Sonegação em fundos imobiliários? Não é bem assim

Segundo uma reportagem veiculada pela Globonews nesta sexta-feira (30), a Receita Federal estaria investigando “irregularidades em centenas de fundos imobiliários (FIIs) para apurar um suposto esquema de sonegação tributária.

A acusação seria de ter utilizado uma “brecha da lei para não pagar imposto de renda sobre os rendimentos” dos fundos imobiliários.

Entre os pontos citados pela reportagem como alvo da investigação estariam:

  • o fato que investidores terceiros não poderiam “entrar nos fundos imobiliários”;
  • o fato que “menores de idade incluindo crianças de 4 anos e crianças de 6 anos” seriam cotistas dos FIIs “apenas para formar o número mínimo de cotistas previsto em lei”;
  • o fato que “existiria uma brecha na lei de 2005 para não pagar o imposto de renda sobre os aluguéis recebidos”.

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Entretanto, as coisas não estão bem assim. Segundo especialistas entrevistados pelo SUNO Notícias, os pontos levantados na reportagem não podem ser considerados violações da lei.

Isso pois a compra e venda de cotas do fundo – no caso da “entrada em FIIs” – depende da vontade de agentes do mercado, algo que a lei não pode impor. Por isso, a única previsão legal é a listagem na Bolsa de Valores de São Paulo (B3)

Além disso, a lei não prevê limitações de idade para a titularidade de cotas, da mesma forma que não existe limitação para que um menor de idade possa ser titular de uma conta corrente bancária, por exemplo.

E, por último, o eventual não pagamento de imposto de renda sobre os aluguéis recebidos não poderia ser considerado como “brecha na lei”, e sim como uma previsão legal legítima e muito clara na jurisdição.

A isenção de imposto de renda é uma das características próprias dos FIIs. A vantagem fiscal desses instrumentos financeiros existe justamente para fomentar o mercado imobiliário como um todo.

Entenda o caso

Atualmente no Brasil operam cerca de 590 fundos imobiliários. Segundo a reportagem da Globonews, a Receita Federal estaria investigando fundos menores, tendo notificado 53 FIIs. Ou seja, menos de 10% do total.

A lei nº11.196/2005, que regulamenta esse mercado, prevê a isenção de imposto de renda para os rendimentos oriundos de FIIs caso o fundo respeite algumas condições.

Segundo a lei, o cotista, pessoa física receberá os rendimentos distribuídos pelos fundos imobiliários isentos de Imposto de Renda, desde que não possua mais de 10% das cotas do fundo nem outro percentual que represente o direito de receber mais de 10% dos rendimentos auferidos pelo fundo.

“Precisamos entender melhor qual o motivo da Receita Federal fazer esse questionamento. Mas não parece que exista nenhuma brecha na lei. A lei nº11.196/2005 quanto a isso é bastante clara: a isenção se da para cotas exclusivamente listadas em Bolsa de Valores ou mercado de balcão organizado, sendo que o fundo imobiliário deve ter no mínimo 50 cotistas e não da nenhuma restrição quanto a idade”, explicou Jacinto Santos, analista em fundos imobiliários do Funds Explorer.

“No máximo, o que devemos entender é como os imóveis fora aportados ao fundo. No processo podem ter ocorrido algumas irregularidades. E isso poderia gerar um questionamento por parte da Receita. Mas estamos no âmbito da teoria, e, de qualquer forma, isso seria outro tipo de investigação, sobre o patrimônio, e não sobre a rentabilidade”, explicou Santos.

Para o professor Marcos Baroni, analistas de fundos imobiliários da SUNO Research, “o mais importante é a gente entender que os fundos imobiliários em geral, onde cerca de um milhão de pessoas físicas investem, eles têm uma mecânica de funcionamento diferente desses fundos exclusivos para famílias. São duas questões diferentes que devem ser pontuadas”.

“Outro ponto importante também é que o administrador do fundo é o fiduciário, e se ocorreram irregularidades, as autoridades devem sim responsabilizá-lo. Mas isso não dialoga com o que é o dia-dia de um FII convencional”, explicou Baroni.

Segundo o especialista, é necessário salientar como os fundos imobiliários são veículos importantíssimos para a sucessão patrimonial e para o planejamento tributário, algo que difere – e muito – da sonegação fiscal.

“Eventuais irregularidades poderão ser ajustadas por futuras instruções da CVM. Entretanto, isso não condena uma indústria inteira como a de fundos imobiliários. Pelo contrário, reforça como podemos ter algumas deficiências, mas estamos no caminho correto”, concluiu Baroni.

CVM salienta que não há proibição sobre grupo de cotistas de fundos imobiliários

Procurada pelo SUNO Notícias, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) informou em nota que “é importante ressaltar que não há vedação na regulação de mercado de capitais a que um grupo de cotistas concentre alta participação em fundos imobiliários, e a fiscalização de temas tributários cabe a RFB. Além disso, é dever do administrador de Fundo de Investimento Imobiliário prestar informações periódicas mensais ao mercado, inclusive investidores do fundo, como por exemplo, dados relativos à exclusividade, e alertar se os cotistas possuem vínculo familiar ou societário familiar”.

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Carlo Cauti

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