Coronavírus: alta do delivery não substituirá ida aos restaurantes, diz especialista
Assim como a maioria dos setores da economia, o segmento alimentício também sofreu com a chegada da pandemia do novo coronavírus (Covid-19) ao Brasil, em março deste ano. Dessa forma, bares e restaurantes tiveram suas atividades, em meio físico, suspensas por um longo período. Isso acabou ocasionando o fechamento de diversos estabelecimentos e levou, consequentemente, ao desemprego de milhares de brasileiros. O faturamento caiu mais de 75% para 64% das empresas do setor. Por outro lado, houve um crescimento nas vendas do varejo alimentício no e-commerce, por meio dos aplicativos de delivery e das plataformas próprias das empresas.
É exatamente isso o que destaca o mestre em administração de empresas e professor da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), Alan Kuhar. “O sistema de delivery, que já teve um aumento na demanda devido a multiplicação de aplicativos de entrega de comida veio para ficar e aumentou um comportamento [após o início da pandemia de coronavírus] que existe há décadas, uma vez que facilitou o processo de solicitação e entrega de comida. Entretanto, esse crescente hábito, não substitui uma diferente ocasião de consumo do serviço de um restaurante que é ir até um restaurante para se alimentar”, afirmou Kuhar.
O especialista destacou que os estabelecimentos devem continuar investindo no atendimento presencial, já que, para o restaurante, o ticket médio de um consumidor no seu ponto de venda é maior do que o ticket médio de uma entrega.
De acordo com a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), 1,2 milhões de empregos no setor foram perdidos por conta da pandemia (dados contabilizados até o mês de maio). Em contrapartida, o setor de varejo alimentício no comércio eletrônico acabou crescendo bastante.
O GPA, por exemplo, afirmou recentemente que teve um segundo trimestre “gigante”, em relação aos resultados no e-commerce alimentício, com vendas que vão desde compras do mês até refeições diárias em sua plataforma digital. O iFood também reportou um crescimento nos números, apresentando uma alta de 13% no número de restaurantes cadastrados na plataforma no mês de março, frente a fevereiro.
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Cenário antes e durante a pandemia
Antes do início da pandemia de coronavírus no Brasil, o País contava com um milhão de negócios e 6 milhões de empregos diretos no setor de alimentação (considerando apenas bares e restaurantes).
Em maio, cerca de 25% dos negócios fecharam as portas em definitivo (um em cada quatro) no País. Caso a situação do mês anterior ao do relaxamento das medidas se mantivesse, 19,34% dos empresários iriam ter de demitir
todos os seus funcionários. Entretanto, como em junho houve a reabertura gradual, o setor acabou respirando um pouco.
“Mais de 90% destes estabelecimentos [bares e restaurante] são micro e pequenas empresas. Elas possuem dificuldade de formar e gerir caixa. Sem dinheiro em caixa para auxiliar a atravessar momentos com queda inesperada de receita, dificilmente uma empresa sobrevive. Os estabelecimentos que sobreviveram são aqueles que tinham algum dinheiro em caixa, rapidamente negociaram novas condições de pagamento com seus fornecedores, enxugaram seu portfólio de produtos, possuíam um grupo de clientes leais e principalmente, reorganizaram suas respectivas operações com foco no delivery”, afirmou Alan Kuhar.
Segundo o especialista, a rápida adaptação de novos sistemas de trabalho e o esforço de comunicação ajudou boa parte dos bares e restaurantes a sobreviverem a este momento tão peculiar.
A pesquisa da Abrasel consultou 1558 estabelecimentos (restaurantes e bares) brasileiros entre os dias 15 e 18 de maio. Cerca de 78% dessas empresas precisaram renegociar contrato de aluguel por conta da crise provocada pela pandemia. Além disso, 50% dos fornecedores estavam renegociando dívidas ou fazendo parcelamentos na época. Em maio, 55% dos restaurantes estavam trabalhando apenas com Delivery.
Ademais, 67,2% dos empresários pretendiam retomar as atividades com operação reduzida quando autorizados pelo governo local, o que representa um grande corte do pessoal e, por consequência, aumento do desemprego no setor.
iFood campeão do delivery
O iFood repassou alguns dados ao Suno Notícias sobre suas operações durante a pandemia. Em março, frente ao mês de fevereiro, o número de restaurantes ativos na plataforma do iFood avançou cerca de 13%, passando de 142 mil para 160 mil. Com o aumento de restaurantes na plataforma, também veio o crescimento do número de pedidos, que saltou 22% na mesma base de comparação. “É importante frisar que para nós isso não significa um ganho em cima da crise”, salientou a empresa.
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De acordo com a empresa, foi possível observar mudanças nos hábitos de consumo de seus clientes. As porções familiares começaram a ganhar mais destaque, uma vez que mais pessoas estavam em suas casas, reunidas com a família por conta da quarentena.
O iFood informou também que diversas medidas neste período foram adotadas para apoiar a cadeia de alimentação, o que possibilitou a continuidade da operação com manutenção de empregos e geração de renda. A empresa estima que mais de 2 milhões de pessoas, entre colaboradores de restaurantes e entregadores, são beneficiadas pelo aplicativo.
Sobre novas ocasiões de consumo, a companhia informou que, no consolidado de abril 2020 frente ao mês de março, observou um crescimento de pedidos de 70% em alimentos como: bolos, doces e sorvetes.
Além disso, houve uma alta também no volume de pedidos relacionados ao café da manhã, que não possuía tanta demanda antes da quarentena, com crescimento de 82% no número de pedidos nesta ocasião durante a semana e de 63% aos finais de semana.
Kuhar chamou a atenção para a mudança na estrutura do funcionamento dos restaurantes neste período. “Sem consumidores dentro dos restaurantes, não há momentaneamente a necessidade de garçons, que foram substituídos por motoboys. Momentaneamente, os garçons perderam a demanda por seu trabalho. A comida não sai mais da cozinha para a mesa do estabelecimento, a comida necessita ser levada até o domicílio dos consumidores”, disse o professor.
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Kuhar também destacou que o e-commerce, tanto para o segmento alimentício quanto para outros setores, ganhou força, durante a pandemia de coronavírus, e a preferência de muitas pessoas, porém é uma ferramenta que está presente no Brasil há mais de 20 anos.
“Não é uma novidade. No século passado começamos comprando livros e CDs na Internet e esse ciclo de compras não parou mais. Em 2019, o faturamento do e-commerce no Brasil ficou em torno de R$ 60 bilhões. O varejo total no Brasil tem faturamento próximo a R$ 4 trilhões anualmente, desta forma o e-commerce representa em torno de 1,5% do total do faturamento em nosso país. Essa proporção deve aumentar, mas ainda está longe de representar um volume que substitua completamente o varejo físico. E tudo isso graças ao delivery”, finalizou o professor de marketing.