (12), o executivo destacou que não há dúvidas de que a companhia precisará ser capitalizada, apontou uma falta de transparência nos dados e revelou o motivo da sua demissão.
“Os R$ 20 bilhões são a nossa melhor estimativa dentro do que tivemos de informação nesses nove dias”, comentou Rial durante uma conferência com os acionistas da companhia.
O executivo avisou que será necessário uma capitalização da Americanas, mas que ainda não é possível estimar o tamanho do aporte financeiro necessário para solucionar esse problema contábil. “Ninguém definiu o valor, até porque o número não foi auditado. Mas sabemos que não será uma capitalização de [apenas] milhões”, relatou.
Rial reforçou que o 3G Capital, acionistas de referência da Americanas, estão comprometidos com o negócio. “Mas eles não podem ser a solução por si só. ‘Me dá um cheque e tá resolvido’, não é assim”.
Na conferência, o ex-Santander (SANB11) explicou que percebeu problemas no reporte de itens da conta “Fornecedor” no balanço da Americanas e que muitos pagamentos aos fornecedores, quando eram financiados por bancos, não eram vistos como dívidas nas planilhas.
“É um tema [no setor do varejo] que permanece desde a década de 1990, um problema de estruturação de risco sacado que não era reportado como dívida”, detalhou. Mesmo com a situação delicada do negócio, o executivo buscou ser otimista e afirmou que “quanto mais vendermos, menor será o problema”.
Rial também abriu o jogo sobre como identificou o problema nesse curto espaço de tempo em que liderou o negócio: “Em uma dimensão mais conceitual, é a capacidade, sob o ponto de vista de liderança, de que talvez o nível de transparência e a vontade da própria gestão de querer falar de problemas e desafios não estivesse tão fluida na organização como deveria”.
Demissão de Sergio Rial
Após a conferência, Rial gravou um vídeo em que explicou o motivo pelo qual pediu demissão depois da descoberta do rombo bilionário na Americanas.
“Acho que o tamanho do que tem de ser feito não era necessariamente aquilo que eu queria no primeiro momento de ir para a Americanas e, a partir dela, enveredar para um projeto muito forte de crescimento, porque acredito muito no modelo híbrido da empresa”, disse.
No vídeo direcionado aos acionistas da Americanas, o ex-CEO disse que muito tem de acontecer nos próximos trimestres em relação a estrutura patrimonial do negócio.
Apesar de não ter a obrigação legal de fazer, eu e o André [Covre, ex-diretor de Relações com Investidores] nos sentimos compromissados em dar a empresa um caminho a partir de uma assessoria direta aos acionistas de referência.
“Peço paciência no sentido de que, claramente, não temos todas as respostas”, disse. Confira o posicionamento na íntegra:
O que aconteceu na Americanas?
Em fato relevante divulgado na quarta (11), a empresa disse que detectou inconsistências nos lançamentos contáveis estimadas no total de R$ 20 bilhões, com data-base em 30/09/2022. O montante apontado é maior que o valor de mercado da própria Americanas na Bolsa (R$ 10 bilhões).
O caos contábil é tamanho a ponto de Sergio Rial deixar o comando da empresa menos de dez dias após ter assumido o cargo. André Covre, diretor de Relações com Investidores, também saiu do negócio. João Guerra, então diretor de Recursos Humanos da Americanas, assumiu interinamente os dois cargos.
“As estimativas estão sujeitas a confirmações e ajustes decorrentes da conclusão de trabalhos de apuração e dos trabalhos a serem realizados pelos auditores independentes, após o que será possível determinar adequadamente todos os impactos que tais inconsistências terão nas demonstrações financeiras da companhia”, destacou a companhia no documento.
Procurada pelo Suno Notícias, a Americanas afirmou que “não acrescentará informações ao que já foi dito no comunicado ao mercado”. No comunicado disponível na CVM, a empresa reforçou que Rial auxiliará na apuração do caso, atuando como assessor do negócio.
Além disso, um comitê independente foi criado para a investigação do caso. “[O grupo] terá os poderes necessários para a condução de seus trabalhos”, disse a empresa. O grupo é coordenado por Otávio Yazbek e conta com a participação de Vanessa Claro Lopes e Pedro Melo.
As contas da Americanas são auditadas pela PwC. Questionada pela reportagem, a auditoria informou que “não comenta balanços auditados pela firma por questões de confidencialidade contratual”.
Americanas: Análise e o que esperar das ações?
Na quarta (11), as ações da Americanas fecharam o dia em alta de 0,76%, sendo negociadas ao preço de R$ 12. De acordo com o mapeamento do Status Invest, neste mês, os papéis já acumulavam uma alta de 32,89%. Nos últimos doze meses, as ações da varejista amargaram uma desvalorização de 58,55%.
Na visão dos especialistas de mercado, os papéis da Americanas sofrerão uma derrocada nas próximas horas.
“O Ibovespa deve operar com viés negativo, em meio à derrocada nas ações de Lojas Americanas (AMER3), após descoberta de inconsistências de R$20 bilhões no balanço e as saídas do CEO e do DRI, e uma dinâmica mais negativa do minério de ferro e petróleo”, argumentou Nicolas Borsoi, economista-chefe da Nova Futura Investimentos.
Pedro Menin, sócio-fundador da Quantzed, demonstrou preocupação com as notícias apresentadas pela Americanas. “A saída dele [Rial] falando de inconsistência de R$ 20 bilhões mostra que podemos estar diante de uma possível fraude, e o mercado não gosta disso. É só vermos o que aconteceu com a IRB (IRBR3). Não dá para mensurar o quanto isso afetou o balanço. Fala-se também de uma dívida da empresa que não se sabe o tamanho”, comentou.
As ações da Americanas entraram em leilão nas primeiras horas desta quinta e devem seguir assim até 13h40. Nessa operação, o preço dos papéis encontra-se em R$ 1,20, queda de 90% em comparação com o fechamento de quarta.